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Raimundo diz que PCP levou "porrada de todos os lados" por causa da posição sobre a guerra na Ucrânia
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Raimundo diz que PCP levou "porrada de todos os lados" por causa da posição sobre a guerra na Ucrânia

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Raimundo diz que PCP levou "porrada de todos os lados" por causa da posição sobre a guerra na Ucrânia

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Paulo Raimundo: "Escândalo que se passa na TAP dá uma certa vergonha alheia"

Em entrevista, Paulo Raimundo, líder do PCP, insiste na nacionalização da TAP, responsabiliza o Governo por gerir a empresa contra os interesses nacionais e denuncia pequenez da "reunião secreta".

Denuncia os “escândalos” que foram revelados à boleia da comissão parlamentar de inquérito à TAP, diz que a “reunião secreta” entre a CEO da TAP, elementos do Governo e do grupo parlamentar socialista foram um ato “pequenino” e chega a falar em “vergonha alheia”. Mas escusa-se a particularizar a crítica em Pedro Nuno Santos, a quem, no passado, elogiou a “franqueza e a frontalidade”. “O que o ministro fez foi pôr em prática o plano do Governo: limpar a TAP para poder vender e quanto mais depressa melhor. Coloco Pedro Nuno Santos no leque das opções de fundo do Governo com as quais estamos profundamente contra”, diz.

Em entrevista ao Observador, no programa “Sob Escuta”, Paulo Raimundo, secretário-geral do PCP, fala também sobre a crise de resultados do PCP, das sondagens pouco animadoras (“não pomos a cabeça na areia”) e da ideia de que existe uma crise de representação dos sindicatos tradicionais — tese que rejeita. Nesse contexto, não deixa de se demarcar das formas de luta de sindicatos como o S.TO.P.. “Claro que não concordo com greves pagas”, corta o líder comunista.

Raimundo critica ainda a gestão de Fernando Medina (e dos seus antecessores) em vários domínios da Administração Pública, da CP à Saúde. Neste particular, o secretário-geral do PCP chega mesmo a acusar o Governo socialista de estar a prosseguir um caminho de “desresponsabilização, estrangulamento e desvalorização completa dos profissionais do SNS”.

Quanto à guerra na Ucrânia, o líder comunista — o primeiro a assumir com abertura que a “ação militar” da Rússia “era condenável” e que não devia ser “menosprezada e relativizada” — rejeita que exista qualquer duplicidade nas posições que o próprio assume e os documentos oficiais do partido, que ignoraram por completo o papel da Rússia neste conflito. “Não precisamos de estar sempre a escrever tudo”, desvaloriza, ao mesmo tempo que assume o grande desgaste que o tema provocou ao partido: “Levámos porrada de todo o lado na questão da Ucrânia”.

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[Veja aqui a entrevista a Paulo Raimundo na íntegra]

“Dificuldades? Não pomos a cabeça na areia”

Em todas as sondagens realizadas desde janeiro, o PCP não ultrapassa os 5% e chega a ter sondagens de 2 e 3%. O PS desce, mas esses eleitores não vão para o PCP, o que quer dizer que o partido não está a conseguir captar o descontentamento com o PS. O que é que estão a fazer de errado?
Não nos guiamos por sondagens — não é um chavão, é um facto. Estamos a aprofundar o nosso trabalho e as conclusões da nossa conferência nacional vão nesse sentido: maior ligação aos trabalhadores, às populações, aos seus problemas, com o objetivo central de ajudar a resolver esses problemas e é nisso que estamos focados. Isso trará resultados inevitáveis. Do ponto de vista político, social, mas também necessariamente eleitoral.

Mas logo no primeiro discurso como secretário-geral reconheceu que o PCP tem insuficiências internas e disse depois que não chega ter os núcleos “organizadinhos” e as vendas do Avante em dia. Alguma coisa estava mal. Já não está? O que é que mudaram, ou têm de mudar?
Fizemos a conferência nacional e identificámos 20 questões a que era preciso dar resposta, do ponto de vista político e orgânico. Se as identificámos, é porque achávamos que nem tudo estava bem.

