Por ter tomado posse da Media Capital, dona da TVI, sem a prévia autorização dos reguladores, a ERC multou a Pluris (empresa de Mário Ferreira), a Prisa e a Vertix (da Prisa) ao pagamento, cada, de 350 mil euros, ainda que, depois, tenha reduzido o valor a metade, condicionado ao bom comportamento.

Esta decisão foi tomada em fevereiro, mas só agora a ERC publicou no seu site, conforme já tinha sido noticiado pela Página Um. Mas o processo iniciou-se no ano 2020, quando a ERC abriu a investigação “pela existência de fortes indícios da ocorrência de uma alteração não autorizada de domínio sobre os operadores de rádio e de televisão a operar sob licença, que compõe o universo do grupo Media Capital”.

Em 2020 a Prisa (através da Vortix) detinha quase 95% da Media Capital, tendo Mário Ferreira, através da Pluris, celebrado um memorando de entendimento com os espanhóis a 10 de abril de 2020 com os termos e condições da compra de 30% da Media Capital, tendo sido comunicado ao mercado a 24 de abril. Mas Mário Ferreira, mesmo antes de concluir a transação, já tomava decisões na empresa. Uma das conclusões da ERC foi a de que Manuel Alves Monteiro, que entrou para a administração da Media Capital ainda a Prisa era detentora do capital, era afinal um “homem” de Mário Ferreira e tomou decisões já por este empresário dono da Douro Azul.

“Através de Alves Monteiro, e desde a data da sua cooptação como administrador não executivo, com o assentimento da Prisa e da Vertix, e a conveniência de todas as arguidas, a Pluris passou, indiretamente, a controlar a gestão estratégica e o governo da Media Capital”, lê-se na decisão da ERC, consultada pelo Observador, que acrescenta: “Por seu turno, o próprio Mário Ferreira, acionista maioritário da Pluris, teve intervenção direta e decisiva na gestão estratégica da Media Capital”.

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Alves Monteiro entrou para a administração, como não executivo, da Media Capital a 15 de abril de 2020. Alves Monteiro, acrescenta a ERC, é pessoa de confiança de Mário Ferreira, exerceu funções em empresas ligadas ao empresário dos navios turísticos, e diz ainda o regulador “Alves Monteiro e Mário Ferreira mantêm uma relação de amizade há já vários anos”.

A ERC concluiu que o convite partiu formalmente da Prisa, mas com a anuência de Mário Ferreira. Não tinha, então, experiência no setor da comunicação social, mas passou a dispor de gabinete na Media Capital.

Coordenou o projeto Olimpo, que através da Boston Consulting Group, visava desenvolver um plano de negócio e estratégico; ficou encarregado de negociar os contratos de direitos televisivos do Euro 2020 com a Sport TV; teve negociações com bancos credores da Media Capital para renegociar dívida. A ERC diz ainda que “ainda como administrador não executivo da Media Capital e sem assento no conselho de administração da TVI, Alves Monteiro iniciou negociações, tomou um conjunto de decisões relevantes e promoveu alterações importantes na estrutura do próprio operador de televisão TVI, nomeadamente as atinentes à contratação de recursos humanos e à recomposição dos quadros da empresa”.

Uma destas contratações foi Cristina Ferreira, que “implicava um considerável impacto financeiro”, acrescenta a ERC, dizendo, ainda, que “a intervenção pessoal de Mário Ferreira, em finais de maio de 2020, foi determinante na contratação da apresentadora para a TVI”. O empresário prometeu, mesmo, a entrada de Cristina Ferreira no capital da Media Capital, o que acabaria por acontecer.

Alves Monteiro, por outro lado, foi também envolvido nas negociações que “culminaram com a decisão de nomeação de Nuno Santos como diretor-geral da TVI”, que teve igualmente mão de Mário Ferreira.

A ERC diz ainda que o perfil de Alves Monteiro não se enquadra nas escolhas anteriores da Prisa, mas, no entanto, “está conforme ao compromisso reciprocamente assumido pela Prisa, Vertix e Pluris”.

Para a ERC há, então, várias provas de que “o relacionamento entre os acionistas de referência Prisa/Vertix com a Pluros pautou-se pela concertação de um conjunto de acordos e decisões que visavam a transferência dos poderes de controlo da Media Capital para a Pluris e, indiretamente, do controlo dos próprios operadores de televisão e de rádio”, acrescentando que “os atos praticados pela Pluris, através de Alves Monteiro e de Mário Ferreira, materializam a posição de controlo de facto do novo investidor, a Pluris, na definição e condução das políticas de gestão estratégica do grupo Media Capital e, em consequência, dos operadores de televisão e de rádio que compõem o seu universo”.

A relação dominante alterou-se logo, segundo a ERC, a 10 de abril de 2020, “passando a Pluris a assumir o controlo total da atividade da Media Capital”. E embora só tivesse 30%, comportou-se “como se de acionista maioritário se tratasse”. A ERC diz mesmo que “as arguidas praticaram os factos descritos de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei”.

E isto sem que tivessem sido autorizadas pela ERC ao abrigo da Lei da Rádio e da Lei da Televisão.

A ERC concluiu pela existência de 15 contraordenações pela Pluris, pela Prisa e pela Vertix, cada. Feito o cúmulo jurídico, cada uma recebeu uma coima de 350 mil euros, mas a ERC suspendeu metade do valor (175 mil euros, cada) pelo período de dois anos que terão de pagar em caso de reincidência.