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A líder parlamentar do Partido Comunista Português (PCP), Paula Santos, fala aos jornalista para divulgar a posição do partido quanto à sessão solene com o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, Assembleia da República, em Lisboa, 20 de abril de 2022. ANTÓNIO COTRIM/LUSA
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Paula Santos é líder parlamentar desde as últimas eleições. João Oliveira, que liderava a bancada, falhou a eleição por Évora em janeiro

ANTÓNIO COTRIM/LUSA

Paula Santos é líder parlamentar desde as últimas eleições. João Oliveira, que liderava a bancada, falhou a eleição por Évora em janeiro

ANTÓNIO COTRIM/LUSA

Paula Santos: "A tendência da maioria absoluta para abusos começa a ver-se"

Em entrevista, líder da bancada acusa o PS de fazer políticas liberais e diz que PCP está sob ataque porque é incómodo. Posição de Portugal sobre Ucrânia é "seguidismo" e "subalternização".

Foram as primeiras jornadas parlamentares de Paula Santos, a sucessora de João Oliveira, como líder da bancada do PCP. E acabaram, esta terça-feira, em Palmela, com um sabor agridoce: o partido anunciou propostas nas mais variadas áreas para contrariar o aumento do custo de vida (quase todas repetidas ou recuperadas do Orçamento do Estado) mas, com a maioria absoluta do PS, o chumbo é quase certo. Nada que faça a magra bancada comunista desistir, assegura a líder, mesmo contra os “abusos” da maioria e as políticas de “liberalização e privatização” do PS — a “rua, que tem muita força”, fará o resto da oposição.

A dirigente comunista, que recentemente passou a integrar a Comissão Política do Comité Central (um dos órgãos mais restritos do PCP) garante que o PCP está mesmo a ser alvo de uma operação de ataque por ser um partido que “incomoda” no meio de uma tendência para o “pensamento único”. Nomeadamente na Ucrânia, onde insiste em apontar culpas aos EUA e à NATO — a quem chama responsáveis por continuar a guerra — e acusa Portugal de ter uma posição “seguidista” e “subalterna”.

São as suas primeiras jornadas enquanto líder parlamentar. Como é que tem sido reorganizar a bancada agora com quatro deputados a menos? Os deputados do PCP estão a fazer muitas horas extra?
É de facto um mandato muito exigente, também tendo em conta as condições com que estamos a viver no nosso país. Acho que nestes primeiros meses é visível o nosso trabalho e soluções. A nossa principal preocupação é intervir sobre os problemas que aí estão.

O PCP acaba de apresentar uma série de propostas legislativas sobre o aumento do custo de vida e outros problemas atuais. Questionada sobre as poucas hipóteses que estas medidas têm de passar, disse que se vivem tempos difíceis no país. Com esta maioria, também se vivem tempos difíceis na Assembleia da República?
Não desistiremos de intervir e defender o que consideramos justo e necessário. Um contexto de maioria absoluta é diferente, o PS está de mãos livres e creio que isso já é visível neste Orçamento do Estado para 2022. Mas também na Assembleia essa maioria absoluta — há sempre tendência para abusos — começa já a ser visível. Ainda recentemente foi rejeitado um requerimento do PCP para ouvir as organizações representativas dos trabalhadores sobre a situação dos CTT. Isso revela uma tentativa de procurar obstaculizar e criar dificuldades ao que são as próprias funções da Assembleia, neste caso de fiscalização.

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Quando fala em abusos, é a tentar travar a fiscalização do Governo?
Sim, de impor a vontade da maioria absoluta sobre os demais. Houve um episódio no OE de uma proposta já fora de tempo e que o PS teve uma posição de imposição, desrespeitando as normas do próprio regimento da Assembleia. Não respeitando essas normas, ficamos em função da vontade do PS e do que lhe interessa ou não.

