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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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O comício de Bolsonaro em São Gonçalo em que se falou para as mulheres e para o heli da TV Globo. "Vivemos uma guerra espiritual"

Jair Bolsonaro encheu esta terça-feira um recinto na área metropolitana do Rio e começou por se dirigir às mulheres. E atacou o que chama "Partido das Trevas". Como as apoiantes viram o seu discurso.

O sol encoberto na manhã desta terça-feira queimava no recinto da Arena de São Gonçalo muito antes da chegada de Jair Bolsonaro. Eram 9h30 e o comício, na área metropolitana do Rio de Janeiro, estava marcado para daí a uma hora e meia. Apesar de ser meio da manhã de um dia da semana, centenas de pessoas estavam no interior e milhares já andavam pelas ruas envolventes — algumas esperavam nas filas para passar na deteção de metais. O som de músicas de apoio ao candidato ouvia-se dentro e fora do espaço. “Remédio para esquerdistas é Bolsonaro. O terror do Luladrão é Bolsonaro na parada”, repetiam.

No palco destacavam-se as cores da bandeira do Brasil, a imagem de Jair Bolsonaro e o slogan: “Seguir Avançando”. E um animador que ia aquecendo os ânimos, que explodiam sempre que um drone se aproximava ou que era dada uma indicação sobre o Presidente brasileiro e candidato a novo mandato. “Acabei de receber a notícia de que o nosso Presidente está a caminho de São Gonçalo”, anunciava perto das 10h, levando a plateia à loucura.

“Quem acredita nas sondagens?”

Por entre músicas de campanha e o acompanhamento da viagem de Bolsonaro, o speaker também aproveitava para cimentar a desconfiança nas sondagens, questionando: “Quem acredita em pesquisas aqui? Ninguém levanta a mão? E quem acredita que elas são compradas?” À terceira questão, mais uma reação efusiva.

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Cerca das 10h30, a Arena de São Gonçalo tinha já milhares de pessoas — apesar de não estar cheia, estava bastante composta para receber o candidato à reeleição. Nessa altura, Bolsonaro estava prestes a entrar e  o público foi desafiado a dizer se foi pago para estar ali. A resposta não tardou e veio cantada: “Eu vim de graça. Eu vim de graça”.

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Foi num clima de muita euforia que Bolsonaro chegou. Em cima do palco estavam, ao seu lado, o governador do Rio de Janeiro recém eleito Cláudio Castro, o Prefeito de São Gonçalo, Capitão Nelson, o deputado estadual Douglas Ruas, o deputado federal Altineu Côrtes e o filho Flávio Bolsonaro, senador da República.

O Presidente saudou a plateia — sob o olhar atento de vários snipers espalhados pelas coberturas dos edifícios mais altos — e, enquanto segredava com a comitiva, fazia sinais com as mãos de que o recinto estava cheio de pessoas. Aparentemente surpreendido, visto saber que se trata de uma cidade que lhe é favorável, basta lembrar que no primeiro turno alcançou ali 50,09% dos votos, contra os 42,4% dos de Lula da Silva. Todas as movimentações tinham como som de fundo o hino nacional, pela voz da cantora gospel Cristina Mel.

“Pessoal, vamos gritar ‘Lula ladrão’ para o helicóptero da Globo ouvir”

Flávio Bolsonaro foi um dos que discursou antes do pai e lembrou que Jair Bolsonaro “fecha com trabalhadores, não com traficantes” e que o “boné que usa é o do Brasil e não o do CPX” — numa referência ao facto de Lula ter usado um boné com a sigla CPX, de Complexo, na visita ao Complexo da Maré.

“Quem é mãe aqui levanta a mão! Você gostaria de ver o seu filho chegando a casa com o olho vermelho de tanto fumar maconha?”, questiona, recebendo um grande “não” de volta. “O lado de lá defende a legalização das drogas”, reforça.

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De repente toda a gente começa a gritar “mito, mito” e a saltar. Um helicóptero da TV Globo estava a aproximar-se. Flávio Bolsonaro apercebe-se e aproveita para incitar: “Pessoal, vamos gritar para a Globo ouvir: ‘Lula ladrão, seu lugar é na prisão’. Vamos botar para fora tudo aquilo que está engasgado na nossa garganta”. Enquanto o povo obedecia e repetia vezes sem fim, Bolsonaro ia soltando uns sorrisos.

