Tive a sorte de nascer e ter sido criado numa altura em que os dinossauros faziam juz ao seu nome: lagartos terríveis (δεινός – deinos) + (σαῦρος – sauros)! Bichos ancestrais de escamas e dentes temíveis! Povoaram a Terra durante milhões e milhões de anos, para desaparecerem por completo de um dia para o outro. Ou terá sido mesmo assim?Muitos deles adaptaram-se, mudaram tanto que se tornaram irreconhecíveis pelos seus distantes antepassados: mingaram, perderam adereços e apêndices, tornando-se mais competitivos em admiráveis mundos novos. 

Uma outra sorte, foi já ter sobrevivido a vários aparentes fins do mundo: Guerra Fria, Comunismo, o ano 2000, o Bug do Milénio, o ano 2012, etc.  Mas ainda antes de estes olhos conhecerem mundo, já o fim era anunciado desde sabe-se lá quando: a queda de Roma, o ano 666, o ano 1000, a Peste Negra, eclipses do Sol e da Lua, cometas que foram e vieram. Ao que parece, sempre houve pregadores de fim do mundo, que atemorizam tudo e todos e no processo amealham uns cobres. 

O fim dos tempos – a escatologia – sempre esteve no pensamento colectivo das sociedades: o Apocalipse bíblico, o Ragnarok viking, o Frashokereti zoroastriano, entre outros. Aparentemente, a destruição mitológica do presente é uma necessidade, um estranho desejo de rompimento com a ordem das coisas, em troca de uma alvorada onde tudo é melhor.

Hoje, muitos grupos usam os mesmos artifícios apocalípticos, recorrendo a novos argumentos. Dado que o fim do mundo religioso está cada vez mais distante, viraram para a ciência. Ou, vá, para uma versão manipulada da ciência, transformada em artifícios demagógicos, para manter todos em sentido, de costas viradas a problemas tangíveis. Através de gráficos, amostras e exemplos afirmam categoricamente que o fim está próximo! Que todos vamos morrer daqui a nada, de mortes horríveis, dolorosas, penosas, tristes e solitárias. O fim do mundo está aí e a culpa é das alterações climáticas, resultado directo, exclusivo e inequívoco do capitalismo e do Ocidente.   

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O mundo aquece – verdade. Os padrões climatológicos a que nos habituámos estão a alterar-se – verdade. Secas e cheias e outros desastres naturais são cada vez mais fortes e comuns – verdade. 

No entanto, se analisarmos a temperatura da nossa esfera azul ao longo das eras geológicas, concluímos que vivemos numa época fria e que, de certa maneira, há uma regressão à média: um aumento generalizado da temperatura da Terra. O que é preocupante e justificado é a rapidez do aquecimento. 

Escrevo este texto com séria preocupação duma agitação de águas, pela politização das alterações climáticas, como se de o novo apocalipse se tratasse. Algumas figuras de renome internacional incluem nos seus discursos datas definitivas desse fim do mundo. E isso é tão perigoso como as alterações climáticas: divide os povos, incute medo à população, deixa as pessoas mais nervosas, amedrontadas com um inimigo invisível e iminente. 

O homo sapiens tem uma capacidade fenomenal de adaptação e de superação: a espécie adaptou-se a habitats tão díspares, visíveis nos exemplos dos tuaregues ou povos samoiedos. 

Mesmo em cenários dramáticos, a espécie perdurará, mas num contexto que nos é difícil prever. Tão ou mais que as alterações climáticas, existem outras ameaças mais complexas e prementes da nossa extinção: a redução da qualidade e quantidade de espermatozoides, o tempo médio de vida de espécies de mamíferos primatas, a uniformidade genética. 

Certo é que se continuarmos assim, de braços cruzados, sem fazer alterações sistémicas e de raiz, as coisas vão ficar feias para todos. O nosso estilo de vida está seriamente ameaçado.

Tal como os dinossauros grandes que se adaptaram e se transformaram em pássaros mais pequenos e mais coloridos, a espécie humana adaptar-se-á. Um outro homo, noutras condições, duma maneira que somos incapazes de conceber, sobreviverá. E isso deverá ser uma estrela guia, uma bússola para a ideia duma evolução natural, de um quadro dum futuro mais positivo. 

Como espécie, continuaremos. Individualmente, seja de doença, de uma inundação, terramoto, guerra, ou velhice confortável, ninguém cá fica para semente. E, dada a inflação, é melhor, na altura de cada um ir, levar duas moedas debaixo da língua, pois com certeza Caronte vai cobrar mais!