Escolheram como tema destas jornadas a ideia de travar o aumento do custo de vida. Ontem dizia que não chega travar o aumento, é preciso recuperar o que se perdeu na última década. Afinal, durante os tempos da geringonça também se perdeu poder de compra? 
Houve a reposição dos salários que tinham sido cortados na administração pública; um aumento do salário mínimo, como sabe, aquém do que seria necessário; foi possível o aumento extraordinário das pensões… Mas é preciso ter presente que os trabalhadores da administração pública, tirando estes dois anos, não tinham aumentos há dez anos. Mesmo estes aumentos já foram, com o aumento de preços. Sempre falámos na reposição, mas também da necessidade de ir mais longe. O agravamento destes últimos tempos foi muito significativo…

Por isso lhe perguntava se no resto do tempo, de influência do PCP, o partido também se responsabiliza por isso.
Da nossa parte não. O que faltou foi falta de vontade do PS. Durante este período, o PCP não faltou com propostas e intervenção, porque havia condições para ir mais longe, por exemplo nos direitos dos trabalhadores. O que foi rejeitado porque PS o impediu com a direita. Nós batemo-nos por isso.

E neste momento de dificuldades para o país não seria mais benéfico, na perspetiva do PCP, ter essa influência, mesmo que não com a escala que queria? É melhor estar agora na oposição, com uma bancada mais pequena e menos capacidade de influência?
É preciso recuar ao final do ano passado. Não foi o PCP que não quis encontrar as soluções. Estivemos até ao último minuto a procurar soluções. Salários, pensões, SNS, habitação e leis laborais foram as que sinalizámos como de grande importância. Foi o PS que não quis. A votação deste Orçamento deixa isso bem evidente. O PCP sempre teve disponibilidade para encontrar caminhos. Não temos nenhuma ilusão quanto à natureza e políticas do PS, mas procurámos sempre encontrá-los.

Mas nesta altura era desejável estar nessa posição de influência?
Naturalmente seria importante que tivéssemos mais força na Assembleia e, mais do que isso, para ter mais condições para encontrar soluções. A maioria absoluta do PS deixa mais longe essa resolução. Está à vista: o problema dos preços, da saúde… está à vista a falta de vontade política para intervir e enfrentar os interesses dos grupos económicos. Houve uma grande manipulação, um aproveitamento do PS de soluções que eram do PCP. O contexto destas eleições foi muito particular, numa bipolarização e manipulação que levou ao resultado. Mas isso não retira a nossa vontade e determinação. Lutaremos até ao fim.

Mas a pergunta era sobre se neste momento seria possível terem um acordo que permitisse chegarem a soluções concretas, o mesmo tipo de diálogo. Em entrevista ao Observador, na campanha, Jerónimo de Sousa chegou a dizer sobre acordos escritos que o PCP estaria aberto a tudo o que fosse positivo.
Quando há medidas positivas, de facto, o PCP nunca faltou. Mais do que acordos e papéis escritos, é importante a vontade política para resolver problemas. Nós temos, sempre tivemos. Não houve foi do outro lado.

Ouvimos Jerónimo de Sousa a dizer que agora é possível ver quanta razão tinha o PCP quando chumbou o Orçamento. Isto não lembra a frase de Isabel Meirelles, do PSD, que dizia que o povo falhou quando votou PS? Foi o eleitorado que percebeu mal o PCP ou foi o PCP que explicou mal as suas razões?
Não. Estávamos só a constatar que se as medidas que propusemos, voltando ao exemplo da Saúde, tivessem sido implementadas, hoje estaríamos numa situação diferente. Essa recusa foi um dos aspetos que nos levaram a votar contra o Orçamento. O Governo não está, no SNS, a tomar as medidas necessárias.

O PCP teve razão antes de tempo?
A questão não está em querer ter razão. A realidade veio dar-nos razão. Mas não o dizemos com satisfação. O que desejamos e pretendemos é contribuir para a solução e dizemo-lo também como uma chamada de atenção.

Se as eleições fossem hoje acha que o resultado seria diferente?
Não me vou pôr a fazer especulações. De facto, foram num contexto…

"Houve uma grande manipulação, um aproveitamento do PS de soluções que eram do PCP. O contexto destas eleições foi muito particular, numa bipolarização e manipulação que levou ao resultado"

Por isso pergunto. Se o contexto fosse diferente.
Não me vou pôr a adivinhar, mas temos de apreciar esses resultados em função das circunstâncias. Quando falamos com os utentes, os agricultores, há um grande acompanhamento destas propostas que avançamos.

