O Covid-19 veio, de facto, alterar muito daquilo que já considerávamos estanque. Numa Europa onde a cadeia alimentar e os próprios produtos nunca foram tão seguros, há inúmeras questões que agora, em imprevisível situação pandémica, se colocam. Assegurarão todas as políticas alimentares europeias, legislação apertada e sistemas de controlo alimentar altamente eficientes um fornecimento de alimentos seguros, autênticos, sustentáveis e saudáveis à população em tempo de pandemia?

O encerramento das fronteiras e limitação de deslocações, bem como a quarentena exigida no caso de trabalhadores infetados vem, naturalmente, reduzir a produção e distribuição de alimentos. Consequentemente, o excedente de produtos frescos acumula-se sem que lhe seja dada vazão, conduzindo a grande desperdício alimentar e drásticos aumentos no preço de bens de primeira necessidade. Não que seja o preço que esteja a impedir as prateleiras de estarem vazias, na verdade; mas já lá vamos.

Paralelamente, é expectável que a prevalência de auditorias, inspeções e operações de monitorização neste grupo sejam reduzidas, o que, certamente, nos deverá trazer algumas preocupações no que diz respeito a segurança e autenticidade alimentar.

Porém, aquilo que mais nos deverá preocupar, enquanto cidadãos, passa por uma das questões mais importantes da insegurança alimentar. Lembremo-nos que, estando as escolas fechadas, também as cantinas o estão. Lembremo-nos que, é neste local, que centenas (se não milhares) de crianças consomem a sua única refeição quente diária. Lembremo-nos que milhares de famílias viram o seu rendimento mensal altamente diminuído. Quantas famílias estarão, neste momento, a passar por reais necessidades?

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Simultaneamente, assistimos a um “panic-buying” completamente destituído de razão e bom senso. Enlatados, produtos com tempo de prateleira mais longo e o papel higiénico (vá-se lá saber porquê!) são limpos rapidamente das prateleiras.

Neste âmbito, acredito ser de extrema importância começarmos por incutir na população o conceito de “compra consciente” – devidamente pensada e necessária – e promover a disseminação de informação clara e transparente, possibilitando uma melhor gestão do sistema alimentar. Por outro lado, não será demais estar vigilante e atento a vizinhos que possam estar a precisar de auxílio: especial atenção à terceira idade que, não sendo propriamente entusiastas das novas tecnologias, na sua grande maioria, e estando em forçado e apavorado isolamento social, poderão ter uma dificuldade acrescida em comunicar com os outros bem como obter alimentos.

Também é fundamental que se olhe para a agricultura como um serviço essencial e que aqui se promovam medidas de segurança; a intervenção governamental poderia ser de extrema importância, adquirindo produtos de pequenos produtores e estabelecendo uma reserva de emergência para alimentar os que mais necessitam, quando comprovado.

O Covid-19 está nos a dar-nos uma oportunidade de evolução – em termos tecnológicos e como seres humanos. Não a vamos desperdiçar, meus senhores.