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DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Entrevista a André Ventura: "Estou-me nas tintas se Passos Coelho me aplaude ou não"

No dia em que começa o III Congresso do Chega, André Ventura fala sobre a sua condenação em tribunal, sobre uma eventual ilegalização e sobre as exigências que fará a Rio para viabilizar um Governo.

André Ventura chegou à redação do Observador, em Lisboa, às 22 horas de quinta-feira — a entrevista estava marcada para as 18h, mas o líder de Chega atrasou-se em Guimarães, numa ação do partido. No III Congresso do Chega, que decorre este fim de semana em Coimbra, quer receber um mandato para fazer exigências a Rui Rio. A mais relevante é esta: para haver um governo, Ventura exige ser vice-primeiro-ministro e quer ainda mais quatro pastas: Justiça, Administração Interna, Segurança Social e Agricultura. A entrevista começou pela sua recente condenação em tribunal, por num debate presidencial ter usado a expressão “bandidos” enquanto mostrava uma fotografia tirada com Marcelo Rebelo de Sousa e uma família do Bairro da Jamaica.

[Ouça aqui a entrevista completa a André Ventura]

“Sobre o Novo Banco, Vieira não me conseguiu convencer”

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“Um tribunal não me pode obrigar a dizer que um bandido não é um bandido”

Esta semana foi condenado por um tribunal a pedir desculpas à família do Bairro da Jamaica a que se referiu como “bandidagem” — mas já disse que não o vai fazer. Alguém que não cumpre uma sentença de um tribunal é um “português de bem”?
O partido e eu próprio fomos condenados num processo algo aberrante — por isso mesmo, vamos recorrer. A sentença está tecnicamente muito mal fundamentada e é substancialmente incompreensível. Uma parte da sentença diz que eu tenho de me abster de fazer algo para sempre, o que é curioso num sistema que não admite decisões perpétuas.

Se cada pessoa que é condenada em tribunal puder decidir se a sentença está bem feita ou não, ninguém cumpre. Uma coisa é recorrer, outra coisa é dizer “Não vou cumprir”.
Todos os dias avaliam se as minhas decisões são boas ou más. E eu pertenço a um órgão de soberania, que é a Assembleia da República. O tribunal é um órgão de soberania.

Acha que quem é condenado por um tribunal pode decidir se cumpre ou não cumpre a sentença?
Quem é condenado em tribunal pode recorrer. É o que vamos fazer.

Isso é evidente. Mas o que disse foi mais do que isso.
Eu disse que, na minha perspetiva, a decisão está errada.

Não: disse que não ia obedecer.
 Já lá vamos. E tenho ainda uma perspetiva jurídica sobre isto, não é a perspetiva do cidadão comum. A decisão é uma aberração, é um mau sinal político. E acho que o recurso nos vai dar razão.

E se perder o recurso, pede desculpa ou não?
Eu tenho essencialmente de responder à minha consciência. E o tribunal terá de tomar uma decisão: se eu não pedir desculpa, qual é a consequência? Uma multa, uma sentença de outro tipo qualquer? Cá estarei para arcar com essas consequências.

Tendo em conta isso, acha bem que as pessoas não cumpram as sentenças a que são condenadas.
Não, acho bem que cumpram aquilo a que são condenadas, é o que farei. Agora, não me podem fazer pedir desculpa por dizer que alguém é um bandido quando é.

Na realidade, não é. Esse é que é o ponto. Na fotografia estavam pessoas que não foram condenadas por nada.
Se viu o debate, eu disse: “Uma destas pessoas pelo menos é um bandido”. Se uma pessoa que foi envolvida em casos de tráfico de droga e de agressão a polícias não é um bandido, então não sei o que é um bandido.

Mas teve a oportunidade de se defender em tribunal e foi condenado.
Reconheço isso e aceito isso — o povo português dirá depois o que entender. Mas um tribunal não me pode obrigar a dizer que um bandido não é um bandido.

Não percebi o que fará se perder o recurso: pede desculpas ou não?
Não quero antecipar cenários. Quero dizer isto: há pessoas naquela fotografia que são bandidos. E eu não vou deixar de o dizer: são bandidos.

Mas acabou de dizer que era só uma.
Não, não é só uma. Essa é que é a questão. Se virmos informação que anda a circular, sabe-se que há pessoas envolvidas em agressões a polícias.

Na verdade, não, porque esse processo não chegou ao fim.
Há elementos claríssimos, que eu não quero agora aqui referir, porque deixei claro no debate que me estava a referir a uma pessoa. E eu disse isso no tribunal Ficou claro para o tribunal que não houve racismo nenhum, ao contrário do que os autores diziam. Não me referi à cor da pele uma única vez. Agora, um tipo que agride polícias e trafica drogas é um bandido. No dia em que no meu país eu não puder dizer isto, nós já não vivemos numa democracia, vivemos num Estado do tipo Venezuela.

Mais uma vez: não era isso que estava em causa na sua condenação. Estava em causa o facto de se estar a referir a pessoas que não têm nenhum problema com a justiça.
Mas isso é falso. Eu disse “Pelo menos uma destas pessoas…” Sabe o que quer dizer pelo menos: um deles pelo menos é um bandido.

Então porque é que usa o plural “bandidos”?
Curioso: mas ninguém disse isso quando todos os órgãos de comunicação social usaram a mesma fotografia. Só o André Ventura é que não pode ser. Agora, o Observador usar a mesma fotografia, o Correio da Manhã também, o Jornal de Notícias, a TVI, a SIC… Todos usaram aquela fotografia.

Mas o problema não foi ter usado a fotografia. Foi dizer que lá estavam bandidos.
Vi notícias a dizer: “Agressor condenado de polícias tira foto ao lado de Marcelo”. Viu algum processo dessa família?

Mas só o senhor é que falou no plural.
Está enganado também. Não leu tudo o que eu li. Sabe o que ainda vamos saber deste processo? Vamos saber quem o pagou e quem o motivou. Eu já sei e os portugueses vão saber.

E quem foi?
Vi prints de uma jornalista chamada Fernanda Câncio a dizer que até pagava o processo. Veja o estado a que chegámos: um jornalista a dizer “Avancem lá com o processo que eu pago”.

