Os resultados eleitorais da Venezuela estão a ser contestados por grande parte da comunidade internacional, com os EUA a reconhecer o candidato da oposição Edmundo González como vencedor da eleição presidencial do país e a União Europeia a admitir que não pode reconhecer o resultado do processo até que todos os votos sejam contados e os registos fornecidos.

O Presidente Nicolás Maduro, no poder desde 2013, pediu na quarta-feira ao tribunal superior da Venezuela que conduzisse uma auditoria da eleição presidencial, mas várias entidades consideram que o tribunal é demasiado próximo do governo para uma revisão independente, pelo que se espera que a eventual análise continue ela própria a ser contestada. Uma crise que parece estar longe do fim.

Foi no passado domingo que os venezuelanos foram às urnas para eleger o Presidente. Dos votos eletrónicos às mesas de voto selecionadas de forma aleatória para ser auditadas, afinal como funciona todo o processo eleitoral que está a ser contestado?

1. O voto

A Venezuela implementou o sistema de votação eletrónica em 2004, seguindo o exemplo do Brasil que já tinha informatizado o processo em 1996. No caso brasileiro, o que impulsionou o uso da urna eletrónica, há quase 30 anos, foi a grande quantidade de fraudes com boletins de voto em papel, com votos que eram tidos como anulados após serem rabiscados durante a contagem. Aquando da adoção do sistema, a justificação da Venezuela foi idêntica, mas a possibilidade de manipulação na contagem de votos ficou longe de ficar afastada.

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Desde a identificação do eleitor até a contagem dos votos, todo o processo eleitoral no país liderado por Maduro há 11 anos é eletrónico, como explica o El País. A identidade de cada eleitor venezuelano é verificada com uma impressão digital, bem como a sua presença no registo dos cadernos eleitorais.

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Depois deste primeiro passo de identificação ser completado, o eleitor é direcionado para uma urna eletrónica. A máquina regista o voto eletronicamente, mas também emite um recibo em papel. A versão impressa do voto é depositada na urna para posterior verificação.

2. A contagem

Após a votação, no final do dia da eleição, inicia-se a contagem em cada mesa de voto na Venezuela. O presidente da mesa dá início ao processo e, junto com um técnico do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela, imprime a ata nas máquinas disponibilizadas para o efeito. O processo é (supostamente) público. No entanto, foi relatada a expulsão de testemunhas e observadores internacionais dos centros eleitorais nesta fase no passado domingo.

As mesmas máquinas transmitem os resultados ao CNE, para a sala de contabilização. Lá serão somados os votos de todo o país para produzir o resultado oficial das eleições. No final da transmissão, são impressas cópias das atas para as testemunhas dos três principais partidos das eleições anteriores verificarem.

Findo todo o processo, a comissão declara o vencedor. No domingo passado fê-lo com base em apenas 80% de escrutínio e dando a vitória a Nicolás Maduro. Já a oposição, que diz ter reunido 81% das atas, atribui 3.225.819 votos a Nicolás Maduro e 7.119.768 a Edmundo González Urrutia. Ou seja, 30% da votação total para o atual Presidente da Venezuela e 67%  para o seu opositor.

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Ainda segundo as regras definidas na Venezuela, a comissão eleitoral teria de publicar as atas com a informação de cada máquina na Internet. Até à data, estas atas não foram publicadas, apesar dos repetidos apelos da comunidade internacional e dos partidos que fazem oposição a Maduro no país.

3. A verificação

Em teoria, no final da contagem, a primeira fase da auditoria de verificação cidadã tem que ser realizada em cada centro de votação. O processo consiste na comparação da ata, emitida pelas máquinas já referidas, com a cópia do voto nas urnas, permitindo verificar se o resultado das atas impressas coincide com a contagem eletrónica das urnas.

Para tal, as urnas são abertas e os votos impressos são contados. Mas o processo não é aplicado a todas as urnas. É feito um sorteio que escolhe cerca de metade das assembleias de voto para serem auditadas.

Em relação à eleição de domingo passado, tanto a oposição a Maduro como os observadores internacionais questionam se a verificação ocorreu em todos os centros. Para já, além das atas da votação, também não foram reveladas as atas de verificação que reúnem os resultados da auditoria em cada um dos centros de votação.