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José Fernandes/SIC

José Fernandes/SIC

Choque entre Bugalho e Temido marca debate a quatro

No primeiro embate a quatro, candidato da AD e socialista trocaram acusações entre si, mas blocos naturais existiram: Cotrim, mais próximo de Bugalho, quis embaraçar Temido; Paupério atirou a Bugalho.

Sebastião Bugalho atacou Marta Temido, que atacou Sebastião Bugalho, que poupou João Cotrim Figueiredo, que se irritou com Francisco Paupério, que irritou toda gente. No primeiro dos seis debates a quatro destas eleições europeias, os maiores choques acabaram por acontecer entre a candidata do PS e o candidato da Aliança Democrata, que trocaram acusações à boleia de temas como imigração e a mutualização da dívida europeia para financiar o esforço militar do continente.

Apesar de tudo, Francisco Paupério, do Livre, e João Cotrim Figueiredo, na Iniciativa Liberal, tentaram igualmente condicionar o debate, responsabilizando as duas principais famílias europeias de terem falhado nas respostas (ou falta delas) que deram em matéria de imigração, precisamente, mas também na política de distribuição de fundos europeus — questão que se tornará particularmente exigente quando for discutido o alargamento do clube dos 27.

Bugalho e Temido trocam acusações sobre política de imigração

O recém-aprovado Pacto para as Migrações foi o tema que mais agitou as águas durante o debate a quatro vozes. Num momento inicial, PS, PSD e IL até adotaram posições relativamente semelhantes: os três candidatos consideram que a aprovação do Pacto é uma boa notícia, embora todos lhe reconheçam “lacunas” ou “fragilidades”. Mas rapidamente se quebrou o quase-consenso.

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Por um lado, essa quebra começou por ser provocada pelo candidato do Livre, que disse ser preferível não ter acordo nenhum a ter um documento nestes moldes e sentenciou que “este Pacto não humaniza as pessoas”, defendendo alternativas como “corredores humanitários” ou programas de integração funcionem.

Foi neste ponto que Marta Temido, que tinha avisado para a necessidade de se prestar muita atenção à forma como o Pacto será implementado no terreno, sentiu necessidade de vir dar mais explicações: “Pareceu que estávamos todos de acordo menos o Francisco Paupério, mas não é verdade”. E não é verdade, frisou, porque apesar de reconhecer que se há uma política específica para a “pesca de sardinha” também tem de existir para as migrações, é preciso salvaguardar o “humanismo” e prever os “riscos” na execução prática dessa política (“então porque é que a aprovaram?”, ia atirando Paupério).

Temido acabaria por ter de se justificar também quanto à política de imigração dentro de casa, uma vez que os candidatos da direita aproveitaram o currículo como ex-ministra de António Costa para atacar a forma como a extinção do SEF ocorreu, assim como os problemas que a AIMA, agência sua substituta, atravessa. Cotrim Figueiredo partiu ao ataque, apontado ao PS uma “enorme irresponsabilidade” na forma como geriu o processo, mas Bugalho subiu o tom e acusou os socialistas de “entregarem a política de imigração a redes de tráfico humano”. “Profunda demagogia”, reagiu Marta Temido, que ainda assim acabou por se ver obrigada a dar explicações em nome do PS: “As mudanças demoram tempo a dar resultados”.

O embate adensou-se quando Temido acusou o PPE de “sempre ter sido contra a mutualização da dívida”, ao que Bugalho respondeu disparando o exemplo de Ursula Von der Leyen, a presidente da Comissão Europeia que pertence ao PPE e que “conseguiu a mutualização da dívida [para responder à pandemia]”. Não chegariam a acordo: Temido contra-atacou criticando a direita por não ter liderado esse esforço e lembrando posições polémicas antigas de Bugalho sobre a Europa, e Bugalho provocou de volta, lembrando o apoio de António Costa ao Syriza. A conversa azedou por momentos, mas rapidamente se mudou de tema.

Alargamento, sim. Mas com reforma da UE

Os quatro concordaram no essencial: o clube dos 27 Estados-membros deve crescer e a Ucrânia deve fazer parte da União Europeia. Ao mesmo tempo, todos recordaram que esse processo implica regras e que todos os países que se candidatam têm de cumprir determinados critérios. A questão que ninguém ignora é que uma eventual inclusão de países como a Ucrânia ou Moldova implicará uma perda de fundos à disposição de países como Portugal, em particular na questão da Agricultura. E foi aí que os candidatos divergiram: como encontrar um modelo que compense os Estados-membros que serão necessariamente prejudicados pelo processo do alargamento.

O primeiro a responder foi Sebastião Bugalho, que tentou definir o tom da discussão: “Obviamente é um desafio em termos de políticas de apoio. Mas o alargamento não pode ser lido à luz do dinheiro que vamos perder, mas à luz da Europa que vamos ganhar”, argumentou, sugerindo que a União Europeia tem uma “obrigação moral” de fazer com que eles se sintam “parte da família europeia”, convidando-os a estarem presentes em reuniões europeias, mas sem poder de voto.

A mesma pergunta foi colocada a Francisco Paupério, que defendeu que a Europa deve, desde já, contribuir financeiramente para a recuperação da Ucrânia. A seguir, e pegando na questão dos agricultores levantada pela moderadora, Paupério voltou a atacar a direita: a “Política Agrícola Comum foi criada do PPE” e foram eles que deixaram desprotegidos os pequenos e médios agricultores, que “perderam colheitas, perderam controlo dos preços dos seus produtos”. “Os Verdes Europeus e o Livre estão do lado dos agricultores”, disse, tentando centrar o debate na defesa da transição verde e numa renovada política de incentivos à agricultura sustentada.