Mas pagou?
Pergunte-lhe. Depois, outra boa ideia é tentarmos saber que motivações levaram a este processo. Quando a juíza perguntou a uma das pessoas que foi testemunhar se tinha visto o debate, a resposta foi: “Não, vi depois, quando me disseram”. E depois a juíza perguntou-lhe que danos tinha tido e na resposta foi: “A mim, em concreto, nada”.

"Acima de qualquer condenação injusta está a minha consciência perante os portugueses"

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Não vamos julgar o caso outra vez aqui. Houve uma juíza que entendeu que o senhor era culpado. Numa das suas reações, disse que esta juíza do Tribunal Cível de Lisboa fez aquilo que parece ser “um frete ao Governo”.
Não é verdade.

Então disse o quê?
O que eu disse foi que a justiça não se deve tornar uma espécie de frete ao governo.

Não: disse que a decisão “parece um frete ao governo”.
Disse que “não se deve tornar”. E é isso que eu espero: que a Justiça do meu país não se torne nisso.

Então não foi um frete ao Governo?
Na minha perspetiva, esta decisão judicial é um frete ao governo. Tenho direito a achar que é. Não é esta decisão em si: é este tipo de decisões. Este processo, aliás, foi julgado em tempo recorde. Coisa que admiro e espero que a Justiça siga o mesmo critério…

É um processo cível.
Sabe quanto tempo demoram os processos cíveis em Portugal? O meu foi mais rápido. O que espero agora é que todos sejam à mesma velocidade e que não seja apenas o André Ventura que é condenado em três meses.

Está a acusar a juíza de quê?
A juíza não, estou a dizer que parece que há dois pesos e duas medidas.  Não tenho medo das palavras. A grande maioria do povo português olhou para esta decisão com estupefação. O povo português é sábio e sabe bem o que aconteceu aqui. Ainda vamos descobrir muito sobre o que se passou aqui, sobre quem efetivamente esteve por trás deste patrocínio. Esta foi uma tentativa de condenar o André Ventura. Eu referi-me a uma pessoa em específico que é um bandido. Não vou dizer que ele não é um bandido. Se o tribunal me quiser condenar a uma multa, à prisão, ao que for, cá estarei para isso.

Foi sentenciado a pagar 500 euros por cada referência com a palavra “bandido”, só nesta entrevista já seriam uns 1500 euros.
Mas a minha perspetiva é sempre esta: acima de qualquer condenação injusta está a minha consciência perante os portugueses.

O seu candidato à Câmara de Lisboa, Nuno Graciano, disse esta semana, em entrevista ao Observador, que “André Ventura abusou no uso do termo bandidos”. E disse também que a sua condenação “é o Estado de direito a funcionar”. Não o preocupa que a sua argumentação nem consiga convencer os candidatos do seu partido?
Não me preocupa. Isto talvez choque hoje em dia o ambiente político, mas não é com isso que estou preocupado. Só estou preocupado com o povo português, que me elegeu e me deu meio milhão de votos nas presidenciais. E a minha consciência diz-me que o que eu disse foi acertado. E diz-me que, apontando o dedo a uma pessoa e usando uma imagem que já era do domínio público, não cometi nenhum ilícito. Aquelas pessoas podiam ter usado um processo-crime. Porque é que não o fizeram? Porque sabiam que havia outros direitos de defesa. Num processo-crime não haveria condenação. Aí, a justiça funciona de forma diferente, não é uma sessão de duas horas. Aí é com o Ministério Público a mostrar o cadastro de algumas daquelas pessoas.

Quando um tribunal condena uma pessoa que não o André Ventura, não está a fazer um frete ao governo; quando o condena a si, está.
Estamos a falar de um processo tão raro, que se calhar a juíza nunca julgou um processo daqueles. Aquele tipo de processo é muito específico. Se a família estava tão ofendida, porque é que não usou o processo-crime? Porque aí mete Ministério Público e muitas daquelas pessoas querem é estar longe do Ministério Público. Isto quer dizer que o tribunal que me condena a mim é menos qualificado do que o que condena outros? Não. Acho é inacreditável que um tribunal do meu país me condene a pedir desculpa por dizer que um bandido é um bandido.

“Se o nosso partido for ilegalizado significa que 10% da população são criminosos, bandidos, marginais”

Além de não ter confiança no Tribunal Cível de Lisboa, também não tem confiança no Tribunal Constitucional. Os juízes estão a tomar uma decisão sobre um pedido de ilegalização do Chega e organizou uma manifestação que passou à porta do Tribunal Constitucional. Isso não pode ser considerado uma forma de pressão?
Os tribunais são órgãos de soberania. Como tal, têm de confrontar-se com a soberania popular. A nossa Constituição diz uma coisa muito importante: a Justiça emana do povo, é o povo que lhe dá soberania e legitimidade. Ora, esse povo tem direito a manifestar-se. Assembleia da República, Presidência da República, Governo e tribunais são órgãos de soberania que têm de ser escrutinados. Acresce que o Tribunal Constitucional… e faço aqui um parêntesis para dizer que tenho imensa confiança técnica nos juízes do Tribunal Constitucional, os seus currículos são conhecidos, alguns foram meus colegas de faculdade, outros foram meus professores, como é o caso do presidente do tribunal, o professor João Caupers. Se me perguntar se confio nas capacidades técnicas do professor João Caupers, confio a 100% porque sei que é um homem íntegro.

Vai dizer que os juízes são comprometidos porque são nomeados pelo Parlamento…
Exato, temos de ter isto presente: são nomeados politicamente. O que fomos pedir ao Tribunal Constitucional nessa manifestação é que não ceda a um juízo político nesta matéria.

Não foram pedir. Passaram junto do Tribunal Constitucional — disse até que não era para ameaçar ou ofender —, mas a verdade é que houve pessoas que o acompanharam nessa manifestação e que colocaram no portão de entrada do Tribunal Constitucional mais de vinte cordas com o nó do enforcamento.
Não era o nó do enforcamento.