Cláudio Castro, candidato apoiado por Bolsonaro e que venceu a eleição para Governador do Rio de Janeiro, também falou antes do Presidente, começando logo por avisar que seria rápido: “Sei que está sol e que o que as pessoas querem é ouvir Bolsonaro”. Ainda assim aproveitou para agradecer a votação que lhe permitiu ser eleito logo na primeira volta no início deste mês e apelou a que todos convencessem os indecisos que conhecem e “os que foram enganados pelos institutos de sondagens”.

Marcelo Freixo, candidato a governador do Rio apoiado por Lula: “Mais importante que a vitória do Lula é a derrota do Bolsonaro”

Bolsonaro: “Manda quem pode, obedece quem tem mulher”

Assim que recebe o microfone, Bolsonaro acompanha a letra da música que está a passar e que visa um eleitorado que precisa conquistar: “Agora chegou a vez, mulher brasileira em primeiro lugar”. Assim que a música acaba, cerca das 11h40, o animador grita várias vezes o nome do Presidente para lhe passar a palavra. Bolsonaro atirou logo que ia começar com um recado para os homens e disparou sem qualquer contexto prévio: “Manda quem pode, obedece quem tem mulher”. E riu-se, fazendo rir toda uma plateia, a essa hora muito mais composta — já não se viam grandes espaços de gravilha vazios de gente.

“É uma grande satisfação voltar ao meu Rio de Janeiro, estado onde me formei, me lancei na vida pública e no qual chegámos à Presidência da República. É uma grande satisfação também por rodar o país todo e cada vez mais ver esse povo trajando o verde e amarelo, as cores da nossa bandeira. Vamos balançar a nossa bandeira? Maravilha. A volta do patriotismo, o respeito pelos símbolos nacionais. Isso nos une, isso nos faz mais fortes e lutar por aquilo que interessa a todos”.

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“A nossa bandeira jamais será vermelha”, entoa o público. No palco, Bolsonaro volta a pedir um voto no seu partido: “Até ao dia 30, todo o dia é dia de 22 [número em que as pessoas terão de votar para o escolher como Chefe de Estado], de Bolsonaro, mas dia 29 a gente vai dar um tempo, porque todos nós aqui seremos Flamengo [o clube brasileiro vai disputar com o Athletico-PR a final da Taça Libertadores] — Flamengo campeão dia 29 e, dia 30, todos votando Bolsonaro”.

O discurso teve cerca de dez minutos, vários ataques ao PT e elogios a quem ali estava, numa manhã de um dia de trabalho: “A vocês, que são um povo alegre, um povo trabalhador e honesto, que sabe o que quer para o seu país, no dia 30 não será apenas a escolha de um Presidente, mas a escolha do que queremos para o nosso Brasil”. “Uma escolha sobre se queremos liberdade ou não, se queremos voltar à roubalheira do PT ou não, se queremos o respeito pela família ou não, se queremos legalizar as drogas ou não. E também sobre se queremos respeitar as nossas crianças ou não. Nós respeitamos a família, diferentemente daquele ladrão de nove dedos”, disse, rematando que o PT é o “Partido das Trevas”.

Amanda gostou de ouvir que ali “não há ladrão”

Amanda Neves, 44 anos, era uma das milhares de pessoas que ali estava a ouvir com atenção o seu candidato. E o que mais gostou de ouvi-lo dizer é que naquele projeto “não há ladrão”. “Para mim o nosso Presidente estar na nossa cidade é o mais impactante, esse homem tem de ganhar, é a salvação”, diz ao Observador, explicando que a mensagem mais importante do dia é a de que ali “não tem ladrão”.

“O PT governou durante 16 anos. Hoje as pessoas falam muito que ao menos o PT fez, mas não fez nada. Só roubou”, explica esta antiga vendedora, que agora é estudante universitária — está a tirar o curso de gestão hospitalar. Amanda, diz, chegou a votar em Lula da Silva “no primeiro ano”, porque “achava que era a solução do nosso país, mas depois que ele afundou…”.

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Hoje não é assalariada e por isso decidiu ir ali, mas arranja justificação para que haja tantas pessoas no recinto em dia de semana: “Eu hoje já trabalhei também, comecei às 5h, parei e vou voltar, mas se eu fosse assalariada eu pediria igualmente ao meu patrão para vir aqui”.

