“Começou a fase definitiva para o fim da usurpação, a Operação Liberdade. Fui libertado por militares por ordem da Constituição e do Presidente Guaidó.” A frase foi colocada na conta de Twitter do próprio Leopoldo López, acompanhada de uma fotografia de López com o autoproclamado Presidente interino da Venezuela, Juan Guaidó. Terminava com o grito de encorajamento “Força e fé”, o grito que López utilizou tantas vezes no passado, quando ainda era um homem livre, para mobilizar os opositores a Hugo Chávez e depois a Nicolás Maduro.

Leopoldo López nasceu na capital Caracas, em 1971, no seio de uma das famílias mais ricas da Venezuela. Neto de Eduardo Mendoza Goiticoa, antigo ministro da Agricultura de Rómulo Betancourt, e filho de Leopoldo López Gil, diretor do jornal El Nacional, Leopoldo fazia parte da elite venezuelana — e sempre gostou de destacar os seus laços de sangue com o próprio Simón Bolívar.

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Teve a oportunidade de estudar nos Estados Unidos, como muitos outros da elite do país. Primeiro Economia e Sociologia na Kenyon College (Ohio), a que se seguiu um mestrado em Políticas Públicas pela prestigiada Universidade de Harvard. Em paralelo, foi desenvolvendo atividade profissional na petrolífera venezuelana PDSVA, como consultor. Mas, desde o início dos anos 90, a verdadeira paixão de Leopoldo tornou-se evidente: a política.

[Veja no vídeo como a Venezuela entrou em ebulição com tiros e avanço sobre civis]

Em 1992 fundou o partido Justiça Primeiro, juntamente como Julio Borges e Henrique Capriles — este último viria a ser candidato à presidência da Venezuela, com o apoio de Leopoldo. Com o Justiça Primeiro, López foi eleito, no ano 2000, para a câmara municipal de Chacao, o município mais abastado da Venezuela, com 51% dos votos, como recorda o El Mundo. Reeleito em 2004 com uma margem esmagadora (81%, segundo a agência Efe) acabaria por abandonar o Justiça Primeiro três anos depois e, já depois de abandonar a autarquia, fundaria um novo movimento, mais à esquerda: o Vontade Popular. Um antigo colega mencionaria ao jornal Guardian, não sem alguma malícia, que López “cria partidos políticos e depois abandona-os quando lhe fogem do controlo”.

Em 2008, López tentou candidatar-se à câmara de Caracas, mas foi impedido pelo regime chavista. O Tribunal de Contas apontou alegadas irregularidades na sua gestão camarária em Chacao e impediu-o de exercer cargos públicos. López recorreu para o Tribunal Inter-Americano de Direitos Humanos, que acabaria por declarar que os seus direitos políticos foram violados, em 2011. O regime venezuelano, contudo, manteve a proibição.

Leopoldo ainda tentou uma pré-candidatura à presidência mas, ao perceber que continuaria impedido pelo regime de se candidatar a qualquer cargo, passou a apoiar o antigo aliado Henrique Capriles, que defrontou primeiro Hugo Chávez (2012) e depois Nicolás Maduro (2013) em eleições, tendo sido derrotado.

O “jogo de gato e rato” até à condenação de 13 anos de prisão

Em fevereiro de 2014, Leopoldo López convocou uma manifestação, juntamente com outros políticos da oposição, onde acabariam por morrer três pessoas. Mal sabia o político venezuelano que essa manifestação ditaria a sua prisão, já que foi aí que o regime emitiu um mandado de captura para Lepoldo, acusando-o de instigar a violência.

“Não tens coragem de me meter na prisão ou estás à espera de ordens de Havana?”, desafiou o próprio López dirigindo-se a Maduro, no Twitter. Seguir-se-ia um “jogo de gato e rato”, como descreveu o New York Times, com a polícia a procurar o ativista na sua casa e na sede do partido, sem sucesso. López acabaria por entregar-se às autoridades no meio de uma manifestação.

Um ano depois, Leopoldo seria condenado a 13 anos e 9 meses de prisão, acusado de ter provocado a morte a 43 pessoas que participaram em manifestações políticas ao longo do ano de 2014, como noticiou o El País. Foi também condenado pelo crime de fogo posto e danos a propriedade.

Um dos opositores mais carismáticos ao regime chavista, López sempre foi alvo de insultos por parte dos líderes bolivarianos, como relembra a Reuters: Chávez sublinhou que não havia “presos políticos” na Venezuela, mas sim “políticos presos”, enquanto Maduro preferiu apelidar López de “monstro de Ramo Verde”, referindo-se à prisão militar onde estava a cumprir pena.

Em 2017, as autoridades venezuelanas decidiram colocar López em prisão domiciliária.

Venezuela, este é um passo em direção à liberdade. Não tenho nenhum ressentimento e tão pouco vontade de claudicar na minha luta”, afirmou à altura.

Organizações de direitos humanos, como a Amnistia Internacional, continuaram a pedir a libertação do ativista, considerando que a sua condenação teve motivações políticas e não judiciais: “É tempo de a administração de Maduro parar de castigar as pessoas por pensarem de forma diferente”.

Em casa, Leopoldo López conseguiu regressar à atividade política, passando a comunicar regularmente com colegas de partido, incluindo o próprio Juan Guaidó. A sua mulher, a jornalista Lilian Tintori, serviu frequentemente de intermediária, passando mensagens e estabelecendo contactos.

Foi López que sugeriu Guaidó para líder da Assembleia Nacional, relembra o Guardian, apadrinhando assim, indiretamente, a ascensão do autoproclamado Presidente — gesto que Guaidó retribuiu ao colocar a libertação de López como primeira ação do dia da “Operação Liberdade”. “O Leo permanece em pé de luta”, declararam fontes próximas do opositor ao El Mundo, esta terça-feira. É ele, dizem, o homem que tem a palavra final em todas as decisões da oposição venezuelana e o mentor que Guaidó ouve em todos os momentos. Já era assim dentro de quatro paredes — e deverá continuar a ser em liberdade.