Todos vimos as imagens, está até no Facebook do Chega. Queria perceber se as cordas com essa simbologia eram dirigidas aos juízes.
Não era nenhuma…

Qual era o intuito das cordas, então?
Primeiro, não fui eu que pus as cordas. Portanto, não sei.

Mas isso aconteceu na sua manifestação. Um líder deve saber…
Se um líder souber o que oito mil pessoas fazem numa manifestação… Queria deixar isto muito claro: acham que se nós quiséssemos fazer uma manifestação ameaçadora não o saberíamos fazer?

Então as cordas eram o quê?
Se seis ou oito mil pessoas quisessem tornar-se um problema de ordem pública, tornavam-se. Nós fizemos a manifestação dentro das regras exigidas pela polícia, dizendo claramente que não era nenhuma ameaça ao tribunal…

Cumpriram as regras, mas deixaram uma mensagem. Aquelas cordas tinham um intuito.
Eu não sei, porque eu não pus as cordas. Não me pergunte a mim. Eu sei o que organizei. E o que organizei foram faixas, bandeiras e mensagens. É por isso que posso responder.

Mas estava lá e viu aquilo a acontecer?
Não, não vi a acontecer. Não sei.

Mas essas imagens estão no Facebook do Chega.
Eu cheguei, discursei e saí. As imagens até podiam estar na CNN, a questão não é essa. Não fui eu que pus lá as cordas. Está lá o símbolo do Chega nas cordas?

Está o símbolo do Chega nas fotografias que mostram as cordas no Facebook do partido.
Não está nas cordas. As fotos estão no nosso Facebook, porque, ao contrário de alguns órgãos de comunicação social, nós não censuramos. Tudo o que aconteceu está lá. Eu respondo por faixas com o nome do Chega, por bandeiras com o símbolo do Chega e por coisas com o logótipo oficial do Chega. Viu alguma ameaça nessas nossas mensagens? Nenhuma. Viu alguma ameaça no meu discurso? Nenhuma.

Já percebi que não quer responder.
Quero responder assim mesmo: não posso responder por coisas que acontecem numa manifestação que eu não tenho nada a ver.

É uma resposta que não é resposta.
Há uma coisa que os leitores e ouvintes do Observador têm de saber: é que há um partido sob ameaça de ilegalização e sobre isso os senhores não querem falar. Mas devíamos era falar sobre isso.

Mas se não queremos porque é que estamos a falar sobre isso?
Desculpe, mas eu tenho de dizer isto: há um partido sob ameaça de ilegalização e os senhores perguntam-me sobre cordas há porta do Tribunal Constitucional, quando estamos numa democracia que devia estar a perguntar como é que um partido é ilegalizado.

Precisamos de perceber o que é que as cordas querem dizer.
O que me preocupa a mim é que o jornalismo não se preocupe com um partido poder ser ilegalizado.

"Hoje, segundo as sondagens, somos a terceira ou quarta força política. E é quando chegamos a este patamar que nos tentam ilegalizar."

E o que é que faz se o partido for ilegalizado?
Primeiro, percebemos que não vivemos numa democracia. E é isso que vos devia preocupar, porque o jornalismo que investiga a sério percebe que a democracia está em causa quando um partido é ilegalizado. Isto não é uma brincadeira.

Nenhum partido foi ainda ilegalizado sequer.
Mas há um processo de ilegalização e o que eu esperava de uma Procuradora-Geral da República é que dissesse imediatamente: meus senhores, isto é um Estado de Direito democrático. Isto não é a Venezuela, nem a Coreia do Norte, aqui não se ilegalizam partidos.

Mas, se for ilegalizado, o que é que fará?
Já lá vamos. Não se ilegalizam partidos. Agora, há um partido sob ameaça de ilegalização, que por acaso é o terceiro maior partido nas sondagens e os senhores estão preocupados com cordas à porta do Tribunal Constitucional. O que estaria preocupado é chegarmos a um ponto em que há atores políticos, incluindo o segundo maior protagonista do Partido Socialista e atores políticos fundamentais no Parlamento a dizer que o partido deve ser ilegalizado. E os senhores acham normal. Eu tive 12% nas presidenciais. Se o nosso partido for ilegalizado significa que 10% da população são criminosos, bandidos, marginais.

O que é que faz nessa situação?
Quando formámos o Chega, disseram-nos: “Nunca vai funcionar”. Mas nós formámos. Depois disseram-nos: “Nunca vão chegar à Assembleia da República, porque há um boicote mediático, político, institucional, financeiro”. Chegámos. Depois disseram-nos que não passávamos dali, com um deputado. Hoje, segundo as sondagens, somos a terceira ou quarta força política. E é quando chegamos a este patamar que nos tentam ilegalizar.

Mas continuaria na ilegalidade ou na clandestinidade com o partido?
Eu próprio não lhe sei responder a isso.

Criaria um partido novo?
Não, não crio. Porque isto não é o mercado de Alvalade.

Portanto, ficaria na clandestinidade a reunir o partido.
Só utilizar a palavra “clandestinidade” devia incomodar-nos e chocar-nos. Repare o choque que é em democracia: a imagem que vamos dar para a Europa e para o mundo ao ilegalizar um partido, um dos maiores, que fez cair o Partido Socialista nos Açores, que o seu líder teve 12% nas presidenciais, que ameaça o poder socialista nas legislativas. O que espero é que o Tribunal Constitucional, antes de qualquer decisão, pondere bem, porque esta não é só uma decisão técnica, nem jurídica. Esta é uma decisão que vai marcar o futuro da nossa democracia. O que acontece aos nossos mandatos? Imagine que a ilegalização ocorre depois das eleições autárquicas com centenas de eleitos por todo o país, o que acontece a estas pessoas? O que acontece à governação nas câmaras municipais, no Governo regional dos Açores? E ao meu mandato de deputado na Assembleia da República? O último partido ilegalizado em Portugal foi de pessoas que estavam envolvidas em criminalidade violenta armada, em atentados terroristas ligados às FP-25 e que nem sequer tinham representação parlamentar. Equiparar isso ao Chega, para além de ser ridículo para a maioria do povo português, é um atentado à nossa democracia. Por isso vamos lutar, vamos resistir até mais não podermos. Vamos mesmo reagir, porque nesse dia a democracia acabou. Mais: no dia em que um partido for ilegalizado, o caminho para que jornais também sejam ilegalizados e televisões sejam ilegalizadas está aberto. A partir daí tudo pode acontecer.

