Um ano depois do início da guerra na Ucrânia, o Parlamento esteve um minuto em silêncio para homenagear as vítimas do conflito. Mas nem todo o Parlamento alinhou na homenagem: os deputados do PCP não estiveram, nesse momento, presentes na sala (e a deputada única do PAN também não, mas por motivos muito diferentes).

No caso do PCP, foi mesmo um statement político que confirma o isolamento, a nível nacional, do partido na sua posição sobre a guerra. Ao Observador, fonte oficial confirma que os comunistas quiseram transmitir, com essa ausência, a ideia de que a sua “solidariedade” é para com “o povo ucraniano e todas as vítimas da guerra”, mas não com “um regime xenófobo, belicista e antidemocrático, rodeado e sustentado por forças de cariz fascista e nazi”, como caracteriza a Ucrânia. A ausência de Inês Sousa Real, do PAN, foi justificada ao Observador por fonte oficial do partido com os “trabalhos parlamentares que se estenderam muito”: “Não conseguiu estar, infelizmente”.

Do lado dos comunistas, a mesma ideia seria passada durante o período de votações: o PCP foi o único partido que votou contra um voto de “solidariedade com a Ucrânia, por ocasião do primeiro aniversário da invasão do território ucraniano pela Federação Russa”, apresentado por Augusto Santos Silva; e o único a votar a favor da sua própria condenação “da escalada de confrontação e guerra, de solidariedade com as suas vítimas e de exigência da paz”.

A posição isolada dos comunistas ficaria, de resto, evidente durante a sessão e seria até sublinhada pelo Governo. No púlpito, o deputado do PCP Bruno Dias, depois de ter ouvido todas as restantes bancadas (à exceção da do Bloco de Esquerda) a defender o apoio à Ucrânia, inclusivamente o militar, apelaria ao fim do “agravamento da guerra” — que o partido diz não ter começado há um ano, mas antes durar há nove anos, numa referência ao início do conflito na Crimeia.

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Apesar de também ter apontado responsabilidades à Rússia, o comunista focou-se nos que estarão interessados em prolongar a guerra e atirou diretamente contra Estados Unidos, NATO e União Europeia, que diz serem as partes responsáveis por “instigar e alimentar a guerra”, deixando um apelo concreto: “Parem de empurrar a Humanidade para a catástrofe (…) Não se põe fim à guerra insistindo no caminho que conduziu a ela”.

Até porque quem paga pelos efeitos de “medidas incendiárias”, diz o PCP, são os trabalhadores e o povo, afetados pelo aumento de preços e do custo de vida que beneficia “o grande capital”. E a solidariedade do partido, concretizou o deputado, é com todas as vítimas — incluindo as que se começaram a registar há nove anos em território ucraniano.

A intervenção não colheria apoios fora da bancada do PCP, apesar de também o Bloco ter criticado o Governo português e a UE por “seguirem o caminho das armas”. Mas só os comunistas mereciam um reparo direto do Executivo: o ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, fez questão de elogiar trechos das intervenções de todas as bancadas (mesmo com ressalvas sobre as críticas bloquistas à UE) antes de se referir à “caricata” posição comunista.

“Temos fundamentais divergências. Esta recusa em olhar de frente é de facto lamentável. É tão absurdo como caricato que nesta análise o ataque de Putin afinal não seja um ataque ao direito internacional mas tão só uma conspiração capitalista para produzir lucros extraordinários”, atacou o ministro. E rematou: a posição “bizarra” do PCP apenas demonstra “como é profundamente minoritária a franja portuguesa que recusa solidariedade à Ucrânia”.