E agora já está?
Não, estamos a procurar concretizar as tais 20 linhas de trabalho, que procurarão melhorar esse trabalho que identificámos como insuficiente. Há questões do ponto de vista orgânico mas o fundamental é voltado para os problemas das pessoas e para uma ligação ainda maior do partido à sociedade, de forma a perceber melhor a sociedade em que trabalhamos e mobilizá-la para as reivindicações que não estão a ter resposta do Governo. É preciso contribuir para essa mobilização.

O descontentamento de uma parte do eleitorado tem levado a um aumento da contestação social mas há a sensação de que os comunistas estão a ser ultrapassados. O próprio Arménio Carlos, que foi líder da CGTP durante oito anos, já deixou um aviso sério: “Ou se faz o caminho caminhando ou então é-se ultrapassado no caminho que outros determinaram”. Onde é que a CGTP está a falhar?
Sobre a CGTP, ao contrário do que se possa pensar, não vou dizer muito…

Foi o Paulo Raimundo que disse numa entrevista ao Jornal de Notícias que é preciso uma CGTP mais forte e ativa.
Sim, porque a pergunta foi se a CGTP está satisfeita. E eu disse e reafirmo que não, não pode estar satisfeita, tem de estar sempre insatisfeita para ir mais longe nos seus objetivos. Mas estou de acordo: é preciso ir caminhando. Independentemente das sondagens e dificuldades que são objetivas, não pomos a cabeça na areia — temos paredes de vidro –, os militantes e amigos do PCP estão muito empenhados na sua ligação profunda onde é necessário estar: à porta dos centros de saúde, das empresas, nas ações contra os aumentos do custo de vida. Nós estamos aí.

Mas temos visto um protagonismo crescente de movimentos diferentes, como o S.TO.P, o Vida Justa, o movimento pela Habitação… Os sindicatos tradicionais estão a perder fôlego?
Não me parece. Posso estar enganado, mas acho que há uma ideia feita sobre isso. Criou-se uma ideia de que o movimento sindical está a diminuir a sua capacidade e acho que isso não tem correspondência com a realidade.

Foi o próprio Arménio Carlos que reconheceu essa dificuldade.
É claro que haverá sempre insatisfação e é preciso ir sempre mais longe, mas a realidade tem demonstrado o contrário. Vou dar um exemplo: o Governo decidiu as medidas limitadíssimas sobre as questões do custo de vida e dos preços dos bens essenciais. As decisões são tomadas no seguimento de uma greve enormíssima da administração pública e de uma manifestação enormíssima da CGTP.

Portanto Arménio Carlos está a ver mal a coisa.
Não, tem razão quando diz que é sempre preciso ir mais longe.

Não é isso que ele está a dizer. Está a dizer que há o risco de ser ultrapassado por outros.
Não é possível dizer que a CGTP está a ser ultrapassada. Isso não quer dizer que não haja outras dinâmicas do ponto de vista social, isso é mesmo assim. A única razão para que fenómenos desse tipo surjam são as razões fundas para o descontentamento das pessoas. A única que leva os professores a terem dinâmica de unidade tão grande, em torno desses movimentos mas também do sindical, são as razões fundas dos seus problemas. Encontrarão sempre espaços para manifestar esse descontentamento.

Não há um vazio nos sindicatos tradicionais que permite isso? Há quem no PCP fale de um efeito de arrastamento do STOP, em relação à Fenprof.
Não podemos ignorar as ações promovidas pela plataforma em que a Fenprof está presente e a grandiosa manifestação que ocorreu. Isso não revela incapacidade de mobilização, pelo contrário.

"Governo não vai ceder nos professores? Sabe que as palavras de hoje nem sempre são as de amanhã. Então neste último ano há exemplos disso que nunca mais acabam. Há uma coisa que o Governo não pode ignorar: a unidade e determinação dos professores"

“Claro que não concordo com greves pagas”

Concorda com soluções como a de ter sindicatos de professores a pagarem com fundos de greve a assistentes operacionais para eles fazerem greve e fecharem as escolas?
Claro que não. O ato de fazer greve é de grande determinação e coragem. A pessoa sabe que vai ser prejudicada por isso. Em particular, nas questões financeiras. Não acompanho nada essa ideia. O que marca o direito à greve e a participação num conjunto amplo de greves não essa prática.

