São sobretudo títulos com décadas de história. Mas valem precisamente pelo tempo e o contexto que revelam. A monarquia é um dos conceitos mais antigos da existência política. Estudá-la é conhecer-lhe o passado, encontrando razões para o presente e projetando o futuro. Propomos dez títulos que servem de enquadramento para o que vemos por estes dias em Inglaterra: um rei no século XXI, coroado segundos princípios estabelecidos há vários séculos. É essa dualidade que caracteriza a monarquia. A mesma que está patente nestas páginas.

“O Bom Rei Segundo Homero”

Filodemo de Gadara

Este livro, uma das importantes relíquias encontradas em Herculano, não precisa de explicação. Trata-se de uma coleção de exemplos, extraídos de Homero, daquilo que faz de um rei um bom rei. É, no fundo, um estudo da conceção de poder em Homero. O que é interessante, contudo, é que a obra marca uma espécie de ressurgimento do interesse pela ideia monárquica numa República romana que se vai aproximando cada vez mais da passagem para o Império e que, por isso mesmo, procura razões e exemplos que legitimem essa passagem.

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“On Kings”

David Graeber; Marshall Sahlins

Dirigido por dois antropólogos de gerações diferentes, este estudo da função social dos reis nas sociedades primitivas oferece várias perspetivas curiosas. Das tribos americanas às polinésias, dos esquimós às sociedades pré-colombinas, trata-se de um grande estudo comparativo que tanto olha para a questão da origem da legitimidade do poder como para a prática dos sacrifícios de reis, visto como um modo de contornar a perda de faculdades que a velhice poderia trazer.

“Kingship”

Arthur Maurice Hocart

Este clássico da antropologia pré-clássica, publicado durante a segunda guerra mundial, debruça-se acima de tudo sobre a simbologia monárquica e o modo como as diversas monarquias – e sobretudo a egípcia – foram tomando a simbologia religiosa para criar a ideia de uma simbiose entre o Rei e a Divindade ou, pelo menos, a ideia de que a divindade exige uma representação terrena e que é nela que se escoram a legitimidade e as práticas dos reis.

“Monarquia”

Dante Alighieri

Este pequeno tratado de Dante, dividido em três partes, dá-nos duas ideias fundamentais. Por um lado, uma justificação da monarquia baseada na metafísica clássica – o superior nunca pode vir do inferior, o uno nunca pode vir do dividido, pelo que é a monarquia a fonte da sociedade, e não o contrário. Por outro lado, desenvolve a ideia de Imperium a partir do exemplo romano, não como um Imperium sobre o povo, mas como uma ideia de domínio ou superioridade sobre os outros povos, o que abre a porta para uma ideia de direito internacional em que a legitimidade de ação é dada pela maior perfeição das práticas de uns povos em relação às de outros.

“Os Reis Taumaturgos”

Marc Bloch

Este estudo de Marc Bloch incide sobre a cronística medieval, particularmente sobre os relatos de grandes milagres ou feitos mágicos atribuídos aos reis. Bloch nota que a maior parte destes atos sobrenaturais são atribuídos aos reis fundadores – àqueles que começam dinastias ou que lançam a independência de territórios – e em contextos, normalmente, bélicos, o que reforça a conceção do rei como parte da nobreza. Ou seja, paradoxalmente, a inserção do rei no contexto bélico, mesmo que dourada pelos feitos milagrosos, contribuirá para uma conceção mais distribuída do poder ou da soberania, já que o rei não aparece tanto como um elemento isolado, mas como parte de uma classe.

“Enquête sur la monarchie”

Charles Maurras

Este livro nasce de um inquérito, no sentido jornalístico da palavra, em que o autor entrevista uma série de personalidades do seu tempo, de aristocratas a escritores, para saber se encontrar vantagens na monarquia. Além de ter ficado como uma das grandes denúncias da República francesa do princípio do século, marca também o ressurgir da ideia monárquica em França, já não nos termos argumentativos vindos de Chambord e dos partidos legitimistas ou bonapartistas, mas numa conciliação com a ideia de Nação e com a consciência de que a monarquia, mais do que o coroar de um sistema, é uma noção integral, que atravessa todos os momentos da vida em sociedade, da literatura ao modo de entender a economia.

“A Constituição Inglesa”

Walter Bagehot

Se a monarquia inglesa contemporânea tem um teórico, esse é com certeza Bagehot. É ele que se dedica a mostrar que, mesmo que não esteja escrita, há uma ordem constitucional no modo como a monarquia inglesa se relaciona com a política, e essa ordem consiste basicamente na compreensão do papel da realeza como um papel de representação, que apela àquilo que está fora da esfera dialética, parlamentar, a que o governo procura responder.

“Monarchy and the Constitution”

Vernon Bogdanor

É um dos mais importantes livros contemporâneos sobre as relações entre monarquia e democracia. Bogdanor procura explicar que a monarquia fortalece as instituições democráticas e as dota de um tipo peculiar de legitimidade. Bogdanor analisa várias crises da monarquia contemporânea inglesa – a abdicação de 36 ou o conflito com a Câmara dos Lordes, em 1914, por exemplo – para mostrar quais são as prerrogativas do rei e de que modo contribuíram para a estabilidade da democracia na Grã-Bretanha.

“Pela Dedução à Monarquia”

Pequito Rebelo

É uma das obras simbólicas do Integralismo Lusitano, inspirada na citação de Maurras “a necessidade da monarquia demonstra-se como um teorema”. Pequito faz uma análise histórica da sociedade portuguesa, mostrando que a monarquia é o ponto de equilíbrio entre os vários estados, impedindo o país de cair na metafísica revolucionária ou de se perder em interesses oligárquicos. É uma espécie de tratado sobre o papel das elites na sua associação com a monarquia, que dá uma importância de primeira ordem ao combate intelectual.

“Razões Reais”

Mário Saraiva

Trata-se de um pequeno trabalho apologético da monarquia, que a vê como correlato de um tipo de organização da sociedade comunalista, em que os corpos intermédios são uma espécie de garante da representatividade do povo, oferecendo assim uma participação na vida política mais completa do que aquela que se encontra na simples democracia representativa.