Procurei divulgar há cerca de três semanas junto da impressa escrita, fórum de médicos e contactos pessoais, uma carta aberta com preocupações éticas que tenho com o modo como se escolheu gerir a pandemia e que tive oportunidade também de enviar ao Presidente da República e DGS. Longa e densa (e, portanto, com noção de ser pouco acessível para o público geral) constato com tristeza que não consegui chegar a quem de direito, que era o meu principal desejo.

Pretendi com esta carta denunciar o que me parece ser uma fraude do Estado para com os seus seus cidadãos: o de impor (não raras vezes pela força) medidas políticas, com pretextos que se diz serem científicos, mas que de científicos nada têm, e que espero humildemente ter conseguido desmascarar ao longo do texto.

Volto hoje a este assunto motivado pelo último relatório de Monitorização das Linhas Vermelhas do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA) de 18/02/2022 e que tenho acompanhado desde então, pelos números que apresenta, mas sobretudo pelos números que decide não apresentar e cujos gráficos (figuras 10 e 11 do relatório) deixo aqui para quem os quiser consultar.

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Com efeito, desde que consulto este relatório que vejo as taxas de letalidade e hospitalização por faixa etária e fico perplexo por ver que o único facto valorizado pelo seus relatores e reverberado pela imprensa seja o de que os “cidadãos com um esquema vacinal completo tiveram um risco de internamento duas a sete vezes menor do que os cidadãos não vacinados” e um “risco de morte duas a seis vezes menor” porque há dois outros factos que entram pelos olhos adentro: i) a mortalidade e taxa de hospitalização caem a pique com o decréscimo da idade, ao ponto de se tornarem irrisórias ou mesmo nulas as diferenças entre vacinados com esquema normal e com dose de reforço na faixa etária dos 50-59 anos (e com valores absolutos muitíssimo baixos); e ii) o relatório omite, sem qualquer explicação, a informação relativa a toda a população abaixo dos 50 anos. A pergunta que me queima os lábios desde então é: porquê?

Não tenho conseguido, por muitas voltas que dê, encontrar uma explicação racional. Após alguma raiva inicial, tentei encontrar uma explicação que preserve a boa-fé de quem o escreveu e que ainda acredito existir, mas que (digo-o com mágoa e sem qualquer ódio ou sarcasmo) também acredito estar deformada. A impressão que dá a quem lê estes gráficos é a de haver uma tentativa propositada de esconder dados que mostrariam a total inutilidade das vacinas (sobretudo dose de reforço) na prevenção de doença grave para estas faixas etárias mais jovens. A crença na sua utilidade e eventual efeito de imunidade de grupo é, porém, tão grande (apesar de toda a evidência contrária) que o fazem com a sensação de um dever. Mas, meus senhores, se me estiverem a ler, é uma deformação da verdade e uma manipulação das pessoas. E, quando se trata de pessoas, os fins não justificam os meios.

Foi, aliás, sempre esse o problema (muito mais ético que científico). Porque, se algumas medidas já seriam de si, eticamente questionáveis, assim como o foram, desonesta e deslealmente apresentadas pelo Estado, são inaceitáveis numa sociedade fundada na Dignidade da Pessoa Humana. A Pessoa Humana, que devia estar no centro e ser o principal destinatário de toda a política (e das políticas), foi coisificada e infantilizada. Em vez de se escolher uma comunicação transparente e adulta, que apostasse no exercício da liberdade com responsabilidade, escolheu-se criar “incentivos” e restrições para levar os cidadãos a fazer o que se quer. Mas as pessoas não são coisas e não podem certamente também ser tratadas quase como burros a quem se põe a cenoura à frente para andar, por muito válida que pudesse ser a intenção inicial que a motivava.

Essa intenção, por sua vez, foi também ela deformada quase desde o início. Os estados e as respectivas autoridades são também eles governados por pessoas, certamente bem-intencionadas no seu âmago, mas que baquearam sob o peso do mediatismo e da pressão causados pelo próprio medo que infundiram na opinião pública e que só julga o que vê à frente. E a única realidade que lhe puseram à frente foi COVID-19. Mas há tantas e tantas dimensões da vida…. Absolutizou-se então a saúde do corpo sem cuidar de dar vida a esses corpos que se pretenderam salvar. E assim, tantos e tantas sofreram inutilmente às mãos de medidas cegas que tomaram como único propósito colectivo reduzir COVID-19, custasse o que custasse. E custou demasiado. A procura do bem comum foi secundarizada e a nossa vida em comunidade ficou mais pobre e desumanizada.

Ainda vamos a tempo. Vamos sempre a tempo. Começaram a aliviar-se medidas, mas há tantas ainda absurdas que se mantém (como as máscaras nas escolas por exemplo) para além de eu temer não se ter aprendido a lição para o futuro que pode vir. Por isso, se alguém com responsabilidade e poder me estiver a ler, recuperemos a nossa humanidade perdida e acabe-se com esta insanidade colectiva. Por favor.