Mas aparentemente é também o que atrai os professores que concordam com essa prática e que também se mobilizaram em sintonia com os protestos promovidos pelo STOP. Não há uma falta de sintonia entre a CGTP e os sindicatos tradicionais e esta mobilização dos professores?
Não se pode ignorar as grandes ações promovidas pela frente sindical, as anteriores e as que começam na próxima segunda-feira. Os professores não ganham, a sociedade não ganha, com aparentes conflitos que não existem. Agora, se me pergunta se concordo com essa forma de greve: não, e acho que não corresponde ao que é necessário. Nesta relação entre trabalho e capital o trabalho tem circunstâncias de organização mais desfavoráveis do que o capital.

Qual é o efeito de recorrer a este tipo de greve? Mancha as reivindicações dos professores?
São episódios que não deviam ter acontecido, mas não é isso que marca. Não só não marca como não tem beliscado a unidade dos professores. O que a tem fortalecido é a inexplicável falta de resposta do Governo às exigências justas dos professores. Tivemos na semana passada um acontecimento que é inexplicável: a frente de sindicatos onde a Fepronf e a FNE estão incluídas esteve na mesa de negociações com o ministro da Educação e colocou a questão central: o reconhecimento do tempo de serviço perdido. Compreendendo que não é possível dar a resposta de um momento para o outro, disponível para fazer um plano faseado.

António Costa já fechou a porta a esse reconhecimento integral do tempo de serviço. Até quando é que este braço de ferro pode durar? Com que consequências? Acha que Costa acabará por ceder?
Sabe que as palavras de hoje nem sempre são as de amanhã. Então neste último ano há exemplos disso que nunca mais acabam. Há uma coisa que o Governo não pode ignorar: a unidade e determinação dos professores.

Se for preciso, vamos até ao fim do ano letivo assim?
Tem de fazer essa pergunta ao Governo. Está do lado dele.

Mas se o Governo não ceder, isto deve continuar? As greves, a perturbação nas aulas?
Não faço ideia. Se há quem valorize a escola e faça um esforço pelas aprendizagens, são os professores. Os que estão hoje justamente indignados são os mesmos que defendem a escola. A intransigência do Governo não é boa conselheira — aliás, está completamente isolado nessa questão — e há uma grande unidade dos professores.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

“O que Pedro Nuno fez foi pôr em prática plano do Governo na TAP”

Numa sondagem recente que saiu sobre a TAP, 74% dos inquiridos defendem a privatização e apenas 16% querem uma TAP pública. O facto de o PCP estar em contraciclo com a opinião da maioria num tema tão importante para as pessoas também ajuda a explicar porque é que o partido não cresce?
Se todos os que defendem a TAP pública fossem nossos apoiantes, passaríamos rapidamente dos 5% para os 16%… Não definimos as nossas opiniões em função da opção maioritária em sondagens.

Mas é preciso olhar para as situações concretas do país a cada momento.
Sinceramente, até julgaria que o resultado de uma sondagem desse tipo fosse ainda pior. Face ao escândalo, até a uma certa vergonha alheia que a TAP tem representado, até acharia que a sondagem podia ser ainda pior. A TAP é um exemplo claro do que tem sido estes anos sucessivos de política de direita. Até estranho, a propósito da comissão de inquérito que tem sido muito reveladora, como é que — por uma opção que não consigo compreender, mas um dia havemos de compreender — quer o PS quer o Bloco de Esquerda estiveram contra nossa a proposta de alargamento do âmbito da comissão, que permitisse arrastar para a comissão todo o período da privatização. Não faço ideia porquê. Era esse alargamento que poderia permitir demonstrar que a privatização foi um erro para o país.

Se quisesse convencer estes 74% que defendem a privatização da TAP de que é possível um outro caminho, olhando para os 78 anos que a companhia aérea tem, quando é que a TAP foi bem gerida?
Não há nenhuma inevitabilidade de uma empresa com aquela dimensão e importância — a maior exportadora nacional — ter uma gestão completamente danosa para os interesses do Estado e dos portugueses.

Alguma vez houve algum presidente da TAP que tenha feito um bom trabalho?
A TAP anda a ser gerida há 20 anos para ser privatizada. Se quisermos ir às questões mais miudinhas, tudo aquilo que se passou, com todas estas polémicas, só foi possível porque a TAP sendo uma empresa pública tinha uma gestão privada. Esse é que é o problema da TAP.

