Ser-se patriota não é o mesmo que ser-se nacionalista. O primeiro termo representa uma versão moderada do segundo.

É sabido que o conceito de estado-nação surgiu nos séculos XIX e XX, numa altura em que muitos países substituíram a ligação pessoal a um rei por um conceito abstrato de nação. O caso português talvez faça exceção a essa regra, mas esse tema excede o âmbito destas linhas.

Podemos considerar a Tarifa Smoot-Hawley de 1930, nos EUA – que levou a tarifas retaliatórias de outros países, num efeito dominó de protecionismo, exacerbando o colapso do comércio internacional e piorando a Grande Depressão de então – como resultado do nacionalismo isolacionista. Um pouco a linha mercantilista que tentou seguir Donald Trump aquando da sua recente presidência.

O nacionalismo imperialista de Putin levou aquele ditador russo a invadir um estado-nação vizinho, a Ucrânia. O mesmo nacionalismo imperialista é visível no comportamento da China do ditador Xi Jinping em relação à sua vizinhança.

O nacionalismo imperialista espanhol é um pouco mais subtil. Já não nos tentam invadir militarmente (embora, considerando o estado das nossas defesas, atualmente não seria difícil), mas invadem a nossa economia e, o que é mais importante, movem montanhas para diluir a nossa cultura e a nossa História na deles.

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Já aqui referi, noutro artigo, o esforço continuado dos nossos vizinhos peninsulares para apagar o papel singular de Portugal na História Mundial. Temos sido brindados com elucubrações, cada uma mais fantástica que a anterior, sobre o alegado papel castelhano nos descobrimentos, que na realidade foi quase nulo. O que não significa que a monarquia espanhola não tenha tido a sua época dourada, controlando territórios avultosos no continente europeu e na América central e do Norte. Apenas que, no que aos descobrimentos diz respeito, o seu desempenho foi diminuto.

Também o nacionalismo imperialista francês é visível na propaganda que essa república transmite aos seus cidadãos e aos estrangeiros. A França deve hoje a sua continuada existência integralmente à intervenção decisiva de Churchill e Roosevelt durante os tempos da guerra contra o nacional-socialismo alemão e ao diplomata sueco Raoul Nordling, que nessa altura salvou Paris (ver Diplomacy, 2014). Um bom exemplo é o filme Ridicule (1996), que, embora se passe durante o reinado de Luís XVI (1774-92), faz repetidas referências à “Nova França” (presença francesa na América do Norte) que, na realidade, já deixara de existir em 1763. Seria Napoleão a restabelecer o controlo do Louisiana em 1800, para logo depois o vender aos Estados Unidos, em 1803.

Mas não é preciso ser “oito ou oitenta”. Só porque não somos nacionalistas, nós, os portugueses, não temos que ser antinacionalistas ou antipatrióticos. Uma certa dose de patriotismo, de noção dos heróis do nosso passado, dos feitos gloriosos de portugueses que já morreram, só serve para nos fazer procurar a excelência no presente. É a argamassa que nos une. Senão, o que significa viver dentro de um território delimitado por fronteiras (deixemos o espaço Schengen de parte desta conversa) com uma língua, cultura, música, gastronomia, hábitos, costumes, uma Constituição (que precisava de uma revisão, mas não no sentido que os socialistas atualmente desejam), etc. comuns?

Numa espécie de “ato de contrição” constante, a nossa academia sente a necessidade de mostrar a sua “virtude” (leia-se: a sua “diferença” em relação à academia que lecionava ao tempo do professor Salazar – entretanto saneada em 1974-5) mais do que a disseminação da verdade histórica.

Porque é que não reclamamos a província romana da Lusitânia como sendo Portugal? A maioria desta província, e posterior ducado no tempo visigodo, encontrava-se dentro do nosso território. O Papa Dâmaso (305-384) era original da Egitânia (Idanha-a-Velha), que fica na parte da Lusitânia que o reino de Portugal herdou, mas isso não impede os espanhóis de o reivindicarem como sendo espanhol. Porque razão é o arcebispo emérito de Madrid quem se reclama cardeal-presbítero protetor do título de São Lourenço em Dâmaso (basílica em Roma)?

A ideia de Portugal não surgiu isoladamente na cabeça de D. Afonso Henriques (r. 1139-1185) no século XII. A evolução e criação da nossa identidade distinta foi um processo moroso, quiçá milenar. A nossa falta de identidade nacional desde 25 abril 1974 criou um vácuo que está a ser ocupado pelos espanhóis.

Daí que a nossa História interna esteja em crescente processo de “espanholização.” Já não se pode ter uma aula de História de Portugal hoje em dia onde não se diga que esta ou aquela nossa tradição tem origem em Espanha, ou que isto ou aquilo é parecido com (e logo cópia de) o que há no país vizinho. Este fenómeno é também fruto de os fundos comunitários que financiam a investigação serem distribuídos regionalmente, para a Península Ibérica, e de isso promover uma certa promiscuidade com os investigadores do país vizinho.

O assassinato do rei D. Carlos e do seu filho Luís-Filipe, em 1908, e a posterior substituição da nossa monarquia ancestral por um regime regido por revolucionários profissionais, o Bloco de Esquerda que era o Partido Republicano de então – nunca tendo sido este último regime referendado pelos portugueses – também ajudou a alienar-nos da nossa pátria.

Seguiram-se uma sucessão de regimes autoritários que levaram a que acabássemos por ser incapazes de fazer uma descolonização gradual e pacífica, em vez disso entregando o império a movimentos marxistas-leninistas que mergulharam as ex-colónias em guerras civis sangrentas felizmente hoje terminadas.

Talvez tenha sido a grande obra de Franco, restaurar a monarquia espanhola. Quanto a nós, parece que preferimos um comentador de televisão despido que podemos abraçar e com quem podemos tirar fotos como chefe de estado a D. Duarte Pio de Bragança e à sua descendência.