Em 2022, a velocidade de adoção tecnológica está a influenciar todas as indústrias e a indústria farmacêutica não é uma exceção. Enquanto as empresas farmacêuticas têm feito alterações incrementais ao próprio modelo operacional durante os últimos anos, a pandemia veio intensificar várias tendências no mercado que realçaram a necessidade de transformação mais rápida. Tanto os profissionais de saúde como os pacientes exigem suporte e capacidade de resposta em tempo real, assim como soluções personalizadas, para uma tomada de decisão mais rápida e precisa.

O novo modelo a ser repensado pela indústria farmacêutica deverá ter como objetivo servir melhor os pacientes, envolver mais os funcionários e responder à concorrência. Cada empresa irá ter as suas prioridades, seja na melhoria de proposta de valor e investimento em áreas específicas (dados, tecnologia ou serviços), ou na melhoria de estratégia de acesso e resposta ao mercado. Todos estes esforços exigem aproveitar tecnologias digitais existentes, os dados e a análise dos mesmos para aumentar as capacidades das empresas e resposta ao dinamismo do mercado. No geral, é necessário olhar para todo o modelo de modo holístico, integrando fatores humanos e tecnológicos. Só assim será possível demolir silos institucionais, acelerar a tomada de decisão, melhorar a agilidade, eficiência e alocação de recursos.

Mas como poderá a indústria farmacêutica servir melhor os pacientes? A utilização de soluções digitais permite aprofundar o conhecimento das jornadas dos pacientes e as preferências dos consumidores, promovendo uma tomada de decisão baseada em dados, assim como a personalização da experiência e até mesmo a antecipação de necessidades. As empresas farmacêuticas têm também a possibilidade de tornar os médicos especialistas mais próximos e acessíveis aos pacientes A estratégia ou provisão de serviços para além do fármaco dá ênfase a novas iniciativas baseadas em tecnologia, acoplando soluções de saúde digital com a administração do fármaco, de que são exemplo os programas de apoio ao paciente. Estas são soluções não clínicas, que podem melhorar os resultados terapêuticos do paciente e beneficiar todo o sistema de saúde. As empresas deverão pensar criticamente em estratégias para envolver os consumidores, como é o caso da inclusão de pacientes no conselho de administração, os quais têm experiência com os produtos da empresa em primeira mão e poderão comunicar as necessidades diretamente. Só com a ajuda dos pacientes será possível criar um sistema de saúde focado no futuro.

De modo a que estas iniciativas sejam possíveis, é necessário envolver mais os funcionários e capacitá-los em análise de dados, assim como em novas práticas de desenvolvimento de negócio. Aqui o objetivo é aumentar os recursos digitais, atrair mais talento com base tecnológica, assim como de outras indústrias, e praticar um modelo de marketing ‘pull’ em vez do ‘push’ praticado até então. Há, portanto, uma necessidade em redesenhar a gestão de desempenho para recompensar o empreendedorismo quando interagindo com os intervenientes, assim como descentralizar a tomada de decisão dando aos funcionários mais dados e informação para uma tomada de decisão mais rápida. Estes passos permitirão implementar formas ágeis de trabalhar para acelerar ensaios clínicos, lançamentos de produto e desenvolvimento de conteúdo. É por esta razão que as empresas se têm reorganizado internamente, deixando o modelo hierárquico até então praticado e adoptando uma estrutura organizacional mais plana e flexível, precisamente para alcançar agilidade, descentralização de tomada de decisão, criando equipas multifuncionais para a diversidade de conhecimento e experiência.

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O objetivo será uma parceria mais próxima entre a indústria farmacêutica e os restantes intervenientes, colaborando continuamente para ajudar os pacientes a alcançarem melhores resultados a um custo cada vez menor, contribuindo para um sistema de saúde mais sustentável. Mas também, para juntos encontrarem os modelos mais eficazes para os desafios atuais e futuros. A única maneira de a transformação da indústria farmacêutica ter sucesso será olhar para fora e entender as necessidades das muitas organizações, grupos e indivíduos com os quais trabalha. A colaboração entre empresas de saúde digital diversas e empresas farmacêuticas deixa ao alcance uma série de oportunidades, caso contrário inalcançáveis. Apenas através de colaboração poderão as empresas farmacêuticas integrar as perspectivas dos vários intervenientes no próprio modelo operacional, garantindo uma melhor adaptação aos desafios da era digital.

Maria Raimundo, 31 anos, é Engenheira Biomédica tendo focado a sua carreira em Saúde Digital. Trabalha atualmente na Beta-i, consultora de inovação colaborativa, como Industry Lead do setor de Saúde, promovendo implementação de soluções de Saúde Digital inovadoras em todo o ecossistema. Para além disso, a Maria contribuiu para o grupo de trabalho do projeto Moving Genomics to the Clinic, do World Economic Forum. E é certificada por Harvard Medical School em Transformação Digital em Saúde. Os seus interesses em saúde digital, medicina personalizada e inovação levaram-na às Nações Unidas e ao MIT, para além de experiências profissionais em startups. Juntou-se aos Global Shapers Lisbon Hub no final de 2019.

O Observador associa-se ao Global Shapers Lisbon, comunidade do Fórum Económico Mundial, para, semanalmente, discutir um tópico relevante da política nacional visto pelos olhos de um destes jovens líderes da sociedade portuguesa.  O artigo representa a opinião pessoal do autor, enquadrada nos valores da Comunidade dos Global Shapers, ainda que de forma não vinculativa.