No fim da última reunião do Comité Central, havia uma referência a que o PCP estava sob uma “operação de ataque global”. Isto não reforça a ideia de que o PCP está a apontar problemas circunstanciais para explicar o seu resultado? Não há uma culpa própria?
Houve, e há, uma operação, uma ofensiva contra o PCP. Manipulação, mentira, silenciamento.

É específica de agora? Qual é que é o gatilho?
Não é de agora, mas tem-se vindo a agravar nos últimos tempos. O silenciamento, a deturpação das nossas propostas não permitem que haja um conhecimento da perspetiva do PCP para o país. E isto não ocorre por acaso. O PCP é o partido que enfrenta os interesses dos grupos económicos — viu-se no controlo dos preços da energia. Porque é que o Governo não quer fixar tectos máximos? Não quer enfrentá-los.

Então o PCP está sob essa operação de ataque por ser incómodo.
E é incómodo. Para esses interesses é.

Neste momento vê o PS mais próximo da IL ou do PCP? Fala muitas vezes no alinhamento do governo com a direita. 
O PS não alterou a sua natureza. É um partido que no quadro das suas opções é também protagonista dessa política de direita. Entre defender os interesses dos trabalhadores ou proteger os do patronato, cai sempre para o lado do patronato. Sobre salvar o SNS, não se compreende que um dos aspetos que referiu é recorrer aos privados. Isso claramente não é uma política de esquerda.

"O silenciamento, a deturpação das nossas propostas não permitem que haja um conhecimento da perspetiva do PCP para o país. E isto não ocorre por acaso. O PCP é o partido que enfrenta os interesses dos grupos económicos"

O PS está muito liberal, é isso?
Há um conjunto de aspetos em que acompanha de facto essa linha. E não defende o interesse público. Não haver intervenção do Estado no problema da Habitação é a resposta da lógica do mercado. Esse caminho de privatização e liberalização está a ser prejudicial para a população.

Posso retirar então que o PS está mais perto da IL do que do PCP?
Há uma série de intervenções e propostas… Sim, há matérias que apresentamos e em que a sua rejeição é conjunta: PS, PSD, IL e Chega.

Já agora: disse que o PCP está sempre disponível para o que for positivo. Entrando num cenário em que o PS precisasse de negociar com o PCP fosse para não se entender com a direita ou mesmo para não haver Governo de direita. Voltavam a entrar numa geringonça ou nunca mais?
Temos de discutir os termos concretos. Por isso é importante ter presente que em 2015 aconteceu uma avaliação e discussão e o PCP posicionou-se no concreto.

Mesmo que a alternativa fosse um Governo com o Chega?
Se for esse o caminho do PS… (risos).

Não, o PSD com o Chega. O PCP não tentava travar isto?
É preciso ver os contextos. O PCP foi fundamental para travar o Governo PSD/CDS em 2015 e naquele caminho. Mas intervimos no concreto, avaliando questão a questão.

Sei que me dirá que a luta depende da vontade dos trabalhadores, mas vendo o contexto em que estamos, antecipa mais contestação na rua nos próximos tempos? É na rua que a oposição se vai fazer? A rua terá a força de fazer o Governo mudar de opções?
A rua tem de facto muita força. Foi muito importante a luta dos trabalhadores e populações no período da troika, decisiva para repor direitos e rendimentos. A ausência de resposta do Governo é que vai determinar isso. O que temos visto é uma situação que se agrava quase dia após dia, com dificuldades mais sentidas. Esta recusa do PS em dar resposta aos problemas é extremamente preocupante e levará a ainda maior agravamento das condições de vida. Naturalmente, são os trabalhadores que tomam as suas decisões sobre as suas reivindicações. Mas este caminho do Governo de recusa em fazer o que é necessário levará seguramente ao agravamento das condições de vida.