“Temos a obrigação moral de acolher estes países que querem ser democracias e partilhar valores europeus”, concordou Cotrim, antes de recordar que o alargamento não é só uma ameaça, assim saibam os demais países “aproveitar oportunidades do mercado único”. Apesar de tudo, o liberal reconheceu que será preciso rever toda a estrutura financeira orçamental da União Europeia e não apenas os fundos de Coesão e da PAC. E foi aí que tentou marcar pontos: para Cotrim, tem havido desperdício “brutal” desses fundos. “Portugal com uma utilização correta dos fundos seria bastante mais forte”.

Marta Temido acabou por tentar virar a discussão a seu favor, dizendo que Cotrim Figueiredo, que tem uma visão cética sobre a utilização de fundos europeus, e Sebastião Bugalho, que, argumentou, representa uma famíla europeia que nunca alinhou numa “abordagem solidária dos fundos (como a mutualização a dívida a nível europeu), não podem dar lições sobre esta matéria. “Há um compromisso inequívoco com o alargamento. Mas queremos integração com ambição para os outros países”, defendeu, dando como exemplo para encontrar novos recursos para manter uma distribuição justa da riqueza entre Estados-membros as contribuições sobre “plataformas digitais e sobre transições financeiras”.

Sebastião Bugalho ainda aproveitou a oportunidade para se tentar demarcar de Marta Temido: em matéria de novos recursos próprios, nem todos terão de ser mais impostos e que os mercados de licença de emissão de CO2 podem ser uma forma de recolher esses recursos ou então a taxa aos plásticos de utilização única.

Temido tentou colar Bugalho aos antigos falcões do PPE — e ouviu “Syriza”

Neste como noutros temas, há um ponto de partida comum: os quatro candidatos concordam que a Europa deve reforçar a sua autonomia estratégica, através da Defesa, e passar a depender menos dos Estados Unidos pelo caminho. A divergência chegou quando foi discutida a forma de financiar esse reforço – e levou a mais um momento de tensão mais visível entre Marta Temido e Sebastião Bugalho.

O candidato da AD argumentou a favor da a ideia dos “defense bonds” – a emissão de dívida mutualizada para este fim –, defendendo que o conceito não só é mais consensual entre os Estados-membros do que outros tipos de emissão de dívida como vem pôr fim a um problema de prioridades: “Estamos a garantir que os governos não vão ter de escolher entre tanques e hospitais públicos”, atirou.

Ora para Temido, que se disse “muito preocupada” com o que acabara de ouvir, o problema das prioridades continua a colocar-se, uma vez que o PPE (família europeia a que o PSD pertence) defende esse esforço para a Defesa e não, por exemplo, para o setor da Habitação. “Precisamos de reforçar a nossa Política de Defesa Comum. Agora, não vamos investir em armas e não investir em casas”, criticou.

Ainda assim, o embate adensou-se quando Temido acusou o PPE de “sempre ter sido contra a mutualização da dívida”, ao que Bugalho respondeu disparando o exemplo de Ursula Von der Leyen, a presidente da Comissão Europeia que pertence ao PPE e que “conseguiu a mutualização da dívida [para responder à pandemia]”. Não chegariam a acordo: Temido contra-atacou criticando a direita por não ter liderado esse esforço e lembrando posições polémicas antigas de Bugalho sobre a Europa, e Bugalho provocou de volta, lembrando o apoio de António Costa ao Syriza. A conversa azedou por momentos, mas rapidamente se mudou de tema.

Do lado do Livre, Paupério defendeu um investimento na segurança e na autonomia estratégica – incluindo energética – da Europa, mas assegurando que esse esforço deve servir como instrumento de Defesa, e não de ataque. Já Cotrim Figueiredo escolheu atacar precisamente os Verdes, família de que o Livre faz parte, por proporem “empecilhos” à inovação como uma taxa à automação. E acrescentou que, tendo em conta que a Europa pode mesmo “viver uma situação dramática” e que precisa mesmo de se reforçar enquanto pilar da NATO para funcionar como um “contraponto” no caso de um resultado desfavorável nas eleições dos EUA (uma vitória de Donald Trump), o que é verdadeiramente preocupante é a falta de crescimento económico na Europa.

Bugalho subiu o tom e acusou os socialistas de “entregarem a política de imigração a redes de tráfico humano”. “Profunda demagogia”, reagiu Marta Temido, que ainda assim acabou por se ver obrigada a dar explicações em nome do PS: “As mudanças demoram tempo a dar resultados”.

Costa só é tema para Temido

O tema paira há meses tanto sob a política nacional como europeia, apesar de não se saber qual será a evolução da Operação Influencer, e muito menos se conseguir adivinhar se António Costa chegará a ser candidato ao Conselho Europeu. Ainda assim, nesta sondagem sobre eventuais apoios feita à mesa do debate, Costa levou apenas um “sim” claro e veio do seu próprio partido: Marta Temido defendeu prontamente que a visão do ex-primeiro-ministro para a Europa “tem provas dadas” e é uma garantia de que o projeto europeu “avançar e não recua”.

Os outros participantes do debate não têm tantas certezas. De resto, da parte de Cotrim Figueiredo, o que Costa ouviu foi uma nega: “O que interessa é o que as pessoas pensam e não o sítio onde as pessoas nascem. Porque é que um português tem de ser melhor do que o outro?”, questionou o liberal. Bugalho disse apenas esperar que Costa não seja “centro do debate das europeias”, uma vez que o assunto não “diz respeito” especificamente aos eurodeputados, e atirou: “Já tivemos nove anos de Costa como primeiro-ministro. É tempo de seguirmos em frente”. E Paupério recusou comentar o cenário hipotético.

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