A sua experiência diz-lhe que os problemas da Saúde de que agora se fala já existiam antes de Bolsonaro e afirma que a fome também não é um problema de agora, “já existia antes”: “É um problema de vários governos”.

E quanto às mulheres, assume-se como não feminista e garante que nunca se sentiu ofendida com as falas de Jair Bolsonaro, bem pelo contrário: “Ele defende Deus, Pátria e Família. Eu sou católica e o meu marido espírita, nós somos brasileiros e nós acreditamos na família”, atira, explicando porque, na sua opinião, outros países não convidam Bolsonaro: “É só olhar para o Biden lá, o PIB dele já está 8 e tal por cento, aqui a gente já passou, está 7 e poucos por cento”.

“Não concordo com tudo, mas acontece o mesmo em relação à minha mãe”

Rhayssa Alves, 18 anos, também esteve atenta a todas as palavras de Bolsonaro. E o que mais lhe tocou foi a parte da família. Vive com a mãe, que está ali com ela, e uma irmã mais velha, de 24 anos, que é a única lá em casa a votar Lula da Silva. “A minha família é tudo para mim. Então não aceito que digam que a família não é base nenhuma, a minha mãe é a minha base”, começa, afirmando que entende “haver pessoas diferentes, mas que discorda da imposição”.

“Eu acho que sempre existe extremos de tudo, nos dois lados vai ter extremos, mas eles impõem e a gente aqui, na igreja, respeita a pessoa”, sustenta.

Rhayssa estuda jornalismo, uma classe que tem sido muito posta em causa pelo Executivo de Jair Bolsonaro, mas nem isso a afasta do candidato à reeleição. “Nunca me incomodei. Eu, por exemplo, tenho a minha opinião, mas se algum dia for entrevistar o Lula eu vou ter de falar das coisas boas e das partes ruins do Governo dele. Aqui o que aconteceu na Globo [entrevista a Jair Bolsonaro] eu não aceitei, tenho uma professora de esquerda que disse mesmo que aquilo não é jornalismo, que foram acusações e que não deixaram ele falar. E eu acho que o jornalismo tem de ser imparcial”, diz, ressalvando que a única coisa com que não concorda é com o facto de os apoiantes de Bolsonaro tratarem todos os jornalistas da mesma forma.

Mas quando se foca em Bolsonaro, a estudante de jornalismo não concorda com tudo o que é dito pelo atual Presidente. “Mas isso acontece o mesmo com a minha mãe, também não concordo com tudo o que ela diz”, sorri.

No plano internacional, a estudante diz esperar que Bolsonaro corrija o que não foi bem feito, incluindo o reforço das relações com países como Portugal. Acha ainda que falta ao atual Chefe de Estado uma característica de Lula, a de conseguir “fazer a cabeça das pessoas” e na sua opinião a recente aproximação ao ex-juiz Sérgio Moro foi uma “estratégia para desestabilizar Lula no debate, mas ao mesmo tempo para descredibilizar o próprio Sérgio Moro”.

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“Estamos a viver uma guerra espiritual, temos de usar algumas armas”

Ao seu lado, a mãe, Simone Alves, vai concordando com quase tudo, mas torce o nariz nesta última parte: “A Lava Jato só veio confirmar o que toda a gente já sabia, que havia corrupção. E eu acho que foi perfeito Bolsonaro ter depois convidado o juiz da Lava Jato para o seu Governo, foi a melhor jogada dele, porque também desmascarou o Sérgio Moro.”

“As pessoas gostam de ser enganadas, gostam de ouvir coisas que não são verdadeiras. O Bolsonaro diz coisas que muitas pessoas gostavam de falar e não falam. A minha mãe já dizia ‘Lula é boçal, mas ele tem uma coisa que poucos brasileiros têm, sabe manipular a cabeça das pessoas'”, continua a assistente jurídica, de 50 anos.

Já quanto ao facto de esta terça-feira em cima do palco, por várias vezes, se ter pedido para que todos convencessem amigos a votar em Bolsonaro não acha que seja “fazer a cabeça às pessoas”: “Eu sou católica, nós não estamos a viver somente um momento político, estamos vivendo uma guerra espiritual e, infelizmente, a gente tem de usar algumas armas”.

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