Escrevo hoje sobre como podemos e, na minha opinião, devemos, seguir o exemplo de quem faz melhor que nós.

Ao longo de décadas habituámo-nos à má gestão do património público, ao desperdício dos poucos recursos naturais que temos e à péssima gestão de empresas estatais ou com participação do Estado. Numa altura em que discutimos a transição energética e as nossas reservas de lítio, são os atrasos consecutivos dos projectos, as perdas de oportunidade, o nepotismo constante e a corrupção que nos fazem desacreditar numa gestão pública de organizações e alimentam o cépticismo, em especial dos liberais, onde me incluo.

O problema não é necessariamente o Estado, é este Estado, o seu peso e a sua inaptidão. É a falta de regulamentação, de estratégia e a navegação à vista.

Então e se adoptássemos uma estratégia diferente? Antes que o leitor divague em como Portugal não é a Noruega e entremos na eterna discussão de que é melhor ser pobre e ter sol do que rico e ter os invernos Noruegueses, farei uma rápida abordagem a este país nórdico e em especial a maneira como se organizaram na gestão dos seus recursos naturais.

Esquecemo-nos com frequência de que a Noruega pré industrial era um país bastante mais pobre e irrelevante do que Portugal. Sendo um país com alguns recursos naturais, a industrialização do país começou com a exploração de madeira ao qual se seguiu a exploração e produção de alumínio.

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Mais importante que isso, foi a estratégia aplicada na produção de energia hidroeléctrica, recurso muito relevante para o futuro deste país. Em vez da nacionalização – que parece ser a única coisa que Portugal consegue pensar – a Noruega optou precocemente pela abertura ao mercado. Estabeleceram regras apertadas à entrada e à operação de empresas estrangeiras, podendo o Estado Norueguês adoptar um papel regulador e fiscalizador da actividade enquanto mantinha uma percentagem do negócio.

Este método, associado a contractos mais longos, baixa corrupção, controlo do nepotismo, democracia plena e promoção da industrialização, permitiram ao Estado Norueguês assegurar, a longo prazo, o seu investimento nos equipamentos necessários à exploração dos aquíferos e o know how necessário para o fazer.

Chegados aos anos 50 do século passado, a Noruega não tinha ainda descoberto crude, actualmente o seu maior activo. Quando tal aconteceu, ninguém no país tinha capacidade ou experiência para explorar este recurso, estando muito aquém do nível dos ingleses ou americanos.

O método escolhido pelos Noruegueses tratou-se no fundo de uma replicação do modelo utilizado para a exploração dos recursos hídricos, optando por uma joint-venture entre o Estado Norueguês e as empresas estrangeiras. O Estado deu concessões e licenças a empresas estrangeiras para explorar o crude da mesma maneira que fez com as centrais hidroeléctricas. Numa abordagem muito pragmática e de longo prazo, este método permitiu aos noruegueses ganharem a experiência que não tinham na extracção dos recursos naturais, ao mesmo tempo que, num percentual inferior, o Estado foi sempre ganhando dinheiro com a exportação do crude, através da sua pequena percentagem.

Findo o período da concessão, o Estado norueguês estava capaz de assumir a exploração e de ficar com a totalidade do retorno monetário. A grande questão era agora: como garantir que este dinheiro chega ao povo? Porque não se transformou a Noruega num petro-estado autocrático como tantos outros neste mundo? Dos 25 petro-estados do mundo, só há 2 democráticos, a Indonésia e a Noruega, sendo que apenas no último a democracia é total.

Por esta altura, surge aquilo que considero uma enorme lição para o nosso país, pois a verdade é que o futuro tudo tem a ver com os sistemas políticos em vigor, a estratégia de longo termo, a geografia e a história.

O Estado norueguês optou pela criação de um fundo soberano para onde seriam canalizadas as receitas da exploração dos recursos. A ideia da propriedade comunal dos recursos já vinha do tempo da exploração de madeira e do desenvolvimento hidroeléctrico do país e foi assim actualizada para este momento.

O fundo soberano da Noruega tem regras apertadas sendo aquela que considero mais interessante, o facto de cada governo estar impossibilitado de gastar imediatamente mais do que 3% do retorno anual. Deste modo, o dinheiro é investido na população mas não tem benefícios políticos especiais para quem está no governo, nem alimenta demasiado casos de corrupção ou nepotismo, garantindo a independência política e o baixo nível de desigualdade. As instituições democráticas plenas fazem o resto.

Paralelamente, este fundo soberano pode assim “engordar” e investir noutros sectores e noutros mercados, diversificando o investimento. Do petro-estado que podia ser, a Noruega é hoje um estado investidor global nos mais variados sectores e mercados, minimizando assim o impacto político e garantindo o futuro das próximas gerações, tudo de uma assentada.

Numa altura em que tanto se discute a gestão da TAP e de outras empresas públicas ou a exploração de lítio, Portugal tem de aprender que negócios com privados não são por definição maus, assim como negócios em que o Estado esteja envolvido também não o são. Em negócios, tudo depende da boa gestão e organização que se faz dos mesmos. É fundamentalmente importante entender que não podemos continuar a fazer tudo como sempre fizemos, sob pena de quem insiste no erro, estar condenado ao mesmo resultado final: fracasso, despesismo, nepotismo e ausência de prosperidade ou melhoria de qualidade de vida do povo português.

Não é por termos bom tempo que temos de ser maus gestores ou ter uma cultura apenas de pensamento dia a dia. Não é por termos boa comida que temos de ser incompetentes na gestão. O que temos de fazer, é uma autoanálise, entender o quão latinos (aqui, em sentido pejorativo na medida em que tendemos a associar os países nórdicos a maior competência) somos nestas questões, e criar mecanismos que nos defendam da nossa realidade.

A exploração dos recursos naturais e geográficos nacionais pode e deve ser uma realidade seja o lítio, as nossas florestas, os nossos portos atlânticos, a nossa ligação com o continente Africano, o mar ou até a TAP e outras empresas públicas. O que não podemos é continuar a fazer tudo da mesma forma.