Há uma figura no centro de toda esta questão: Pedro Nuno Santos. Elogiou a “franqueza” e “frontalidade” de Pedro Nuno Santos nas negociações durante a ‘geringonça’. Também elogia a forma como ele geriu as relações com a TAP?
Quando fiz essa informação fui sincero. No conjunto de conversações que tivemos, achei exatamente isso. Agora, Pedro Nuno Santos foi membro dos três governos consecutivos — não está desligado das opções de fundo do próprio partido. Está ligado a elas.

Mas teve um papel ativo e interventivo. Tomou decisões. Elogia a forma como Pedro Nuno Santos, enquanto ministro das Infraestruturas, geriu a relação com a companhia aérea?
Independentemente de qualquer outra questão lateral, que não são menores, o que o ministro fez foi pôr em prática o plano do Governo: limpar a TAP para poder vender e quanto mais depressa melhor.

Parece que está a tentar proteger Pedro Nuno Santos. O processo de rescisão de Alexandra Reis foi diretamente dirigido pelo ministro.
Estou a colocar Pedro Nuno Santos no leque das opções de fundo do Governo com as quais estamos profundamente contra.

O PCP acusa o Governo de ter gerido a TAP de forma promiscua. Existe uma confusão entre o que é o Estado e o PS?
Há uma forma de gerir as empresas públicas que não corresponde ao interesse nacional.

Responsabiliza o próprio PS?
Claro. Quem tem o poder, em circunstâncias completamente extraordinárias, tendo tudo para isto andar bem, faz exatamente o contrário.

"Sondagem dá 76% a favor da privatização da TAP? Sinceramente, até julgaria que o resultado de uma sondagem desse tipo fosse ainda pior. Face ao escândalo, até a uma certa vergonha alheia que a TAP tem representado, até acharia que a sondagem podia ser ainda pior. A TAP é um exemplo claro do que tem sido estes anos sucessivos de política de direita"

“Reunião secreta com CEO da TAP? É tão pequenino que nem tem comentários”

Não há nenhuma empresa que funcione bem?
Temos empresas com uma dedicação extraordinária dos seus administradores e diretores. Estive há uns dias nas oficinas da CP no Entroncamento. Há um esforço extraordinário de reparação e de investigação. Durante a visita, fomos ver a reparação de uma carruagem e uma das questões que estavam a mudar eram os estofos. Ora, aqueles estofos ainda não tinham sido substituídos porque estavam à espera da assinatura do ministro das Finanças para se comprar o pano. Isto é possível? É possível fazer uma gestão rigorosa, com objetivos a médio longo prazo, em que é preciso o ministro das Finanças assinar a compra de tecido para fazer estofos?

Mas os sindicatos são muito críticos dessa administração da CP.
Uma parte fundamental dos problemas entre os trabalhadores e a administração da CP não está na mão da administração. Claro que o primeiro embate com a entidade patronal. Mas uma parte significativa dos problemas está na caneta do senhor ministro das Finanças.

Portanto, a CP também não funciona bem. Estávamos a tentar perceber se há alguma empresa pública que na opinião do PCP funcione bem, tenha bons administradores e seja bem gerida.
Não há nenhuma justificação para que isso não seja assim. A ANA era mal gerida? Não era. Então porque é que foi privatizada? Dava imensos lucros ao Estado. Os CTT tinham um problema de prejuízo? Não. Nesta altura, o que precisávamos era ter instrumentos na mão que permitissem determinar rumos. Estamos a perdê-los. Por vontade do Governo, mas também do PSD e da IL, caminhamos para a privatização da TAP. O que é errado.

A impressão que dá é que o PCP só considera boas empresas públicas quando elas já não são. Quando são públicas, os conflitos laborais são imensos.
Quando elas são públicas são tão apetecíveis que são vendidas. É o que vai acontecer com a TAP, se este caminho não for travado.

O PCP defende a nacionalização da TAP. Isso não implicaria que o Governo rasgasse os acordos que tem com Bruxelas? O PCP acha que o Governo deve pagar esse preço? E a que custo?
A TAP é uma empresa pública.

