Mais de oito mil já subscreveram uma petição pública lançada este sábado para exigir a alteração do nome da nova ponte pedonal da zona oriental de Lisboa, a que a Câmara Municipal de Lisboa (CML) quer chamar Ponte Cardeal Dom Manuel Clemente. A petição, que já conta com mais de oito mil assinaturas, já pode ser discutida no Parlamento. Contactada pelo Observador, a CML diz nada ter a acrescentar sobre o assunto.

Intitulada “Petição pela alteração do nome previsto para a ponte Lisboa/Loures no Parque Tejo”, a petição foi lançada este sábado através da rede social X (antigo Twitter) por Telma Tavares, autora dos cartazes em memória das vítimas de abusos sexuais por membros da Igreja Católica que foram colocados em Lisboa, Loures e Algés durante a Jornada Mundial da Juventude (JMJ).

Nova ponte ciclopedonal entre Lisboa e Loures vai chamar-se Ponte Cardeal Dom Manuel Clemente

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Às 19h deste domingo, a petição contava com 8500 assinaturas. Assim, e como já ultrapassou o mínimo necessário para ser discutida no parlamento (7500 assinaturas), a petição vai ser discutida na Assembleia da República.

A petição invoca “a suposta laicidade do Estado” e questiona se a atribuição do nome de Manuel Clemente à ponte “pode ser vista até como uma ofensa e/ou desrespeito pelas mais de 4800 vítimas de abuso sexual por parte da igreja em Portugal”.

“Sendo a ponte um dos equipamentos que foi pago com recurso a dinheiros públicos, que todos os portugueses irão pagar com assinalável esforço, o mínimo exigível será que se homenageie quem tenha factualmente marcado a diferença ou sido autor de feitos que mereçam destaque no nosso município”, argumenta ainda.

Contactada pelo Observador, fonte oficial da CML diz que a autarquia, liderada por Carlos Moedas, nada tem a acrescentar sobre o tema.

D. Manuel Clemente “merece muito pouco o ar que respira”

À rádio Observador, Cristina Amaral, fundadora da Associação de Vítimas e Sobreviventes dos Abusos Sexuais da Igreja, diz estar contra a decisão de homenagear Manuel Clemente com o nome na Ponte do Trancão. “O senhor cardeal limitou-se a fazer o seu trabalho e mal feito. Encobriu os abusos e proferiu as palavras que proferiu após o resultado da Comissão Independente”, sublinha Cristina Amaral, realçando ser “vergonhoso que, com dinheiros públicos, a CML coloque o nome deste senhor” na ponte. “Estou incrédula”, admite. Cristina Amaral diz mesmo que Manuel Clemente “merece muito pouco o ar que respira”.

A CML anunciou na sexta-feira que a nova ponte ciclopedonal que liga os concelhos de Lisboa e Loures, sobre o rio Trancão, na zona oriental da cidade, vai chamar-se Ponte Cardeal Dom Manuel Clemente.

Outra petição aplaude nome da ponte e quer dar nome do Papa Francisco ao Parque Tejo

Entretanto, uma outra petição, em sentido oposto à que exige a mudança do nome da ponte, saúda a decisão das Câmaras de Lisboa e de Loures de atribuírem à ponte sobre o Trancão o nome de Dom Manuel Clemente. “Fica assim para memória vindoura o nome de um grande bispo do Patriarcado de Lisboa, uma instituição histórica do território que compreende as duas cidades ligadas por essa ponte. Dom Manuel Clemente contribui de forma decisiva para a revitalização da sociedade civil católica e teve também uma enorme influência na sociedade portuguesa durante o seu pontificado”, sublinham os promotores, acrescentando que o ainda patriarca de Lisboa é “um homem que soube fazer pontes entre a Igreja e a sociedade. A decisão de atribuir o seu nome a esta ponte é um justo reconhecimento do seu papel na sociedade”.

O aplauso à decisão, nessa petição, é acompanhado pela sugestão de “que seja oficialmente atribuído ao Parque Urbano Tejo-Trancão o nome de Parque Papa Francisco, fazendo assim memória deste acontecimento único para as nossas duas cidades”.

Em comunicado, a autarquia afirmou que o nome da nova ponte, construída a propósito da JMJ e inaugurada em julho, é uma homenagem ao 17.º patriarca de Lisboa, que renunciou ao cargo após ter completado 75 anos.

“Nos 10 anos de mandato enquanto líder da Igreja de Lisboa, D. Manuel Clemente foi o grande impulsionador da Jornada Mundial da Juventude, que nas palavras do patriarca emérito ‘será lembrada como um momento decisivo para uma geração que construirá um mundo mais belo e fraterno’”, lê-se na nota.

“É uma justa homenagem da cidade a um homem que deu tanto a Lisboa ao longo da sua vida”, afirmou o presidente da câmara da capital, Carlos Moedas, citado no comunicado.

Numa mensagem enviada à Lusa, Manuel Clemente agradeceu “a generosidade” da CML e disse incluir no seu nome “todos quantos trabalharam na Jornada Mundial da Juventude”.

Segundo a câmara de Lisboa, o nome da ponte foi comunicado ao presidente da autarquia de Loures, Ricardo Leão, que considerou tratar-se de “uma boa opção e um justo reconhecimento”. A ponte tem cerca de 560 metros e liga os concelhos de Lisboa e Loures, sendo feita, maioritariamente, de madeira e aço.

A ponte destina-se a peões e ciclistas, integrando a rede de percursos ciclopedonais da região de Lisboa e ligando-a ao concelho de Loures.