Estamos no período de férias, habitualmente usado para acalmar frenesins e recuperar energias. Viajamos, expomo-nos a experiências diferentes e reabastecemos o repositório criativo. Na rentrée emergem ideias, surgem insights para novos projetos que entram no ciclo de planeamento. Mas este ano a Covid-19 trocou as voltas ao mundo e as férias serão diferentes no formato, mas sobretudo na essência – o descanso. Será um descanso em alerta, porque o vírus não tira férias e porque sabemos que a rentrée será marcada pela incerteza e pela complexidade dos desafios. Iremos precisar de toda a nossa capacidade criativa para imaginar novas soluções em todos os setores e também na saúde.

No SNS muitos profissionais não vão conseguir tirar as merecidas férias. Há que continuar a dar resposta a surtos localizados do vírus, mas também a recuperar os casos de outras patologias que ficaram “suspensos”. Ao mesmo tempo, é preciso preparar a resposta a novos surtos Covid e não só. Desde março que estamos em resposta reativa, maioritariamente com a tomada de medidas de reação imediata, aparentemente avulsas, que vão acompanhando o conhecimento sobre o comportamento do vírus. Agora é preciso ter uma resposta proativa, planeada e integrada, com base no que se aprendeu e nas experiências que resultaram, mas também arriscando em novos modelos de resposta que vão ao encontro das necessidades das populações.

A crise permitiu experimentar alguns modelos que estavam embrionários. Por exemplo, o modelo de hospitalização domiciliária ganhou expressão. Ainda, seguramente, com muito para melhorar, mas a realidade é que se conseguiu assegurar, até junho deste ano, que cerca de 92% dos doentes Covid estivessem a ser tratados em casa. Só foi possível porque havia uma motivação forte – manter as pessoas em segurança, tratá-las e não deixar colapsar o SNS.  Conseguiu-se com alinhamentos institucionais, com o envolvimento de todas as profissões de saúde, famílias e cuidadores e, sobretudo, com a resposta dos doentes, que, no geral, estiveram no comando da sua doença com uma atitude responsável.

If the patient could decide, foi o nome dado a um projeto realizado num outro tempo e numa outra geografia. Em 2013, o Hospital Universitário de Oslo precisava de reduzir significativamente o tempo de espera no diagnóstico do cancro da mama. Usando a metodologia de Design Thinking, conseguiu-se desenhar uma solução, trazendo a perspetiva dos doentes e de todos os profissionais envolvidos no processo. Implicou repensar a forma como as entidades se articulavam e exigiu um trabalho interdisciplinar colaborativo.

Qual o denominador comum nestas duas experiências? Um objetivo claro, uma motivação forte de todos os envolvidos para resolverem o problema da doença com a participação do doente. A grandeza da missão facilita a conjugação de vontades, mas uma vez alcançada uma meta, há uma tendência para voltar ao modelo passado. O desafio agora é manter os modelos novos ativos e ir aperfeiçoando e disseminando as inovações. Quantas boas soluções foram implementadas durante o período da Covid e ficaram circunscritas a um serviço de um Hospital ou de um Centro de Saúde? Quantas destas soluções estão a ser agora abandonadas, apenas porque se assume que não faz sentido trazê-las para o retorno à “normalidade”?

Cabe aos líderes, aos profissionais, mas também a nós como cidadãos, dar o nosso contributo com sugestões e feedbacks responsáveis, e dar estímulo para que não se deixem morrer os projetos na gaveta da indiferença, simplesmente porque já não se acredita na possibilidade de mudar, ou porque não há perseverança para defender e demonstrar aquilo em que se acredita.

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