“Se o PSD não atribuir ministérios ao Chega, não vai haver Governo à direita”

Sobre o Congresso do Chega, que começa esta sexta-feira: na sua moção de candidato a presidente do partido escreve isto: “Neste momento, mais do que nunca na nossa história, é preciso coragem e determinação para enfrentar os adversários – internos e externos”. Quem são os seus adversários internos?
Os internos são aqueles que acham que devemos tornar-nos numa espécie de direita às mãos do PSD, uma espécie de direita moderada. Que eu já sabia que ia acontecer. Acontece sempre quando os partidos crescem muito. O poder está mesmo ali à mão de semear e, portanto, há a tentação de ceder aos ímpetos de moderação que são exigidos pelo dr. Rui Rio e por uma parte do CDS. Eu vou apresentar precisamente o contrário e isso que fique claro aqui.

Mas há pessoas na sua direção que pensam isso?
Há pessoas no partido que pensam isso.

Só para percebermos…
Até porque vai haver mudanças na direção nacional, pelo menos propostas por mim neste Congresso.

Por causa disso?
Por causa de tudo. Desse e de outros assuntos.

Vai mudar três vice-presidentes.
Não sei. Esse assunto não está ainda fechado.

"Como líder da oposição, Rui RIo tem sido um desastre"

ANTÓNIO COTRIM/LUSA

Disse que eram três.
Eu falei de três vice-presidentes, não disse que não iam ser alterados mais. Vai haver mudanças, vai haver caras novas, vamos apostar na juventude e nas mulheres. Isso também já é um ponto assente. Mas quero deixar claro que o partido tem de decidir neste Congresso quais são as condições que vai exigir ao PSD para formar um Governo. E moderação não é uma delas. Esta semana até ouvi um antigo presidente do PSD, Santana Lopes, falar sobre isto e dizer que isto pode passar por duas coisas: um apoio parlamentar como acontece nos Açores, sem participação do Chega no Governo, ou uma ida para o Governo do Chega sem o André Ventura. Portanto, sem o seu líder, que é muito radical e por isso convinha ter outras pessoas que fizessem de paus mandados do PSD. Não quero ofender quem fez coligações com o PSD, mas leiam os meus lábios: nunca vai acontecer. Se o PSD insistir em não atribuir ministérios ao Chega e não aceitar um projeto de governação conjunto não vai haver Governo à direita. E nós não queremos mentir. Escusam de vir com o interesse nacional: o Governo cai no programa de Governo.

Disse há dois dias que Rui Rio não era um bom líder da oposição, mas para primeiro-ministro do Governo que quer integrar já serve?
Espero que Rui Rio seja melhor primeiro-ministro do que é líder da oposição porque como líder da oposição tem sido um desastre. Vou dar-lhe um exemplo: os debates quinzenais na Assembleia da República. Um líder da oposição que diz que quer acabar com os debates quinzenais do primeiro-ministro porque ele anda muito cansado e isso desgasta o Governo… De facto, nós olhamos para António Costa e o que ele anda é desgastado mesmo. Até cansa vê-lo tão desgastado. Um líder da oposição que diz isto não é um bom líder da oposição. Havia uma sondagem no Jornal de Notícias que dizia que os portugueses veem que eu e Rui Rio somos os principais líderes da oposição. O Chega tem dois anos e meio. Se eu fosse líder de um partido de 46 anos e tivesse a mesma percentagem de confiança da população à oposição que tem o líder de um partido com dois anos e meio eu cobria-me de vergonha. Ia-me embora, pegava nos meus sacos, pegava nas minhas coisas e saía de cena. Isto mostra que Rui Rio não está a fazer um bom trabalho. Exemplo: no MEL, quatro líderes completamente diferentes entre si, de difícil articulação em termos de posições político-ideológicas, fizeram um esforço para conseguirem encontrar pontos comuns. O líder do Chega, o líder do CDS, o líder da Iniciativa Liberal. À noite, a fechar, temos o líder do PSD, que em vez de falar da tal possibilidade de agregação à direita o que é que diz? Um, que não é de direita. E dois, fala de acordos com o PS. Nesta quinta-feira, o primeiro-ministro António Costa veio dizer que não quer acordos com Rui Rio, porque ele é muito próximo do Chega.

"Só me preocupo com a liderança do Chega. Acho que o PSD não tem feito um bom trabalho e acho que tinha o dever de o dizer."

Antes do MEL estávamos a falar das questões internas. Vai substituir os três vice-presidentes mais antigos? Temos essa informação de uma fonte da direção.
Não vou estar a fazer comentários sobre isso: era desrespeitoso para com as pessoas envolvidas.

Mas vai fazê-lo?
Não vou comentar isso. Até porque pode haver pessoas que deixam de ser vice-presidentes, mas se mantêm na direção nacional.

Nuno Afonso, Diogo Pacheco Amorim e José Dias vão saltar de vice-presidentes. É isto que está a preparar, não é?
Não vou fazer comentários sobre isso. Vamos ver no Congresso o é que acontece. Não está fechada a lista da direção nacional e por isso não me ficaria bem dizê-lo aqui hoje.

Mas já disse que há três vice-presidentes que iam sair.
Mas são cinco, portanto pode ser qualquer um deles.

Mas tivemos informação que o André Ventura disse numa reunião da direção que havia a possibilidade de ser por antiguidade.
Daqui a 24 horas ou 36 horas saberemos porque tenho de apresentar a lista até às 20h00 de sábado e saberemos qual é a lista. Os nossos estatutos são muito claros nisso: só o presidente eleito nas diretas é que pode apresentar uma direção. Agora, não me ficaria bem estar aqui perante vós, num órgão com ampla difusão nacional, e fazer comentários sobre coisas de que eu não falei ainda com as pessoas. Portanto, ficaria muito mal e não ficaria bonito fazer isso aqui. Agora, que vai haver mudanças, vai. Vamos ter uma tónica mais de juventude, de mulheres também, que penso que é uma preocupação que o partido deve ter.

