O inspetor do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) que foi acusado de tentativa de violação de uma mulher de nacionalidade brasileira, no aeroporto de Lisboa, começa a ser julgado na próxima terça-feira, dia 28 de novembro. Acusado também dos crimes de coação sexual e de coação agravada, o inspetor do SEF pediu a abertura de instrução — fase que antecede o julgamento e que serve precisamente para o tribunal avaliar se existem indícios suficientes para que exista julgamento — e o Tribunal Central de Instrução Criminal de Lisboa entendeu que o homem deverá ser julgado. “Por ora, há indícios suficientes da prática dos factos e de que o arguido foi o seu agente”, lê-se na decisão instrutória a que o Observador teve acesso.

O caso aconteceu há cinco anos — e a acusação demorou precisamente cinco anos a ser deduzida –, quando uma mulher aterrou no aeroporto de Lisboa, apenas para fazer uma escala para a Escócia, onde vivia o namorado. Assim que saiu do avião, esta mulher passou no controlo de documentos, que era feito por elementos do SEF, viu a sua permanência em território português recusada e foi informada de que teria de regressar ao Brasil. Os motivos, tal como o Observador avançou em maio, eram essencialmente três: primeiro, a justificação de que iria visitar o namorado à Escócia não era suficiente para convencer os inspetores de que não iria entrar no país ilegalmente, depois, não apresentava meios de subsistência suficientes e, por último, os inspetores do SEF que estavam de serviço naquele dia consideraram que o passaporte era falso.

Os momentos de terror que uma mulher viveu às mãos de um inspetor do SEF no carro que a levou ao avião para ser deportada

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Depois de horas de espera numa sala, esta mulher relatou — e é isso que consta na acusação — que o inspetor do SEF que começa em breve a ser julgado começou por dizer que não concordava com a decisão dos colegas, que tinham determinado a sua deportação. Já dentro da carrinha que a levaria ao avião de regresso ao Brasil, descreve o Ministério Público, o inspetor do SEF terá feito comentários sobre o corpo da mulher e terá feito ameaças: se o seu comportamento não satisfizesse os interesses do inspetor, seria atirada para fora do carro e todas as pessoas iriam ouvir e acreditar que estava louca. Terá tentado beijá-la e, a determinado momento, terá colocado as mãos dentro das suas calças.

A mulher relatou que resistiu, que começou a chorar e que o inspetor a ameaçou novamente para que esta não contasse nada a ninguém.

Apesar de a defesa do inspetor considerar que as descrições feitas pela mulher não são suficientes, a juíza do tribunal de instrução teve outro entendimento: “Não há qualquer dúvida para este tribunal que a ofendida sofreu os atos que descreve e nas circunstâncias em que relata, quando estava à responsabilidade do SEF”.

Não há, de igual modo, qualquer dúvida que a ofendida é uma pessoa credível“, lê-se ainda no despacho de instrução. E mais: “a ofendida nem sabia quem era o suspeito, pelo que não se vislumbra qual seria o interesse da mesma em prejudicar um desconhecido, sobretudo considerando os evidentes inconvenientes que o presente inquérito representou para si durante a pandemia covid-19 e vivendo em outro país”.

Para abertura de instrução, o inspetor do SEF referiu que o episódio relatado pela mulher terá acontecido durante o período da tarde e que este saiu do serviço à hora de almoço, apresentando até uma fatura em seu nome, durante aquela tarde, para mostrar que não estava no aeroporto. No entanto, o tribunal também não ficou convencido com este argumento, considerando que o mesmo “não é suficiente”. “O facto de outras pessoas poderem atestar que o arguido saiu com as mesmas, não significa que tenham acompanhado o seu percurso depois de o arguido deixar de estar na sua companhia e que saibam o que o arguido fez, ou não, depois de as próprias testemunhas terem abandonado o aeroporto”.

E em relação à fatura em seu nome, considerou o tribunal, isto “não significa que, de facto, o arguido ali tenha estado naquele dia, havendo outras justificações plausíveis”.