E, suponho eu, à luta.
E a luta faz-se a partir de problemas concretos. Se sentem que os seus problemas não estão resolvidos, têm necessidade de reivindicar soluções. Será naturalmente um elemento presente. Aliás, ela tem estado presente e tem-se registado esse crescimento nos últimos meses.

Falámos da questão da tal operação de ataque ao PCP. Pergunto-lhe se acha que o PCP está em risco de perder eleitorado por causa da sua posição quanto à guerra na Ucrânia.
Isso não sei especular.

"O que é importante para o PCP é encontrar uma solução pacífica. É sentar todas as partes para tentar encontrar uma solução pacífica. Ou seja, a Ucrânia, a Rússia, a União Europeia, os EUA... EUA e NATO estão a alimentar a guerra"

É a sua opinião sobre o efeito do que o PCP diz ser uma deturpação das posições do partido.
O que é importante para o PCP é encontrar uma solução pacífica, nunca se devia ter chegado a esta circunstância e já se verificou que a via militar não é solução. É sentar todas as partes para tentar encontrar uma solução pacífica. Ou seja, a Ucrânia, a Rússia, a União Europeia, os EUA… Houve todo um caminho que condenamos de instigação e ingerência… naturalmente também esta intervenção por parte da Rússia… O que se coloca é que quem pense diferente não foi respeitado, entrando-se numa lógica de pensamento único que é gravíssima, em democracia e liberdade. É preocupante.

No lote de responsáveis mencionou a NATO e os EUA. Nos comunicados que o PCP tem feito há sempre crítica do caminho anterior e muito das responsabilidades da NATO. O PCP equipara-as às responsabilidades da Rússia? Ou acha que são até maiores?
Não se pode fazer a apreciação deste conflito desde fevereiro. Há aqui fortes responsabilidades por parte dos EUA e NATO.

Mas pergunto sobre a opção do PCP de falar muito sobre essas e nem tanto das responsabilidades muito concretas da Rússia.
Quem tem colocado em declarações públicas que isto é uma guerra para continuar e durar são dirigentes da NATO e EUA. Não estão interessados…

E a Rússia continua a guerra, na prática.
Deixe-me continuar. Não estão interessados numa solução pacífica. Esta é que é a questão fundamental. É de facto necessário juntar todas as partes. Alimentar a guerra só traz mais sofrimento e destruição.

Insisto: não é a Rússia que está a alimentar a guerra?
A NATO e os EUA não estão a alimentar a guerra?

Mas porque é que é esse o foco?
Está a decorrer uma cimeira da NATO em que está a ser colocado o reforço do militarismo e da corrida aos armamentos. Não podemos esquecer os vários conflitos e guerras no mundo — Líbia, Síria, Iémen — com um elemento comum. Não se pode escamotear as responsabilidades de EUA, UE e NATO. Alimentar a guerra, que já tem oito anos, leva à destruição de um país e ao sofrimento.

"A posição de Portugal sobre várias matérias, incluindo este conflito no Leste, tem sido sempre de seguidismo das posições da UE e dos EUA, de subalternização, até dos interesses nacionais"

Voltando à pergunta: equipara, ou acha maiores, as responsabilidades da NATO às da Rússia?
A NATO e os EUA têm muitas responsabilidades.

O primeiro-ministro mostrou resistências visíveis a ideia da adesão da Ucrânia à UE mas acabou por acompanhar a decisão da Comissão Europeia. Foi um erro? Portugal subjugou-se à posição europeia?
Este debate não faz sentido neste momento. O processo de adesão implica sempre imposições e condições que levam à abdicação de soberania. A posição de Portugal sobre várias matérias, incluindo este conflito no Leste, tem sido sempre de seguidismo das posições da UE e dos EUA, de subalternização, até dos interesses nacionais.

Terminando com um assunto que está a ser discutido na Assembleia: em que moldes é que os debates quinzenais devem voltar? Com a mesma regularidade?
Não acompanhámos o fim dos quinzenais. Deve haver um debate sério e produtivo. Sobre esta discussão, ainda estamos a fazer a nossa apreciação. Mas votámos contra o fim dos debates.

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