Assim como os defesas, que se deparavam com o avançado neerlandês, não conseguiam  evitar que este recebesse na direita, puxasse para dentro e rematasse em arco, também  os partidos democratas deixam a desejar no combate à extrema-direita assim que esta se  senta “ao centro” com eles.

Para quem possa desconhecer Arjen Robben, foi um jogador que esteve no topo do futebol na  grande parte das duas primeiras décadas deste século, tendo passado por clubes icónicos como  Chelsea, Real Madrid e Bayern de Munique. A característica que o diferenciou de todos os outros,  foi a facilidade com que várias vezes por jogo, durante toda a época e ano após ano, pegava na  bola no seu lado direito, enfrentava o adversário, puxava para o centro do campo, rematava  colocado de pé esquerdo e nenhum defesa o conseguia impedir, apesar de saber perfeitamente o  que este ia fazer. Longe de mim querer colar Robben, a qualquer partido extremista, mas  realmente as táticas utilizadas por ele e por estes em muito se assemelham.

A auto-denominação e colagem à extrema-direita tem como único benefício a ideia de ser contra o  sistema e os que governam há anos em quase todos os países. São raríssimas as pessoas que  querem e se assumem como extremistas, apesar de o serem, pelo menos no que toca ao seu  pensamento político. Após este reconhecimento por parte do eleitorado, estes partidos partem  novamente para o sítio onde nasceram, os partidos de centro. Seja para resgatar propostas antigas  e acrescentar-lhes um ponto q.b. autoritário ou para aprovar projetos que não lhes pertencem, de  forma a protegerem-se de eventuais castigos de certos eleitores por não contribuírem para uma  construção efetiva de futuro. Já os partidos democráticos são incapazes, quer de, num ponto de  vista mais estrutural, proteger a imagem pública e a integridade das instituições que caracterizam  um Estado de Direito, como também de, nos casos específicos, preterir as soluções fáceis que  mais os beneficiam, afastando para segundo plano as consequências dessas mesmas decisões.

Os exemplos que temos, mais frequentemente, são de os partidos extremistas serem “acolhidos” por aqueles que, na teoria, pertencem ao seu lado ideológico, apesar de moderados. No entanto,  cada vez mais vemos exceções a essa mesma regra, por puro aproveitamento político. A realidade portuguesa pós-eleitoral (primeiro, legislativa) é bastante sintomática desta mesma situação. A  proximidade dos resultados fizeram com que a coligação vencedora dependa para aprovar  medidas no parlamento ou do partido acabado de sair do governo, após uma maioria absoluta e  que ficou com apenas menos 2 deputados, ou do partido que se diz contra o regime e que quer implementar uma nova república (principalmente com um peso que, para essas ideias tão  contrárias às dos partidos de centro, apenas se pode comparar ao resultado da APU liderado por Álvaro Cunhal em 1983). Esta disposição parlamentar, a partir do momento em que a AD rejeitou  qualquer acordo pós-eleitoral com o Chega, faz com que o PS tenha de pôr de lado algum ressentimento que ainda possa ter pela forma como saiu do poder, mas também que cresça  democraticamente e não use o seu peso essencial para bloquear medidas reconhecidamente  positivas para a sociedade. Desde logo, pela incoerência e futura preocupação que tal opção  transmite: connosco não há solução, a única é recorrerem ao Chega. O que se pede não são  aprovações cegas e sucessivas a tudo o que é apresentado pelos partidos que sustentam o  governo, mas também nunca será aceitável a teimosia e contrassensos que o Partido Socialista  tem demonstrado desde que a legislatura iniciou. Tudo isto, com o Chega ao seu lado. É verdade  que o Chega aprova ou rejeita o que bem entender? Sim. É verdade que o PS é livre de apresentar  os projetos que bem entende? Sim. Sabem o PS e o Chega que em conjunto conseguem governar,  em certa medida, através do parlamento? Com certeza que sim.

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Não deixa, obviamente, de ficar isenta, a AD, da responsabilidade de ir ao encontro de alguns dos  pressupostos que o PS pretende ver cumpridos para aprovar soluções. Apesar de ser sempre o  partido da oposição a ter de fazer mais cedências para com as ideias do Governo democraticamente eleito.

Não deixando escapar a situação pós-eleitoral mais recente (agora, europeia), é sempre  importante alertar para as situações que destroem também os grupos europeus a partir do seu  interior. No S&D ficam na memória os casos dos partidos socialistas eslovacos SMER e HLAS que  se coligaram com os nacionalistas do SNS, do grupo europeu do ID, para formarem governo. E também um caso que vai muito para além de qualquer ideologia, mas muito importante para a  questão da integridade das instituições: o assassinato de uma jornalista, orquestrado por um  empresário com ligações a membros do governo maltês (Partit Laburista), com o intuito de travar investigações que  estavam a ser feitas sobre casos de corrupção. Nem isto travou Joseph Muscat, primeiro-ministro  e líder desse mesmo partido, de discursar num congresso do Partido Socialista Europeu em 2018,  um ano após o assassinato da jornalista. Já do lado do PPE, a legislatura fica claramente marcada  pelo caso do Fidesz, partido húngaro liderado por Victor Órban, que vinha, desde há largos anos,  tendo posições claramente antieuropeias e atentórias de direitos fundamentais, como ficou ainda mais evidente após a invasão da Rússia ao território ucraniano. Em nenhum destes casos, os dois  maiores partidos do Parlamento souberam cortar o mal pela raiz e impedir que os partidos  extremistas se aproveitassem do seu palco para ganharem cada vez mais notoriedade.

A partir da direita para o centro, fica assim Robben, sozinho, como o único que se aproveita, e de quem a maioria se vai para sempre relembrar em sonhos e não em pesadelos.