Lembra-se de ver os telejornais abrirem com a notícia de que só a troco de rendibilidades superiores a 17% é que (alguns, poucos) investidores aceitavam “tocar” em dívida portuguesa com prazo de 10 anos? Foi no início de 2012, quando foram aplicados os últimos cortes de rating que vieram com o pedido de ajuda internacional, quando a Grécia estava prestes a ter o primeiro “perdão” de dívida e numa altura em que existiam as maiores dúvidas sobre o futuro da união monetária. Sete anos e meio volvidos, e com tanto que aconteceu nos mercados financeiros, essa parece uma página distante do livro que conta a história da crise da zona euro. Neste momento, as mesmas taxas de juro estão em zero, o que traz uma folga inédita para quem gere as contas públicas. É o marcador de mais uma página que se vira, mas isso só mostra que o livro ainda não chegou ao fim.
Há vários meses que quase todos os estados europeus beneficiam de taxas de juro negativas quando vão aos mercados financeiros — isto é, obtêm mais financiamento do que, depois, têm de reembolsar. Essa tendência começou, como seria de esperar, nos chamados bilhetes do Tesouro, instrumentos de curto prazo que funcionam mais como instrumentos de gestão de tesouraria do que outra coisa. O tesouro português já consegue juros negativos na dívida de curto prazo há longos meses. Mas, com avanços e recuos, em quase todos os outros países da zona euro — incluindo Portugal — os juros negativos alastraram-se para o principal instrumento de financiamento, as obrigações do Tesouro, em prazos cada vez mais longos.
No prazo de referência de 10 anos a dívida portuguesa já está a ser transacionada entre os investidores com rendibilidades de 0,1%, um nível semelhante ao de Espanha — e não muito longe da Irlanda, que vende dívida a 10 anos com um juro negativo de -0,1%. São valores que comparam com as taxas de -0,7% e -0,4% que têm a Alemanha e França, respetivamente, gerando-se o aparente paradoxo que é ter investidores a comprar instrumentos financeiros com uma rendibilidade negativa, isto é, aplicando uma quantia financeira e (pelo menos, em teoria) recebendo menos dinheiro no momento em que, passado alguns meses ou anos, recupera o seu investimento. Porquê emprestar a um país e perder dinheiro?
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