Hugo Voidt nasceu na pacata aldeia de Pepperstrudel, na Prússia. Desde cedo demonstrou interesse pela realpolitik de Bismarck. Enfant terrible, passava os verões com os seus comparsas do clube de MMA “Os Pintassilgos Teutónicos.”  O  passatempo predilecto desta trupe de rebeldes era beliscar os Lituanos, Polacos e Ciganos que por ali acampavam. Aos 19 anos foi aceite no exigente curso de Metafísica Aplicada, no Politécnico das Ciências Paranormais da cidade de Thordinkler. A sua tese de licenciatura “O fetiche das SS com o Homo Erectus: implicações falocêntricas” foi premiada pela Fundação Angst Schnitzel em 2021. Transcrevo aqui, ipsis verbis, o seu brilhante discurso, proferido no pub local quando aceitou a distinção da dita fundação:

Caríssimas Frauleins e distinctos Herrs, hoje anuncio a minha candidatura à Junta de Freguesia da nossa aldeia. Aproveito este momento solene para Vos apresentar à mais importante proposta do meu programa eleitoral. Proponho a instituição de uma tirania que nos liberte da liberdade. As preferências dos habitantes de Pepperstrudel, 1250 das 1256 almas com quem compartilhamos a nossa existência colectiva, são muito claras, como demonstram as últimas sondagens de forma conclusiva.  Estamos todos fartos das reivindicações LGBTQXYUT do padeiro e da sua prima Brigitte, do insípido pós-modernismo que contaminou o nosso querido cabeleireiro Rupert e das lamentações absurdas e injustas dos três migrantes que varrem as nossas ruas e que apanham diligentemente os morangos da Frau Lebensraum. Se for eleito, expulsá-los-ei da nossa terra sagrada. A comunidade, insiste Hugo, está a ser profundamente dividida pelas mais corrosivas dúvidas e interrogações filosóficas. A nossa modesta polis está a ser dilacerada pelo cosmopolitismo intelectual e a nossa pureza civilizacional está a ser irremediavelmente conspurcada por valores e interesses que nada tem que ver com as nossas tradições. Esta caminhada para o niilismo tem de ser travada a todo o custo.  Acredito que a melhor forma de nos libertarmos das frivolidades que nos afligem é, sem dúvida, uma tirania emancipatória. Depois de Vos subjugar à minha vontade, garanto-Vos que todos vós jamais se preocuparão com questões menores. Só pensarão na liberdade opressiva que perderam. A ausência da liberdade garantirá a primazia da sensatez.  As certezas inabaláveis e reconfortantes do nosso Dasein, implacavelmente corrompidas nos últimos anos, serão reinstituídas a ferro e fogo e sacralizadas por centenas de litros da nossa melhor pilsener. A vossa sujeição libertar-vos-á da espiral infernal de incertezas dolorosas que vos assolam. Libertem-nos da liberdade, este é o meu slogan. O discurso foi aplaudido por todos, excepto pela Fraulein Lebensraum que colocou a seguinte questão: quem é que vai apanhar os meus morangos?  

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