Mas o Governo diz que está obrigado a vendê-la.
Por que razão? Mas será que o Estado português é o único da União Europeia que tem companhias aéreas públicas? Não é verdade. Não se pode alegar que o Estado está obrigado a mentir.

O Governo está a mentir, portanto.
Não está a mentir. Está a tentar encontrar razões para justificar a sua opção. Como é que se pode determinar que o Estado esteja obrigado a vender uma empresa?

Não havendo dinheiro.
O Estado tem dinheiro. Se há coisa que não podemos afirmar é que não há dinheiro. Fala-se muito do dinheiro que foi injetado na TAP, uma empresa pública. Mas também injetámos 3 mil milhões de euros, dos bolsos de cada um de nós, em ajudas compensatórias às empresas de energia.

Considera normal que se organize uma reunião entre a CEO da TAP, elementos do Governo e do grupo parlamentar do PS na véspera de uma audição no Parlamento?
Não. Isso nem tem comentários. É tão pequenino que nem tem comentários.

Também é uma prova de promiscuidade?
Nem me passava pela cabeça que isto pudesse acontecer. É tão estranho que nem merece comentários. Nem percebo qual foi a vantagem. A não ser que fosse para condicionar e nem quero pensar nisso.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

“PCP é corresponsável pela falta de resposta na Habitação”

Outro tema que está a mobilizar muitos protestos é a habitação. O PCP viabilizou ou ajudou a viabilizar cinco Orçamentos do Estado. Durante sete anos, o Governo pouco fez em matéria de Habitação. O PCP não é corresponsável pela falta de respostas nesta área?
Sim, de certa forma sim. Se quisermos ir por aí, sim. Ainda que o problema de habitação tenha ganhado uma centralidade que não tinha há sete anos.

Os problemas do PCP não são de hoje e o próprio PCP reconhece isso.
Sim, não são de agora, nem são de hoje. Mas ganharam uma centralidade porque surgem com uma tempestade perfeita, associados ao aumento das taxas de juro e a toda a especulação imobiliária. Agora, isso não quer dizer que há sete anos não houvesse problemas.

Mas o PCP não se apercebeu da gravidade do problema.
Não só se apercebeu como fez um conjunto de propostas. Mas nós não determinávamos e não determinámos [as opções de fundo do Governo].

Disse-nos que não era um problema central.
Não tinha a dimensão que tem hoje e que se vai pôr a médio e longo prazo. É preciso intervir hoje e no concreto. Há sete anos não tínhamos o problema das taxas de juro, eram negativas. Hoje temos e é preciso dar uma resposta concreta. Propusemos que se pudesse definir uma moratória, exatamente nos mesmos termos que foram usados durante a epidemia. O Governo acha que não, que não tem cabimento. Propusemos outra coisa: temos um banco público; a Caixa Geral de Depósitos podia fixar como spread máximos nos contratos exigentes 0,25%. Isso contaminava o mercado pela positiva. Mas não houve um acordo.

"O Governo está a tentar encontrar razões para justificar a sua opção de privatizar a TAP. Como é que se pode determinar que o Estado esteja obrigado a vender uma empresa? O Estado tem dinheiro. Se há coisa que não podemos afirmar é que não há dinheiro. Fala-se muito do dinheiro que foi injetado na TAP, uma empresa pública. Mas também injetámos 3 mil milhões de euros, dos bolsos de cada um de nós, em ajudas compensatórias às empresas de energia"

“Aumentos na Função Pública não dão nem para o café”

Fernando Medina garantiu que, se a situação económica piorar, o Governo vai dar mais apoios e permitir um défice mais alto. Acredita na palavra do ministro das Finanças?
O que acredito é que o país não precisa de apoios. Para quem os recebe são bem vindos. Quem recebe fica contente e é sempre positivo. Mas são sempre pontuais. As contas não se pagam de três em três meses. Pagam-se todos meses.

Há uma lógica assistencialista.
O país precisava, e há recursos, meios e capacidade para isso, é que haja um aumento generalizado dos salários e das pensões. Só isso é que dá capacidade de desenvolver a própria economia. Tudo o que sejam apoios pontuais, mantendo esta política dos baixos salários, não resolvem problema nenhum.