"Gosto de Passos Coelho? Gosto. Sou amigo dele. Se ele não quis aplaudir..."

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Já deu a entender por mais de uma vez que seria mais fácil existir um acordo entre o PSD e o Chega se o líder social-democrata fosse Passos Coelho e não Rui Rio. No Congresso do MEL, Passos Coelho nem sequer aplaudiu o seu discurso. Continua a sonhar com essa liderança do PSD?
Não continuo a sonhar com liderança nenhuma. Só me preocupo com a liderança do Chega. Acho que o PSD não tem feito um bom trabalho e acho que tinha o dever de o dizer, e isto com o respeito que tenho pelo dr. Rui Rio.

Gostava que Passos Coelho o tivesse aplaudido?
Não me preocupo nada com isso. Tenho a certeza de uma coisa: fui o mais aplaudido de todos. E, portanto, o que me importa a mim é o aplauso das pessoas, não é o aplauso dos antigos primeiros-ministros. Sá Carneiro dizia isto: “Quem nos tem traído não é o povo, são as elites”. E, portanto, não me preocupo nada com o apoio das elites. Nada, de todo. Tenho a sorte de ter um percurso e uma vida que nunca me aproximou das elites, de percurso pessoal. Gosto de Passos Coelho? Gosto. Sou amigo dele. Se ele não me aplaudiu, se sentiu que tinha de ir embora para não me aplaudir, se não quis aplaudir…

Mas reparou que não aplaudiu?
Não, não reparei. Porque estava a acabar de falar e Passos Coelho já tinha saído. Mas vi isso depois. Se isso me afetou a mim pessoalmente? Nada. O que a mim me deu gozo e me deu prazer foi ver aquelas pessoas que ali estavam, alguns anónimos, a apoiar, a dizer que de facto o Chega tinha sido a força mais incisiva nesta conferência e o agradecimento que senti de todos, inclusive dos organizadores, na importância que o Chega teve nesta convenção. O Chega chegou ali por direito próprio, não veio por passadeiras vermelhas de ninguém. Fomos porque as sondagens nos levaram ali e era ridículo estarem três partidos a conversar quando o segundo maior não está lá. Se Passos Coelho apoia ou não, se Rio aplaude ou não, se Durão Barroso acha bem ou mal, se Santana Lopes diz que não posso falar de Sá Carneiro, vou-vos dizer: estou-me nas tintas.

Já garantiu que o PSD jamais irá para o Governo sem o Chega. Mas pediu uma reunião a Rui Rio e nem sequer teve uma resposta. Não se está a colocar numa posição um bocadinho humilhante?
Não é isso que me preocupa. O que me preocupa é termos uma solução alternativa a António Costa. Rui Rio está mais preocupado com o seu ego. Eu estou preocupado com os portugueses, é a diferença.

Vai ficar à espera que o telefone toque, eventualmente.
Não vou. Se eu lhe pedir uma reunião a si, você responde-me e diz: sim ou não. Se tivermos um projeto para resolver, dirá certamente que sim, mesmo que seja para depois me dizer que não. Mas certamente que quererá ouvir o que tenho para dizer. Se há um líder do PSD que acha que ouvir o líder do Chega num momento como aquele em que estamos — em que podemos ter eleições legislativas logo a seguir às eleições autárquicas — e se ele acha que o melhor é levar isto até à parede e vermos depois como é que corre, mostra várias coisas: a imprudência do homem, a imprudência do líder e a falta de simpatia pelo povo português. Queria deixar claro uma coisa: não pensem que isto vai ser os Açores II. Não vai ser.

Imagino que se está a referir àquilo que são as linhas vermelhas para esse futuro eventual Governo que passa pela reforma da justiça, do sistema político, do sistema fiscal, da segurança social. Disse também que admitia cedências “aqui e ali”. Que cedências seriam essas?
Era isso que eu queria ouvir do dr. Rui Rio e fazia todo o sentido conversarmos. Tenho ido muito aos Açores, por causa da questão do Governo Regional, e muita gente pede-me: “Por favor, não mande o Governo dos Açores abaixo, porque não queremos que os socialistas voltem ao poder”. Aqui no continente dizem-me a mesma coisa: “Têm de se entender”. Oiço isto em todo o lado. E tenho feito esse esforço, mesmo sabendo que o meu eleitorado muitas vezes nem quer isso, muitas vezes pondo-me em situações tendencialmente humilhantes. Para mim, ser humilhado não é importante. Sou muito católico, muito cristão e Jesus Cristo dizia: “Os humilhados serão exaltados”. Acredito que aqueles que se humilham para bem do povo português um dia serão recompensados. Se eu mando uma mensagem ao dr. Rui Rio, ou lhe ligo, não vou estar aqui a dar detalhes, e a resposta que tenho é que não faz sentido haver essa reunião ou que ele não quer essa reunião ou nem sequer tenho resposta, eu percebo que Rui Rio não está interessado de todo em criar uma solução alternativa. Ou então é mais grave: já acha que nunca vai ser primeiro-ministro. E está a pensar que se vai embora depois das autárquicas e, portanto, já não quer saber.

"O André Ventura não quer ser vice-primeiro-ministro do Rui Rio, o André Ventura quer ser primeiro-ministro, mas reconhece o que os números objetivamente referem."
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E a questão das linhas vermelhas?
Onde é que admitimos cedências? Dei-lhe um exemplo na questão da redução dos deputados. Entendo que 100 deputados bastam. Rui Rio, em conversa comigo — bom, se calhar ele dirá que nunca conversou comigo sobre isto — disse que a redução de deputados para ele também é importante. Mas entende que 100 deputados é demasiado. Talvez 180, 170 ou 160.

Portanto, a negociação será dentro destas linhas vermelhas?
Sim, podemos chegar a um entendimento. Tanto que na nossa proposta de revisão constitucional, em que o PSD andou as ziguezagues para um lado e para o outro, a nossa proposta era o mínimo de 100 deputados e o máximo de 230 para dar esta margem.

