Parece que a uma certa altura da vida, já adultos com estabilidade e conquistas asseguradas, tropeçamos em qualquer coisa inesperada que nos desequilibra. Uma mazela de saúde, quer física ou mental, uma quebra financeira. O confronto com a ameaça, ou mesmo a perda de algo, é assustador. São sustos que provocam tonturas, aguçam a sensação de medo e desamparo.

A vida corre, “normalmente”, com sobressaltos que vão sendo ultrapassados. Sabendo da possibilidade da existência de percalços na infância, adolescência, início da vida adulta, à medida que estes vão sendo pensados e até partilhados em conversas com pessoas próximas, superam-se com mais ou menos dificuldade. Mas acontece, não com todas as pessoas felizmente, a meio da vida, o embate com uma notícia infeliz que traça uma inflexão no curso normal até então. Com o mal dos outros, sentimos compaixão, ficamos tocados e tristes mas quando nos toca a nós, ou aos nossos que são uma espécie de extensão de nós,  é a doer.

Quando de uma consulta de rotina ao médico passam a suceder-se repetições contínuas de despiste de algo que precisa ser confirmado, anseia-se por não confirmar o veredicto pior. Vivem-se momentos de angústia prolongados. Mesmo não sendo a sentença de uma doença terminal (transcende o susto!- outro campo de reflexão), podem ser identificados outros veredictos que obrigam a parar e a alterar a rotina e hábitos. O diagnóstico de uma doença física ou mental impõe novos cuidados. Obriga a parar, aceitar uma nova condição e reintegrar um diferente modus vivendi.

Há um primeiro momento de negação, resistência, zanga e frustração. Surge o medo perante possíveis perdas de capacidades e limitações de liberdade. Não se vêm de imediato soluções, assombrados pelo temor do pior. Só quando se aceita e se consegue adaptar à nova realidade, é que é possível reequilibrar o abalo sentido. Dificilmente se volta ao que se era antes, mas tal não tem de ser necessariamente catastrófico. Não se deixando esmagar pelo susto com S, sobrevivendo às angústias de morte e elaborado o luto do que se perdeu, podem abrir-se novos caminhos e reasseguradas as relações que estiveram presentes e ajudaram a percorrer as fases sucessivas do dito susto.

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Quando alguém perde um trabalho fica sem rede e sem estrutura. O meio de sustento é a base para manter a vida e quando tal acontece, é impossível não sentir que o mundo caiu. Uma pessoa de 40/ 50 anos não encontra tão facilmente trabalho. Tem responsabilidades que não se igualam ao início da vida profissional, ainda com a rectaguarda parental. Fica-se num beco sem saída e o desespero cega a esperança. É-se inundado pela ideia de derrota. O pânico do confronto com “e agora?”. Como ter comida, pagar as contas, a casa? Como se asseguram as necessidades básicas?

Alguém numa situação precária, sente que tem de reagir com urgência para encontrar uma fonte de sustento. Precisa necessariamente de apoios. Realisticamente, materiais. E os apoios sociais provenientes do Estado, se ajudam, são insuficientes. Valham nesses momentos familiares e amigos. Seja a persistência, a paciência, a criatividade, a suportabilidade da carência, as qualidades que permitem a pessoa não se afogar. Algo há-de acontecer. Um novo trabalho há-de aparecer. Mesmo não sendo algo que se esperasse fazer, será importante encarar esta fase como transitória.

A saúde e o trabalho/subsistência são a base para construir uma vida confortável. Lembremos a teoria das necessidades hierárquicas de Maslow. Primeiro a sobrevivência e depois as necessidades de amor, relacionamento, realização pessoal.

É quando as necessidades básicas de sobrevivência são afectadas que apanhamos os grandes sustos. A estrutura que reconhecemos como sendo a nossa vida é de tal forma abanada que tudo é obrigado a ser colocado em perspectiva e as prioridades reconsideradas. São momentos que levam inevitavelmente a mudanças reais e subsequentemente, psíquicas. O maior desafio é ultrapassar, e no fim, já com o reequilíbrio desejado, transformações elaboradas, pensar e repensar. Passada a experiência, lições retiradas e continuar.

anaeduardoribeiro@sapo.pt