As aspirinas são conhecidas pelos seus efeitos a reduzir dores de cabeça ou febres, mas também por serem usadas para diminuir o risco de um ataque cardíaco ou acidente vascular cerebral (AVC), se este for causado por coágulos. Mas se não for um doente de risco, a recomendação é para não tomar aspirina como forma de prevenção, porque pode ter consequências ainda piores, alerta uma equipa que junta investigadores australianos e norte-americanos. A melhor opção será sempre falar com o médico antes de começar ou parar de tomar aspirina, como aconselham vários profissionais ouvidos pelo jornal The New York Times.

Os autores decidiram pegar nos dados de um ensaio clínico que decorreu entre 2010 e 2014 para perceber se a toma diária de uma dose baixa de aspirina (ácido acetilsalicílico), durante um longo período de tempo, alterava a incidência de AVC ou de hemorragia intracraniana— informação que podia ser extraída dos dados, mas que não era a pergunta principal do ensaio clínico. O ensaio clínico queria perceber se, comparado com um placebo, a aspirina poderia aumentar a esperança de vida ou uma vida sem demência e sem dificuldades físicas em adultos saudáveis acima dos 70 anos.

A equipa de Geoffrey C. Cloud, do departamento de Neurociências da Universidade Monash (Austrália), não encontrou benefícios na toma de aspirina na prevenção do AVC nestes adultos saudáveis, mas encontrou um risco acrescido de hemorragia no cérebro, quer devido a um AVC hemorrágico ou a outras causas, como traumatismos cranianos resultantes de uma queda, conforme mostraram no artigo publicado esta quarta-feira na revista científica JAMA Network Open.

Esta análise contou com os dados de mais de 19 mil adultos saudáveis, ou seja, que não tinham historial de problemas cardíacos ou cardiovasculares — metade tomou doses baixas de aspirina e metade tomou um placebo. Dos participantes, 108 que tomaram aspirina tiveram hemorragia cerebral (dos quais, 49 causada por AVC hemorrágico) contra 79 que tomaram placebo (37 dos quais teve AVC hemorrágico). Mas as vantagens na prevenção de AVC isquémico (causado por obstrução dos vasos sanguíneos) não foi significativa: 3,9 AVC por cada mil pessoas (146 no total) a tomar aspirina contra 3,4 AVC por cada mil pessoas a tomar o placebo (166 no total).

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O risco de hemorragia é justificado precisamente pelo potencial do medicamento: evita que as plaquetas se juntem formando um coágulo, mas é esse coágulo que impede que o sangramento continue (é por isso que os cortes e feridas deixam de sangrar). Tanto pior nas pessoas mais velhas, com vasos sanguíneos mais frágeis e mais sujeitas a quedas, ou seja, nas pessoas que podem facilmente abrir uma ferida (interna e externa), mais difícil de estancar se estiverem a tomar anticoagulantes.

Assim, para os investigadores, os potenciais benefícios do uso da aspirina na prevenção do AVC isquémico são ultrapassados pelo risco de uma hemorragia cerebral, mais difícil de tratar, mais vezes fatal e que deixa, mais frequentemente, as pessoas incapacitadas. Os autores também reconhecem, no entanto, que este trabalho deveria ter continuidade para dar respostas mais robustas.

Um dos problemas, por exemplo, é que o número de AVC isquémicos e hemorragias intracranianas é relativamente baixo para um número tão grande de participantes no ensaio clínico. Depois, não foi analisada a ocorrência de ataques cardíacos e a influência da aspirina na sua ocorrência. As conclusões também não podem ser extrapoladas para todos os grupos — a maior parte dos participantes no ensaio eram pessoas brancas australianas — e não pode certamente ser aplicada a pessoas que já tomam aspirina depois de terem tido um episódio cardiovascular que justifique essa medicação.