A antiga dirigente do Partido Comunista Português, Margarida Tengarrinha, morreu esta quinta-feira, aos 95 anos, avançou o jornal Sul Informação. A algarvia foi artista, escritora, professora, militante comunista e falsificadora.

O corpo de Margarida Tengarrinha estará em câmara ardente na Casa Mortuária da Igreja do Colégio em Portimão no dia 31 de outubro, a partir das 9h30, saindo às 12h30 para o crematório de Albufeira, informa o PCP.

O Partido Comunista lamentou a morte da antiga deputada em nota pública e o Esquerda.net lembrou que a comunista “não se coibiu de estabelecer pontes” com a publicação e o Bloco de Esquerda.

Margarida Tengarrinha nasceu em Portimão, a 7 de maio de 1928, no seio de uma família da pequena burguesia da cidade. E costumava contar uma história que a marcou aos cinco anos: viu uma investida da Guarda Nacional Republicana a cavalo sobre um grupo de pessoas, com adultos e crianças. Só mais tarde veio a saber que se tratava das fortes manifestações do 18 de janeiro de 1934.

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“O 18 de janeiro foi uma grande luta dos operários portugueses contra o fascismo, na medida em que o fascismo inviabilizou, proibiu, todos os sindicatos nacionais livres e criou uma forma sindical dominada pelo patronato e os operários revolutaram-se contra isso”, disse numa entrevista no âmbito do programa “Vidas Prisionáveis” do Museu do Aljube – Resistência e Liberdade.

Outra data marcante, contou Margarida Tengarrinha, foi o 7 de maio de 1945, quando o exército alemão se rendeu às tropas russas, a II Guerra Mundial terminava na Europa e em Portugal se “assistia à maior manifestação anti-fascista de sempre”. Na altura, a algarvia já tinha vindo para Lisboa completar o liceu (ensino secundário).

Desde muito cedo, teve contacto com artistas e acabou por estudar na Escola de Belas Artes em Lisboa. Foi já como estudante na capital, em 1948, que iniciou a vida política, nomeadamente no Movimento de Unidade Democrática Juvenil (MUD) — um movimento bastante global (que até incluía católicos), mas que António Salazar mais tarde ilegalizou pelas fortes ligações ao Partido Comunista Português (PCP).

Foi também aí que conheceu o companheiro e pai das duas filhas, o também artista José Dias Coelho. Margarida, José e mais 80 alunos e professores da Escola de Belas Artes acabariam por ser expulsos depois de se manifestarem pela saída de Portugal da NATO em 1952, uma organização que descrevia como “uma união de forças para a guerra”.

Tengarrinha e os colegas de Belas Artes, pelo contrário, apelavam à paz, desenhavam a pomba de Picasso pelas paredes de Lisboa e na altura da cimeira da NATO em Lisboa colocaram dois cartazes no elevador de Santa Justa e lançaram gravuras ao vento.

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A artista, escritora e professora, acabou por viver na clandestinidade com José Dias Coelho, por conta das suas habilidades como artista que eram aproveitadas pelo Partido Comunista para a falsificação de documentos (bilhetes de identidades, cartas de condução, cartas de pescador, etc.). No total, foram quase 20 anos a viver clandestina e 11 anos sem ver a filha mais velha.

José Dias Coelho foi morto pela PIDE em dezembro de 1961. Na altura, Margarida Tengarrinha pensou que o companheiro tinha sido preso, mas só dias mais tarde, a 26 de dezembro, soube de forma muito crua que este havia sido assassinado. Tudo o que sabia era que tinha de arrumar tudo e deixar a casa onde estava. Vacilou sem saber se continuaria na clandestinidade ou não. Ficou porque “havia trabalho a fazer”: “a falsificação era fundamental”.

Depois da morte do companheiro viajou para Moscovo, na então União Soviética, onde trabalhou com Álvaro Cunhal, na altura secretário-geral do PCP, também no exílio. Passou pela Roménia onde foi editora da Rádio Portugal Livre que era emitida clandestinamente em Portugal.

Quando voltou a Portugal, em 1968, continuou na clandestinidade e a trabalhar para o partido, nomeadamente retomando o trabalho na publicação Avante!. Sempre acreditou que essa vivência clandestina e a ditadura teriam um fim. Ao longo dos anos foi vendo as manifestações acontecerem, o que lhes dava esperança no futuro. Depois do 25 de abril de 1974 e até 1988 integrou o comité Central do PCP.

Foi deputada pelo Algarve entre 1979 e 1983, mas disse que “ser deputada era uma coisa de somenos importância na vida que tive”. Desiludiu-se com o parlamento e voltou definitivamente para a região em 1986. Vivia na Praia da Rocha desde então.

Última atualização às 17h40