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Bob Marley num retrato demasiado controlado

"Bob Marley: One Love" foca-se num período específico da estrela jamaicana para projetar a importância de um legado histórico. Mas é demasiado educado e pouco ambicioso na história que escolhe contar.

As melhores cenas do filme acontecem em estúdio. Porque nesses momentos mostra-se parte do mais íntimo do músico e porque é na música que reside grande parte da força que ainda hoje se lhe reconhece
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As melhores cenas do filme acontecem em estúdio. Porque nesses momentos mostra-se parte do mais íntimo do músico e porque é na música que reside grande parte da força que ainda hoje se lhe reconhece

As melhores cenas do filme acontecem em estúdio. Porque nesses momentos mostra-se parte do mais íntimo do músico e porque é na música que reside grande parte da força que ainda hoje se lhe reconhece

Os biopic expõem-se a um escrutínio inevitável: que história contariam se o ângulo fosso outro? Por “ângulo” entenda-se o olhar do realizador, a narrativa escrita pelos argumentistas e a imagem transmitida pelos protagonistas. Todd Haynes encontrou uma solução com engenho para alguns destes problemas em Não Estou Aí, filme que mostrava vários retratos de Bob Dylan através de outras tantas interpretações. Tudo para nunca responder em definitivo à pergunta “quem é Bob Dylan?” e sem querer fazer juízos: será esta uma boa pessoa ou uma má pessoa?

Na verdade, uma característica habitual num filme biográfico é “dizer bem” da pessoa no centro da ação. Bob Marley: One Love satisfaz várias exigências de um biopic. Por vezes, até se aproxima de um bom biopic. Mas também acaba por servir de “biografia autorizada”, demasiado próxima do visado, com todas as condicionantes que tal decisão implica. Rita Marley, viúva da maior estrela da história do reggae (e retratada no filme para lá da competência por Lashana Lynch), e Ziggy Marley, um dos filhos do músico (cujo nome é referido no filme muitas vezes sem qualquer necessidade) fazem parte da lista de produtores do filme. Resultado: há um lado (ou vários, até) de Bob Marley (um Kingsley Ben-Adir a dar toda a fluidez necessária à personagem) que ficaram de fora.

O ponto de partida de Bob Marley: One Love é o concerto pela paz Smile Jamaica (1976), promovido com o objetivo de unir um povo à beira de uma guerra civil, um país que tentava superar dificuldades na hora de encontrar uma voz como ex-colónia. O destino está em 1978, noutro concerto, o One Love Peace Concert, também na Jamaica. O evento já não foi organizado por Marley, teve um lado mais institucional, uma quase-manobra de marketing para tirar a famosa fotografia em que os opostos se unem (Michael Manley e Edward Seaga surgem em palco a dar as mãos). Estas duas balizas temporais servem dois propósitos: um, mostrar a importância de Bob Marley na cultura — nas suas diversas e profundas camadas — contemporânea da Jamaica; e, dois, a evolução do artista e do ativista, o homem que vence uma certa ideia de ego para colocar a música acima de tudo.

[o trailer “Bob Marley: One Love”:]

Eis então o filme de Reinaldo Marcus Green (King Richard: Para Além do Jogo e a série We Own This City), o Marley pela paz de um país, mas também à procura de um som, de uma música, que fale para todos, que todos oiçam e entendam. O Bob Marley que foge da Jamaica com medo que o assassinem ou façam algo à família (tentaram matá-lo, à mulher e ao manager antes do “Smile Jamaica”) e que se refugia em Londres para gravar Exodus.

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Curiosamente, as melhores cenas acontecem em estúdio (a outra num flashback, com os The Wailing Wailers a tocarem Simmer Down a uns desconfiados Coxsone Dodd e Lee “Scratch” Perry). Porque nesses momentos mostra-se parte do mais íntimo do músico e porque é na música que reside grande parte da força que ainda hoje se lhe reconhece. É interessante a forma como Marcus Green mostra as diferentes fases do processo e desmonta as gravações de Exodus, álbum que fez explodir a carreira de Marley internacionalmente. Os clássicos cantados servem ilustrar os momentos que vemos no ecrã e para contar aquilo que não coube na história transformada em filme.

É nessa gravação que Bob Marley: One Love é mais interessante. Vemos o músico a lutar consigo mesmo, a saber que pode chegar a um lugar, que tem a ideia, a visão, a mensagem, mas não sabe como a transmitir, só o saberá passando pelo processo (o pormenor da elaboração da capa do álbum é delicioso).

Lashana Lynch como Rita Marley e Kingsley Ben-Adir, o protagonista do filme

De resto, somam-se as debilidades de um filme demasiado preocupado em seguir a etiqueta da biografia e em respeitar a imagem que a família Marley quer manter do patriarca. Por vezes, as duas entram em conflito, como quando Bob e Rita discutem por causa das aventuras extraconjugais. Mas soam sobretudo a momentos “checklist”, que passam tão rápido como chegaram, sem acrescentar grande coisa.

Bob Marley: One Love executa bem a ideia de universalidade do ícone, de como foi porta-voz de um género que não é só algo que se escuta — é, sobretudo, uma forma de viver. Mas poderia existir ainda mais se não estivesse tão confinado à ideia de ser tão certinho e serviçal. Voltando ao primeiro parágrafo e a Bob Dylan: falta a este filme a pergunta “Quem é Bob Marley?”, ou seja, a vontade de perceber as várias camadas do artista através da pergunta e da dúvida, ao invés de se apresentar como uma obra com respostas chapadas para perguntas ausentes.

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