A Autoridade da Concorrência (AdC) anunciou esta terça-feira que sancionou com uma coima de quase 14 milhões de euros o Grupo SIBS – dono do Multibanco e do MBWay – por abuso de posição dominante no setor dos serviços de pagamento, ao obrigar os emitentes e adquirentes de cartões de pagamento que procuraram aceder aos sistemas de pagamento do grupo a contratar também os seus serviços de processamento.

Esta é a decisão da Autoridade da Concorrência, num processo que começou com buscas noticiadas pelo Observador, feitas em janeiro de 2021. Mais tarde, no verão de 2022, a SIBS tinha sido acusada de abuso de posição dominante, recorrendo a práticas irregulares para evitar a entrada de novas empresas no setor dos pagamentos em Portugal.

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De acordo com comunicado de imprensa da Autoridade de Concorrência, a empresa liderada por Madalena Cascais Tomé tentou “obrigar os emitentes e adquirentes de cartões de pagamento que procuraram aceder aos sistemas de pagamento do grupo a contratar também os seus serviços de processamento”.

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Tal prática de vendas ligadas (tying) é passível de restringir a concorrência e a inovação no setor dos serviços de pagamento e prejudica quer os concorrentes do Grupo SIBS, que também atuam no processamento, quer, em última instância, os comerciantes e consumidores, que ficaram privados de serviços diferenciadores”, salienta a Autoridade da Concorrência.

Esta prática, que durou cerca de três anos, limitou a entrada e expansão de processadores concorrentes do Grupo SIBS, que manteve quotas de mercado superiores a 90% durante todo este período nos mercados de processamento. Em concreto, as sociedades visadas pela decisão da AdC são a SIBS SGPS, a SIBS FPS, a SIBS MB e a SIBS Cartões.

“A violação das regras de concorrência não só reduz o bem-estar dos consumidores, como prejudica a competitividade das empresas, penalizando a economia”, termina a Autoridade da Concorrência.

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SIBS vai contestar multa sem “qualquer fundamento”

As decisões sancionatórias da AdC podem ser objeto de recurso, porém, o recurso não suspende a execução das coimas. A SIBS já anunciou que vai contestar a decisão, por considerar que esta não tem “qualquer fundamento”.

Em comunicado, o grupo SIBS diz que “rejeita em absoluto as conclusões da Autoridade [da Concorrência], pelo que irá impugnar judicialmente esta decisão junto do Tribunal de Concorrência, Regulação e Supervisão”.

No documento, a SIBS defende que as práticas referidas pela AdC “são legais, que o processo não tem qualquer fundamento nem suporte jurídico ou económico e não reconhece qualquer objetividade nas conclusões da Autoridade da Concorrência”.

Associação critica Banco de Portugal e questiona acionistas da SIBS

A Associação Nacional de Instituições de Pagamento e Moeda Eletrónica (ANIPE), que assume ainda não ter visto o despacho de condenação, desvaloriza a coima aplicada por considerar que “não vai resolver nenhum dos problemas estruturais do nosso mercado”. As medidas corretivas é que visam corrigir “condutas monopolísticas e promover a diversificação e crescimento do mercado com benefícios para consumidores e comerciais”.

A associação recorda que existe uma determinação (a segunda) do Banco de Portugal para que a SIBS cumpra regulamentação específicas, “imponto medidas para passar a evitar estas práticas de posição dominante a partir de dezembro de 2024”, o que, no entender desta entidade, “denota que o próprio regulador reconhece o ilícito e o tenta mitigar”, podendo, assim, dificultar a abstenção posterior da SIBS, no entender da ANIPE.

Para esta entidade, ainda assim, “o Banco de Portugal não supervisionou de forma correta o cumprimento de um regulamento europeu, de aplicação direta, e que data de 2015. A reação tardia foi minimalista, tendo deixado à SIBS o poder de decisão sobre aspetos importantes da sua prática comercial, permitindo soluções que não são do interesse comum, que protegem o infrator e pervertem o bom funcionamento de mercado”.

E, por isso, deixa ao Banco de Portugal a pergunta sobre o que vai fazer perante esta decisão da AdC e se vai aplicar alguma sanção pecuniária à SIBS. “Como vai explicar isso às empresas de menor dimensão que são multadas constantemente?”.

Também questiona a CMVM sobre se vai determinar a comunicação desta coima da Concorrência por parte dos emitentes acionistas da SIBS.

E, por fim, os acionistas da SIBS: “a atual administração da SIBS, cuja maioria dos membros estava em pleno exercício de funções aquando da violação legal e concorrencial continuada, agora sentenciada, tem condições para ser reconduzida?” e, acrescenta, “não haverá qualquer impacto no processo de registo do Banco de Portugal referente à recondução da atual administração?”.

Quer, também, uma reação do futuro governo.

“A SIBS tem condições para continuar a ser a entidade que auxilia o Banco de Portugal na estratégia de distribuição e operacionalização do euro digital e também para gerir a câmara de compensação de todos os pagamentos de pessoas e empresas em Portugal? É que estamos a falar de uma violação continuada do enquadramento legal financeiro e também concorrencial”, conclui a associação, em comunicado.