Oitenta e quatro novos livros publicados por dia. Este é o número que conheço, referente ao total de novos títulos em português autopublicados em março de 2023, em Portugal e no Brasil. É também um número que escancara uma nova realidade para o mercado editorial: a independência absoluta dos escritores.

Até há pouco tempo, publicar um livro exigia do autor muito mais do que a já hercúlea habilidade de parir universos inteiros com as próprias mãos: sem oceanos de suor, alguma sorte e uma bela rede de contatos que garantisse os olhos de uma editora sobre o seu original, dificilmente o sucesso lhe bateria à porta.

Hoje, tudo mudou.

Não que as editoras tradicionais estejam a diminuir rumo à extinção: as suas capacidades de curadoria as farão sempre fundamentais para a literatura. Mas num mundo dominado por uma incalculável diversidade de procura, a curadoria editorial tradicional simplesmente não consegue suprir o insaciável apetite do mercado por histórias. Em outras palavras, há mais desejo por livros do que capacidade de produção de livros pelos meios tradicionais.

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Entra em cena, assim, a autopublicação. Com meia dúzia de cliques, todo autor consegue publicar seu livro gratuitamente e colocá-lo à venda em livrarias e marketplaces espalhados pelo mundo, tanto em formato impresso quanto digital. Sem pedir bênçãos, consegue abrir caminho até ao seu leitor. Com absoluto controlo, pode auferir os seus ganhos. Sem perder tempo, exerce a mais nobre das artes da nossa espécie: partilhar as suas histórias.

Tradicionalistas podem derramar as suas críticas sobre a publicação independente, podem dizer que é a veia do editor que garante a qualidade, podem mascarar-se de Velho do Restelo para demonizar a inovação.

Mas os números do mercado impedem qualquer crítica mais preconceituosa de sobreviver à realidade.

Mais de 25% de todos os livros que chegam às lojas em todo o mundo, em formato impresso ou digital, são autopublicados. Em 2022, isso representou 300 milhões de exemplares vendidos, perfazendo um total de € 1,15 bilhão. E, enquanto o mercado editorial deve crescer 1% ao ano nos próximos anos, a fatia representada pela autopublicação deve saltar mais de 17%.

Devemos comemorar estes números. Hoje, mais do que nunca, conseguimos partilhar e ler histórias publicadas nos quatro cantos do mundo, sem limites, sem censura, e no formato que preferirmos.

A autopublicação é mais que uma revolução no mercado editorial: é a garantia de que, se as vozes (e letras) de todos podem ser amplamente ouvidas (e lidas), o futuro tende a ser muito mais democrático (e plural) que em qualquer outro momento da História.