O nosso País parece uma comédia no que toca à Educação e à promoção da igualdade de circunstâncias. Poder-se-ia incluir outras “peças teatrais”, mas vamos começar por este tema tão fundamental na sociedade. Se por um lado, Bolonha serviu para nos equiparar ao sistema de ensino europeu, por outro financiou instituições públicas e privadas (as propinas de um mestrado são substancialmente mais elevadas que as de uma licenciatura), e aumentou o fosso gigantesco entre portugueses que terminaram a sua educação superior, antes ou depois de 2006.

No caso de Bolonha, foram desde o início deste processo feitas pela sociedade civil várias reflexões, de forma a colmatar-se efeitos prejudiciais que antecipadamente eram já visíveis mas sem qualquer resultado prático. Sabemos que o Ensino em Portugal é um sector no qual os maus resultados contrastam directamente com os elevados gastos que se têm efectuado.

Vamos aos exemplos: um indivíduo de 42 anos, com uma licenciatura de 5 anos e uma pós-graduação e um vasto curriculum de duas décadas. Um outro indivíduo, com 23 anos, possui uma licenciatura de 3 anos e um mestrado de dois anos. Não tem (ainda) curriculum profissional.

Ambos concorrem num processo de recrutamento financiado pelo Estado Português através de um dos seus ministérios, que por sua vez atribui fundos a fundações, e são ambos aceites.

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O tal indivíduo de 42 anos é “classificado” com o nível de qualificação 6 (licenciatura) e vai auferir um salário bruto mensal estipulado em portaria de 1613,40€, enquanto o indivíduo de 23 anos é “classificado” com o nível 7 (mestrado) e vai auferir um rendimento ilíquido, também estipulado por portaria, de 2025,35€.

Respiremos fundo, e voltemos a Bolonha. Entre 1996 e 2006, em Portugal, 337.269 pessoas concluíram a sua licenciatura. Em Fevereiro de 2018 houve uma proposta do governo liderada pelo então ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor e a questão de Bolonha, na voz do próprio, entrou em discussão pública. Estas questões das “discussões públicas” são interessantes porque na sua generalidade, ouvem-se eminencias ligadas ao Governo e ignora-se aqueles que em 2018 já eram atingidos por esta discriminação salarial (Ministro diz que equiparação de licenciaturas pré-Bolonha a mestrados não era uma proposta do Governo – Observador).

O Quadro Nacional de Qualificações – QNQ – (portaria nº 782/2009 de 23 de julho) entrou em vigor a 1 de outubro de 2010 e divide-se em 8 níveis, sendo os últimos destinados a licenciatura, mestrado e doutoramento. É com base neste quadro que são estipuladas as faixas salariais e as bolsas (do IEFP ou da FCT, por exemplo) pelo que, um cidadão que tenha uma licenciatura de 5 anos na melhor universidade do País e com a mais alta qualificação permitida, não poderá ver o seu esforço académico reconhecido, com equidade.

Por outro lado, e aqui estamos no auge da gargalhada, não deixa de ser interessante observar que o Governo permita que estes portugueses com licenciaturas pré-bolonha, que concorrem em desigualdade com os jovens mestres, possam dar aulas para colmatar a tradicional falta de professores nas escolas. (palmas, por favor!)

No meio de uma crise escolar, com turmas sem professores desde o início do ano lectivo, o Governo conseguiu lembrar-se que estes cidadãos de licenciaturas pré-bolonha possam estar certamente bem preparados (pela experiência profissional, pela idade, pela maturidade, …) para leccionar. Mas, já para efeitos salariais ou como bolseiros ou estagiários, voltam a ficar esquecidos numa gaveta.