E cargos? Já disse que exigiria ser vice-primeiro-ministro. Quer outras pastas?
Acho que não faz sentido um governo em que o Chega não possa condicionar a área da Segurança Social. Se as nossas propostas são essencialmente da fiscalização e redução da subsidiodependência, não fazia sentido que essa pasta não fosse atribuída ao Chega.

E mais?
A Administração Interna — a nossa relação com as polícias é de todos conhecida. Temos sido provavelmente o partido na Assembleia da República que mais  luta pela carreira, pelos rendimentos, pela situação das nossas forças de segurança.

E mais?
A Justiça, apenas por uma razão: porque nós não confiamos que o PSD faça a reforma da Justiça que promete, tanto que já esteve no governo vários anos, em várias décadas, e nunca a fez. Portanto, nós entendemos que devemos ser nós a protagonizar.

Justiça, Segurança Social, Administração Interna e a vice-presidência do governo.
Sim — e a Agricultura. Para nós é importante porque o mundo rural tem sido constantemente afetado. Aí, aceitaríamos fazer um acordo escrito em que ficaria claro até onde é que podemos ir, até onde é que devemos ir, mas com cedências e objetivos. Portanto, se isso acontecer temos a margem para haver um governo. Se não acontecer, até pode acontecer que o governo não passe do programa de governo.

No II Congresso do Chega, disse no discurso de abertura que preferia “esperar para ser governo em Portugal do que ser muleta de um partido do sistema”, como o PSD. Disse também que “não nasceu para negociar lugares” e que negociar com Rui Rio até podia levar o Chega a “ganhar o Governo, mas ia perder o povo português”. Três meses depois já pedia quatro ministérios e agora já quer ser o número dois do Governo. Como podem os seus eleitores e os militantes do Chega confiar em alguém que já negoceia cargos com o sistema? O que diria o André Ventura de setembro do André Ventura de maio?
O André Ventura não quer ser vice-primeiro-ministro do Rui Rio, o André Ventura quer ser primeiro-ministro, mas reconhece o que os números objetivamente referem.

Mas isto era uma questão de princípio, não negociar lugares com o sistema.
E é. Repare, se não fosse negociar lugares eu fazia o que o CDS fez sempre com o PSD. Que é dizer “Não, não temos nenhuma exigência, depois se verá a seguir às eleições”. Não, nós estamos a dizer o que é que exigimos para o governo porque queremos mudar estas áreas de governação — isto não é ceder em nada, é exigir. Portanto, nós só iremos para um governo em que estas áreas possam efetivamente ficar sob a nossa tutela. Alguns dizem-me: “É impossível, o governo maioritário nunca dará a Administração Interna porque é uma área fundamental de soberania”. Verá, tão certo como eu me chamar André Ventura, que, se isso não acontecer, não há governo.

O meu ponto não são as pastas que pediu, é estar só a pedir cargos quando disse que não negociava cargos — e foi aplaudido e eleito com base nisso.
Não estamos a exigir cargos, estamos a exigir áreas.

Vice-primeiro-ministro é um cargo.
Quer dizer que se Rui Rio não conseguir levar o governo a bom porto há um vice-primeiro-ministro que está disposto imediatamente a substituí-lo. E nesse caso seria eu. Mas quero dizer sobretudo que as áreas fundamentais que temos são estas. Olhe para trás para a História recente de Portugal. O que é que aconteceu sempre entre CDS e PSD à direita? Foi não se falar de áreas, não se falar de nada, dizer “Vamos ver o que é que os portugueses nos dizem” — e, depois das eleições, há um arranjinho ao fim de duas semanas e está feito o governo. Isso é que é negócios de lugares, o nosso é muito claro e transparente. Para mim era muito mais fácil dizer simplesmente “Nunca acontecerá, façam como entenderem” e duas semanas depois negociar um governo. Não, nós somos muito claros, não nascemos para ser um partido de protesto, nascemos para ser um partido de governo. Um partido de governo quer ser governo, mas olhamos para os números. Eu gostava de estar com 28%, não estou. Estamos com 8%, 9% ou 10%. Se ficarmos, nas legislativas, entre 10% a 15% e o PSD estiver entre 20% e 25%, significa que podemos andar no tal número mágico que o Presidente da República apontou, juntamente com a Iniciativa Liberal e o CDS, para podermos formar um governo à direita. Ora, se o Chega tiver 15% dos votos — ou 12%, ou 13% — só com muita ligeireza é que podia dizer que aceito sustentar o governo sem qualquer exigência de transformação, Nós queremos ser governo de Portugal e por isso vamos exigir áreas fundamentais onde se transforma a vida das pessoas: na Segurança Social, na Administração Interna, na Agricultura e na Justiça.

“Muitos portugueses de bem defendem a pena de morte para pedófilos”

Antes dessas eleições há outras, que são as autárquicas. Qual é a sua expectativa em relação aos números?
Terceira força política é aquilo que esperamos, em número de votos.

Se não conseguir ser a terceira força política o que é que acontece?
Tiraremos as ilações, sobretudo em termos do caminho que estamos a fazer — e percebemos que se calhar temos de baixar, reforçar, melhorar e que não estamos a seguir o caminho totalmente certo.

Mas não irá demitir-se e voltar a candidatar-se, como fez depois das presidenciais?
Não faz sentido, eu não sou candidato, acabei de ser eleito com 97%, foi claro que os militantes do Chega me querem à frente do partido.

Na realidade, houve 78% dos militantes que não votaram.
Mas podiam ter votado se quisessem. Seria como dizer que o Presidente da República não tem legitimidade porque foi eleito porque metade absteve-se. Pode ter a certeza de que se houvesse uma disputa à direção muitos mais iriam certamente votar. Eu tenho ido por todo o país e há uma coisa que lhe garanto. Eu ontem estava a fazer um discurso às 2 horas da manhã e tenho a certeza disto: nenhum outro partido neste momento junta tanta gente como nós. Estes militantes estão dispostos a votar, a apoiar, e querem continuar este processo.

