O que motivou a minha réplica ao original do Rodrigo Adão da Fonseca (RAF), não foi defender a honra da IL, que me Deus me guarde de tamanho sarilho. O Rodrigo que critique a IL, bata na IL e até que ele maldiga a IL se estiver para aí inclinado. O convite é extensível obviamente a todos, porque a crítica é fundamental num regime que se quer livre e pluralista. Se vos apetecer, que digam verdades, inverdades e barbaridades sobre a IL.

Não, o que me levou a escrever num português atamancado de três vinténs foi a tese que o RAF apresentou. De forma muito sucinta: a criação de um partido liberal tribalizou a política e iliberalizou os restantes. Ora, a tese é interessante porque é contraintuitiva mas plausível.

Contraintuitiva porque como é que é possível a fundação de um partido liberal, aliás três, se contarmos com o Aliança e o Nós Cidadãos, tornar o panorama político menos liberal? O Bloco de Esquerda não aburguesou o PCP, o Livre não empurrou o PS para a direita e o PAN não tornou os outros partidos anti-ecologistas. Assim, porque é que a vinda da IL, ou de qualquer outro partido liberal, teria reduzido o liberalismo a um cantinho pequenino da Assembleia da República ? A única explicação que consigo encontrar é que a entrada de um novo partido na arena política obriga os já existentes a ajustarem o seu discurso e posicionamento. É por isso que a tese é plausível. Tem pernas para andar, mas será que anda ?

Uma explicação possível para os partidos se terem tornado menos receptivos ao liberalismo foi ter existido um êxodo dos liberais desses partidos para a IL. Ou seja, deixou de haver nos partidos tradicionais porta-estandartes para as bandeiras liberais. Os números apontam para 84 mil militantes no PSD, 81 mil no PS, 50 mil no PCP, 10 mil no BE e o CDS terá cerca de 40 mil. A IL tem cerca de 6 mil, ou seja menos de 3% dos militantes de todos os outros combinados. Dificilmente uma trânsfuga liberal explica que os partidos tradicionais se tenham tornado hostis às ideias liberais.

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Outra possibilidade é, como aponta o RAF, os partidos terem reforçado o seu anti-liberalismo para se demarcarem da IL. Mas se assim é, porque escolheram o anti-liberalismo em vez de oferecerem o seu próprio sabor liberal ? Poderiam ter optado por encurtar o campo de manobra da IL, reclamando também bandeiras liberais. Mas não o fizeram. O PS, o PSD e o CDS não são liberais com tendências socialistas ou conservadoras. São efectivamente socialistas e conservadores. Não que isso em si mesmo seja um problema, é o que mais faltava não poderem existir partidos de todas as cores e feitios. É preferível defender ideias em que realmente acreditam que andarem travestidos com as ideias que, pensam, estão na moda.

Por isso mantenho a afirmação de que o panorama político português até 2015 era muito pouco amigo do liberalismo. Note-se que eu nunca afirmei que o liberalismo português começou com a IL. O RAF contra-argumentou, bem mas ao lado, que era possível encontrar liberais na política activa e apresentou uma lista que só peca por curta. Sem grande dificuldade, poderia ter incluído Mário Soares, o Grupo dos Nove e outros que nos anos quentes da revolução estiveram claramente do lado do pluralismo e da liberdade. E que acreditavam tanto no que defendiam que até patrocinaram a criação do CDS, um partido de direita.

O problema é que, tal como uma andorinha não faz a Primavera, também não são um punhado de liberais no PS, PSD ou CDS que lhes mudam a alma. Ou, utilizando uma metáfora futebolística, o Sporting andou as últimas quatro décadas a formar grandes jogadores mas, com muita pena minha, os títulos são pouquíssimos. Faltou obviamente a infraestrutura nestas quatro décadas para dar suporte à qualidade individual. E na política portuguesa os liberais portugueses, até a IL entrar muito a esforço no espaço mediático, foram uma excepção de qualidade e infelizmente não a regra.

Concluindo, o Rodrigo apresentou uma tese interessante, mas tanto quanto consigo perceber, sem fundamento. Aliás, dificilmente se compreende porque é que o PS, por exemplo, abraçaria o liberalismo, algo que lhe é totalmente estranho. Sim boa parte da esquerda e da direita toleram o pluralismo e algumas liberdades individuais. Mas apenas porque estão regularmente no poder. A qualquer ameaça de que o PS pode deixar o governo, lá vem a cassete do fascismo, do neo-liberalismo, dos interesses do grande capital, etc.

A IL obviamente não é a guardiã do liberalismo, e todos os que se consideram liberais não estão obrigados a pertencer ao mesmo partido. Os outros partidos podem também pegar nas bandeiras liberais, que elas não têm dono. As ideias do liberalismo são como as pombinhas a voar, uma é minha, outra é tua e a outra é de quem a apanhar. Havendo vontade, claro de as apanhar. Eu afirmo que fora a IL, nenhum partido está interessado nisto do liberalismo. O Rodrigo discorda, e acha que o liberalismo nos outros partidos está de saúde e recomenda-se? Seja, os outros partidos que me mostrem estar errado.