O Governo está agora a querer avançar com mais aumentos na Função Pública. Não chega? É cosmética?
No seguimento de uma luta muito determinada dos trabalhadores, o Governo foi obrigado a vir a jogo. Encontrou uma saída, os tais 70 cêntimos por dia. Cada um faça as suas contas. Foi obrigado a tomar uma medida, sem nenhuma vontade, mas que está muito longe de corresponder às necessidades. Nem dá para o café.

O PCP propõe a fixação de preços nos bens essenciais. Com isso ignora todos os avisos do PS e do governo sobre os riscos de passar a haver escassez de bens, por exemplo?
Há sempre fantasmas. Mas há uma coisa que sabemos: há um aumento brutal nos bens essenciais da chamada “marca branca” muito acima dos bens das próprias marcas. E essa questão fundamental que temos de enfrentar que é a especulação em torno do aumento dos preços. Esses fantasmas de que não vai haver material nas prateleiras, contraponho com os outros: de que é que vale haver muito material nas prateleiras, quando não há capacidade de os poder comprar. Não propusemos, nem propomos que todos os preços estejam tabelados. O Governo conseguiu chegar a um cabaz alimentar; dessa mesma forma, porque é que não se faz a fixação de preços para esses mesmos bens?

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

“Governo está a estrangular o SNS”

Disse-nos há pouco que o PCP está na rua, à porta dos centros de saúde. Presumimos que estejam também à frente dos hospitais. A PPP de Loures acabou há pouco mais de um ano. Acha que o hospital está a funcionar melhor com uma gestão pública?
Não sou utente do Hospital de Loures.

Quando ouvimos os profissionais de Loures, nomeadamente os chefes de equipa do serviço de urgência que se demitiram há pouco tempo, o que eles dizem é que o hospital vive os piores momentos da sua história.
Não tenho nenhum dado que possa contrapor com essa afirmação. Há uma coisa que posso dizer com algum conhecimento de causa: dos relatos que conheço da experiência em Braga [ex-PPP], mais ou menos comparável, vão exatamente no sentido contrário. Mas há uma questão de fundo. No nosso entender, o Estado não só não se pode demitir como tem de ter um papel determinante em tudo o que é a garantia do acesso à saúde. O Estado, a partir da ação do Governo, está a ter um caminho exatamente inverso. Não são as reversões das PPP que mascaram este caminho que está a ser trilhado pelo Governo, que é de desresponsabilização, de estrangulamento e de desvalorização completa dos profissionais.

Não há um problema com a gestão pública dos hospitais? São os próprios médicos e administradores que o dizem.
O facto de ser gestão pública não garante, por si só, uma boa gestão. Não há dúvida nenhuma, isso é uma evidência. Para haver uma gestão é preciso gestores e o que gerir.

Há pouco, a propósito da CP, responsabilizava o Ministério das Finanças. Fernando Medina também é o responsável pelos problemas na Saúde?
Tudo está dependente da assinatura do ministro das Finanças.

Mas sabendo isso, os utentes do hospital de Loures não estariam melhor com um hospital da esfera pública mas com gestão privada, que escapa a esse garrote das Finanças?
A questão é mais ampla. Se estivéssemos a falar dos utentes de Loures, podíamos estar aqui muito tempo. O problema é que temos 1,6 milhões de pessoas sem médico de família. Temos urgências a fechar porque não há médicos, porque não há investimento. Esse é que é o problema do SNS.

"O país não precisa de apoios. Para quem os recebe são bem vindos. Mas são sempre pontuais. As contas não se pagam de três em três meses. Pagam-se todos meses. O país precisava de um aumento generalizado dos salários e das pensões. Só isso é que dá capacidade de desenvolver a própria economia. Tudo o que sejam apoios pontuais, mantendo esta política dos baixos salários, não resolvem problema nenhum"

“Marcelo tem marcado um calendário para o Governo”

Em janeiro, dizia que “ou o Governo cedia ou tinha de sair”, mas afastava o cenário de eleições antecipadas. Continua a defender a manutenção do Governo? Se o PS tiver um resultado muito negativo o Presidente da República deve avançar para a dissolução?
O Presidente não tem deixado muitas dúvidas nos alertas que tem feito. Podemos acusá-lo de tudo menos de não falar. Se há coisa que tem feito é falar.