E se o resultado das autárquicas não for o desejado, que consequências há?
Há a consequência da aprendizagem. Se calhar teremos de infletir algumas posições. Mas quero acreditar que em número de votos e não de mandatos — que a CDU tem nichos históricos e está a concorrer há 46 anos a estas eleições — seremos a terceira força política na noite eleitoral e isso para nós é um salto quantitativo e qualitativo extraordinário.

Se não for a terceira força, se não eleger em Lisboa, é uma derrota.
Eu assumo as minhas próprias falhas. Mas quando é que estará em causa o meu lugar? Nas legislativas, efetivamente.

Mas não é o responsável último pelos resultados autárquicos?
Sou, mas aqui há outros protagonistas que também têm de assumir o seu lugar e ganhar o seu próprio protagonismo e dinâmica. Agora, quando é que o meu lugar será novamente escrutinado em termos de avaliação política? Nas eleições legislativas. Aí, sou eu o candidato a primeiro-ministro, sabendo nós que o nosso sistema é de natureza parlamentar, e é aí que os portugueses e os militantes do Chega me avaliarão — não é certamente por estas condenações dos bandidos da Jamaica que serei afastado de líder do Chega. Digo isto porque quando cheguei a uma convenção em Bragança me perguntaram: “Se for condenado vai deixar de ser líder do partido?”. Não, não vou. Os militantes do partido é que decidem quando é que a pessoa entra e quando é que a pessoa sai e neste caso os militantes do partido deixaram claro uma coisa: que querem um novo mandato para mim enquanto líder do Chega e querem que o Chega continue este caminho. Alguns apontavam que sou demasiado radical aqui e ali, aparentemente 90 e tal por cento acham que este é o caminho — e, portanto, vou continuar exatamente este caminho. Se me disser: chega às legislativas e fica em sétimo lugar, mantém-se como líder do Chega? Claro que não.

"Sempre soube que Nuno Graciano defende a pena de morte para pedófilos"

LUSA

O seu candidato a Lisboa, Nuno Graciano, é a favor da pena de morte para pedófilos. Isto vai contra um referendo que foi aprovado no partido. Não é contraditório o Chega ter um candidato que vai contra a vontade dos militantes depois de o partido ter sido ouvido?
40 e tal por cento foi a favor da pena de morte. Eu não sou a favor.

A maioria não foi a favor.
54 ou 55, não me recordo agora, foram contra. Mostra que somos uma democracia interna, funcionamos, não temos regras estalinistas de funcionamento. As peossoas pronunciam-se, uns são a favor, outros são contra. Eu pessoalmente sou contra a pena de morte, uma parte por razões religiosas, outra por razões de erros judiciais que são sempre possíveis. Agora, se me perguntar se me choca a pena de morte em alguns casos, não me choca.

Mas está confortável com o seu candidato a Lisboa?
Estou confortável, eu sabia e sempre soube que ele defende a pena de morte para pedófilos. Quando era apresentador de televisão já defendia a pena de morte nesses casos. Eu li a entrevista e penso que foi essa a expressão que ele usou no Observador, por considerar que é uma doença incurável e que os pedófilos merecem pena de morte. Se fizessem um referendo ao povo português sobre esta matéria provavelmente tínhamos uma surpresa muito grande e a maior parte das pessoas se calhar até achava que a pena de morte para pedófilos é uma solução aceitável. Eu, como líder, tenho de respeitar a vontade do partido e, atenção, mesmo na altura do referendo eu disse isto: mesmo que o partido aprove a pena de morte como uma proposta política eu nunca a vou apresentar no Parlamento. Quando tivermos mais deputados, se o partido a quiser apresentar acho que é um erro político, mas admito que isso possa acontecer. Eu nunca apresentarei uma proposta para a pena de morte. Agora, se o Nuno Graciano defende a pena de morte para a pedofilia, acho que muitos portugueses, bons portugueses, portugueses de bem, defendem a pena de morte para pedófilos.

Fez rasgados elogios a Suzana Garcia, mas a candidata do PSD à Amadora afastou-se do seu partido e disse até que deseja que o Chega seja “exterminado”, tal como usou a expressão para o Bloco de Esquerda. Mantém os elogios?
Mantenho. Hoje estou a usar muitas expressões de Jesus Cristo, mas vou usar outra. Quando nos dão um estalo, nós damos a outra face. Eu sou mesmo assim, não me movo por ódios pessoais nem por pessoas que dizem hoje uma coisa, que se identificam com o Chega nas ideias mas depois acham que o partido deve ser exterminado quando convém. Acho que Suzana Garcia tem qualidades, acho que a Suzana Garcia tem um ADN do Chega muito forte.

Ela discorda.
Muito bem e eu tenho o direito também de discordar. Portanto, não vou deixar de elogiar Suzana Garcia só porque ela me ataca. Olhe, há muitos jornalistas que me atacam e eu acho que eles são excelentes jornalistas. Em muitos percebo que há um preconceito em relação a mim ou ao Chega e não deixo de reconhecer que são excelentes jornalistas. Vou-lhe dar um exemplo: no MEL, quando eu cheguei ao auditório, estava a falar um comentador, o João Miguel Tavares, que sempre que pode ataca-me de todas as maneiras, às vezes até de forma bastante infame. Se me perguntar se ele é um bom comentador e se gosto de ouvir na televisão, gosto. Por isso não me pauto por isso. Acho que a Suzana Garcia tem qualidades, acho que vai ter um bom resultado — espero que o meu candidato tenha melhor do que ela — e acho que a Suzana Garcia cedo ou tarde acabará no Chega.

O seu vice-presidente Gabriel Mithá Ribeiro aconselhou os candidatos autárquicos do Chega a procurarem nos concelhos em que são candidatos “as pessoas carenciadas” para depois lhes darem alimentos e outros produtos. O Chega quer comprar o voto dos mais pobres e dos mais vulneráveis?
Não, de todo. Quero começar por fazer esta declaração: penso que o sentido das declarações do Gabriel Mithá Ribeiro foram no sentido de que o Chega vá ao encontro e perceba as reais necessidades das pessoas, e que o Chega serve para solucionar os problemas. É assim que interpreto aquilo que ele quis dizer. Não me pergunte qual é o sentido real, tem de lhe perguntar a ele, não é essa a nossa lógica.