Então essa intenção é dissolver no próximo ano se as coisas não correrem bem.
Estou a dizer que esse é um poder que só está nas mãos do Presidente. Se há coisa que ele tem feito é alertar, alertas muito diversos, e até marcado um certo calendário. Para nós, a questão não é se há eleições: o problema não é este ou aquele Governo, ou ministro…

Pelo PCP, o Governo fica até ao fim.
Pelo PCP o que é preciso é que o Governo com maioria absoluta, tendo os instrumentos todos na mão, ou deveria tê-los, dê resposta aos problemas das pessoas na Saúde, salários, pensões…

Mas se não dá…
Então vai ter como desfecho final necessariamente uma derrota. As pessoas deixam de confiar no Governo.

“É difícil acreditar que Pedro Nuno esteja disponível para alternativa”

Em janeiro, em entrevista ao DN, admitiu a possibilidade de reeditar uma solução idêntica à da geringonça ou até integrar um Governo do PS. Como é que o PCP explica que, fazendo tantas críticas ao PS – o tal partido que dizem “não descolar da política de direita” e convergir com PSD, CDS, IL e Chega –, esteja disposto a integrar um Governo do PS?
O que dizemos é que o Governo, por opção própria, tem um caminho errado. E nas questões de fundo um caminho acompanhado por esses protagonistas.

Espera que o PS mude para integrar um Governo socialista?
Apresentamo-nos como alternativa, com uma política patriótica e de esquerda. Para essa alternativa contamos com todos os que estejam disponíveis. Haverá muitos socialistas…

Pedro Nuno Santos?
Haverá muitos socialistas — não vou individualizar — que eventualmente estarão disponíveis e são bem vindos à concretização dessa alternativa.

Pedro Nuno Santos tem esse perfil?
Tendo em conta a forma como se envolveu e concretizou esta linha política do Governo, é difícil acreditar que esteja disponível para isso. Mas a vida dá muitas voltas.

“Levámos porrada de todo o lado na questão da Ucrânia”

Na sua primeira entrevista como secretário-geral do PCP, fez uma declaração que parecia matizar a posição do PCP sobre a Ucrânia. Falava de uma “ação militar condenável” e dizia que a intervenção russa não podia ser “menosprezada, nem relativizada”. Mas, da última reunião do Comité Central do PCP saiu um documento onde se diz que “premente que os EUA, a NATO e a UE” cessem de “instigar e alimentar a guerra na Ucrânia”, sem referência à Rússia. O partido tem duas caras ou o Paulo Raimundo está em minoria no partido?
Essa pergunta é muito confortável para nós. Porque a desvantagem da nossa posição sobre a guerra na Ucrânia é a que todos conhecemos: levámos porrada de todo o lado, muitas vezes discutindo afirmações que não eram nossas. Mas passado este tempo é muito evidente a nossa posição e a sua justeza. Nós condenámos a intervenção militar russa.

Mas o que diz é um bocadinho diferente do que o PCP escreve.
Não é nada. Pode é haver estilos diferentes.

A condenação da Rússia não está referida aqui.
Não está nesse comunicado, mas está descrito nas posições oficiais. Não precisamos de estar sempre a escrever tudo. Condenámos a intervenção russa no dia, até porque representava escalada militar perigosíssima, como se está a revelar. Chamámos a atenção para duas coisas: a guerra começou em 2014 e os protagonistas daquela guerra não se limitam à Rússia e à Ucrânia. A questão que se coloca hoje é quais são os caminhos que se trilham para a paz.

Então não há uma divergência de fundo com o Comité Central do PCP; só de estilos, como disse.
Nem de fundo, nem aparente, nem próxima.

Estilos diferentes.
Se eu tivesse de soletrar o comunicado todo não conseguiria… Tenho de me exprimir da forma como consigo.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

[Já saiu: pode ouvir aqui o quinto episódio da série em podcast “O Sargento na Cela 7”. E ouça aqui o primeiro episódio, aqui o segundo episódio, aqui o terceiro episódio e aqui o quarto episódio. É a história de António Lobato, o português que mais tempo esteve preso na guerra em África.]

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