Mas pretende ter candidatos que durante a campanha vão oferecer coisas aos eleitores?
De todo, tanto criticamos os que distribuem frigoríficos como os que compram votos, não é a nossa prática. Tenho a certeza que não foi isso que Gabriel Mithá Ribeiro quis dizer. Há aqui é uma sensibilidade do Chega, há muito esta questão de ‘a quem é que o Chega interessa, quem é que o Chega deve defender?’. Para nós a lógica foi sempre muito clara, o Chega só continuará a crescer desta forma que tem crescido se for o representante real das necessidades do povo português.

Já se conhece o candidato autárquico a Lisboa, mas não se conhece o candidato do Porto.
Será conhecido no dia 12 de junho. Não quero antecipar porque não tenho ainda o processo totalmente fechado.

"Não, [Luís Filipe Vieira] não me conseguiu convencer. Se estivesse na comissão de inquérito ao Novo Banco de certeza que faria outras questões."

Vai fazer uma marcha em Coimbra antes do Congresso. Ia ao mesmo local onde durante a campanha foi pressionado por uma contra-manifestação…
Fui cercado.

Disse que ia para o mesmo sítio, mas agora o local onde a marcha acaba é quase a três quilómetros. Se era para afirmar que ia ao mesmo local e que não condicionavam o Chega, porque é que mudou de sítio?
Nós, ao contrário de outros partidos, respeitamos a força das autoridades, porque se não respeitássemos íamos para o mesmo sítio e iríamos procurar o confronto — mas não vamos. Mal se soube que o nosso congresso era em Coimbra, começaram a circular e-mails e conversas, manifestos e apelos para que se juntassem contra nós e para que houvesse contra-manifestações. E, portanto, a praça foi reservada ainda antes de termos oficialmente feito o trajeto com tudo certinho para aquele lugar. Repare: nós temos um congresso, é a reunião máxima do partido, vão-se juntar centenas de pessoas, talvez milhares, e o que é que os grupos de esquerda e extrema-esquerda do país fazem? Juntam-se para ir causar conflitos em Coimbra. Espero que corra tudo bem, honestamente, mas há uma coisa que quero deixar como garantia: desta vez não estaremos desprevenidos, desta vez não nos cercarão, desta vez podem ter a certeza de que nós seremos mais do que eles e a força que teremos na rua em Coimbra poderá ser três vezes mais ou dez vezes mais se insistirem e continuarem a provocar-nos. E queria deixar isto aqui muito claro: desta vez não estaremos desprevenidos, desta vez encheremos Coimbra com toda a nossa massa humana e se for preciso levar 10 mil pessoas para Coimbra, levaremos, porque temos muito mais gente do que qualquer grupo de antifas que junta 50 ou 60 pessoas numa praça.

O que achou da prestação de Luís Filipe Vieira na comissão de inquérito ao Novo Banco? Ele conseguiu convencê-lo que não tem culpa de ser o segundo maior devedor do banco?
Não, não me conseguiu convencer, mas também não é essa a questão. Eu não estou nessa comissão e depois ainda vou dar uma explicação sobre isso.

Já sabemos porque é que não está…
Se lá estivesse de certeza que faria outras questões a Luís Filipe Vieira e certamente que o faria com a mesma liberdade que farei a outros, sejam meus amigos ou não sejam, como faria a Pedro Passos Coelho, como faria a outros líderes quaisquer. Como vos diria hoje aqui, não pauto a minha vida política pelas amizades. Sou amigo de Luís Filipe Vieira, sou. Faria as perguntas que tenho de fazer, faria. Quero só deixar isto claro: o Chega propôs uma comissão de inquérito ao Novo Banco, só que a diferença para com os outros é que o Chega propunha investigar tudo isto que estão a investigar, que são os desvios do dinheiro…

… e ainda os partidos.
Não, não. E o financiamento das campanhas. E a nossa proposta foi chumbada. Por isso, vi nas redes sociais naquele dia “Onde é que está o André Ventura? Porque é que não está aqui a questionar Luís Filipe Vieira?”. Por uma razão: porque não me deram lugar na comissão.

Mas Luís Filipe Vieira não o convenceu?
Acho que ficaram perguntas por fazer, eu faria mais perguntas porque acho que há questões que são importantes — e o próprio Luís Filipe Vieira como empresário, não como presidente do Benfica, tem interesse em responder a estas questões.

Trouxe Marine Le Pen à sua campanha presidencial. Ela está a ser investigada pela polícia por suspeita de ser a responsável direta por um sistema fraudulento que desviou 6,8 milhões de euros em fundos europeus para pagar salários de trabalhadores do partido. Não o incomoda a proximidade a alguém que está a ser investigado por isto?
Incomodam-me todos os casos iguais a estes, sejam de Marine Le Pen, sejam do Podemos, em Espanha — todos.

Mas o Podemos não esteve consigo em campanha.
Exato, é isso. Incomodam-me todos, os que me abraçam e os que não me abraçam, não sou daqueles que só se incomodam com os outros — incomodam-me todos. Se me perguntar se acho o timing estranho, acho muito estranho que um caso de 2017 a dois meses das eleições regionais francesas chegue ao ponto em que está hoje. Não é nada que me surpreenda, na verdade, mas essa parte não deixa de me levantar algumas questões. Se um tribunal francês — e a justiça francesa tem dado provas de que consegue ser eficaz quando quer — condenar Marine Le Pen ou outro qualquer líder por desviar dinheiro que é dos contribuintes, só merecerá uma palavra minha: censura absoluta e total. Eu procuro ser o mais equidistante, aquilo a que tenho apelado é que sejamos capazes de criticar todos, do Podemos à Marine Le Pen. O Podemos também está a ser investigado por financiamento ilegal e faz-se muito menos perguntas sobre isso do que sobre a Marine Le Pen. Se a Marine Le Pen for condenada por desviar dinheiro que é nosso, que é dos contribuintes portugueses, pode ter a certeza de uma coisa: mais abraços a mim não me vai dar de certeza.

[Veja aqui a entrevista de André Ventura na íntegra]

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