O primeiro debate nas primárias do Partido Republicano, no final do passado mês, marcou o início formal da corrida presidencial americana de 2024. Neste artigo olho apenas para aqueles que participaram no debate e apenas escrevo sobre aqueles que mais se destacaram, concluindo sobre aquilo que considero ser melhor para os EUA e para o mundo. De lembrar que Donald Trump não esteve presente no debate.

Começando por aquele que se auto intitula de ter um “nome engraçado”: Vivek Ramaswamy. Ramaswamy apresenta-se como um outsider nesta corrida à nomeação do Partido Republicano. Isto é, de todos os candidatos, é o único que não tem experiência política. Para além de se apresentar como tendo um “nome engraçado”, tal como Obama também fez na corrida do Partido Democrata, os dois partilham de uma outra semelhança, a idade relativamente jovem com se candidataram.

Em tudo o resto, Ramaswamy é a versão júnior de Donald Trump: ambos têm um passado com muito sucesso no mundo dos negócios e ambos são vistos como fora do status quo político. No que toca à forma e ao conteúdo, Vivek e Trump são igualmente semelhantes. Vivek apresenta-se com um discurso agressivo, com expressões como “A agenda das alterações climáticas é uma farsa”. Ou então considera “desastroso” o apoio dos EUA à Ucrânia, sendo contra qualquer apoio adicional dos EUA. Ou ainda por acreditar que entidades como o Departamento de Educação, o FBI, o Departamento de Comércio ou o IRS não devem existir.

Aqui não se trata de saber se concordamos ou não com o conteúdo da mensagem, mas sim com a forma como a apresenta: de forma simples, frontal, catchy e com impacto mediático. Claramente, e de forma estrategicamente inteligente, a tentar convencer o eleitorado de Trump. Daí os resultados nas sondagens lhe darem um terceiro lugar. Ficou claro o apaixonante e cego apoio de Vivek a Donald Trump quando se verificou ser o primeiro a levantar a mão, até de forma orgulhosa e mais alta que outros, quase como se de uma criança numa sala de aula se tratasse, quando o moderador perguntou: “Caso Trump seja condenado em tribunal, apoiariam a candidatura de Trump como a escolha do vosso partido?”. Assim sendo, e caso tal se verifique, ninguém ficaria surpreendido caso Trump o convidasse a ser o seu running-mate (candidato a vice-presidente), preenchendo assim o presidential ticket no GOP (Grand Old Party, pelo qual o Partido Republicano também é conhecido). Caso o ex-presidente seja condenado, Vivek admite conceder-lhe o famoso perdão presidencial, considerando-o ainda como “o melhor presidente dos EUA no século XXI”. A percepção pública republicana parece estar alinhada com Vivek e não admira que todos os candidatos do debate se tenham insurgido contra o “amador da noite”, como vários o qualificaram.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A segunda vencedora do debate foi Nikki Haley. A ex-governadora da Carolina do Sul e ex- Embaixadora dos EUA para as Nações Unidas apresenta-se como uma das poucas vozes relativamente moderadas e sensatas dentro do Partido Republicano, seja na forma ou no conteúdo. Reconheceu os erros económicos que o partido republicano e que a anterior administração (administração Trump) cometeram e como essas consequências se têm feito sentir. No que às alterações climáticas diz respeito, aquando da questão “Acredita que o ser humano é responsável pelas alterações climáticas?”, respondeu “Sim” . Apesar de tudo foi muito pouco clara sobre como gostaria de abordar esse tema respondendo que “todos queremos água e ar limpos” e logo a seguir foca as atenções na China e na Índia para que estes países também diminuam as emissões de gases poluentes. Ao menos tenciona fazer algo relativamente ao tema das alterações climáticas – contrariamente a Vivek, porém, não sabemos o quê em concreto.

Já no tema do aborto, apresenta-se como pro-life (contra o aborto), mas aborda o tema de uma forma “humanista” e muito pessoal. Tenta ser consensual, referindo ser contra o aborto cometido numa fase tardia da gravidez (excepto em determinadas circunstâncias) ou contra a detenção de mulheres que o cometam, sendo favorável ainda à objeção de consciência por parte de profissionais de saúde. No que à política externa diz respeito, Haley é aquela que apresenta uma posição mais realista e moderada de contínuo apoio à Ucrânia – militar e diplomático. Defende ainda que a suspensão do apoio, conforme Vivek pretende, traria grandes desequilíbrios geopolíticos, favoráveis à China e à Rússia. Reconhece o esforço dos países europeus na guerra e insiste na ideia de que os EUA não podem deixar as frentes de batalha sozinhas – seja na Europa, seja no Médio Oriente. Na questão se apoiaria Trump à Casa Branca, mesmo que ele fosse condenado, Haley diz que “confia no povo norte-americano caso assim decida”. Apela ainda para a necessidade de renovar o sangue republicano e que os EUA não gostariam de ver um novo round “Biden vs Trump”. É ainda muito crítica do partido republicano e da incapacidade de o mesmo tomar decisões, de Trump e da incapacidade de o partido se afastar da figura de Trump. Foi considerada uma das vencedoras da noite e nas sondagens fica atrás de Trump, De Santis e Vivek.

Relativamente ao governador da Florida, Ron De Santis, fica claro que procura usar o capital político que conseguiu nesse Estado para o catapultar a sua ida para a Casa Branca. Ao longo do debate fez várias referências ao que tem feito nesse Estado, não tendo sido tão interventivo e não tendo tido tanto mediatismo como Vivek e Haley. Na questão de saber se apoiaria Trump, levantou a mão muito depois de Vivek, tendo sido o último a fazê-lo. Não tem posições tão marcantes como Vivek e Haley, e isso poderá demonstrar alguma inconsistência e fraqueza, tal como no episódio da mão. Para além disso apresenta um discurso vago e, uma vez vais, centrado em si próprio e no seu percurso, sobretudo na Flórida. Relativamente à guerra, não é muito claro sobre o apoio dos EUA. Considera a guerra russa-ucraniana como um confronto “regional” e que deveriam ser os europeus a patrocinar os esforços de guerra e não os contribuintes norte-americanos. Surge como o segundo candidato nas sondagens para a nomeação, mas foi amplamente considerado como uma das desilusões da noite.

Por fim, deve ser feita ainda uma referência ao antigo Vice-Presidente, Mike Pence, e ao antigo Governador de Nova Jersey, Chris Christie. É muito comum nos EUA Vice-Presidentes usarem a sua experiência como número dois de forma a catapultarem a sua corrida à Casa Branca e à nomeação do partido. Todavia Mike Pence (Vice-Presidente de Trump) parece estar longe de ter a mesma sorte que Biden (Vice-Presidente de Obama e atual Presidente) teve. Nas sondagens para a nomeação surge em quinto lugar. Um dos temas do debate visava-o diretamente. O tema tratava o facto de Pence não ter apoiado Donald Trump na tentativa de overturn [alterar] o resultado das eleições no dia 6 de janeiro de 2021 – dia das invasões ao Capitólio.

O Governador Chris Christie foi o primeiro de todos os candidatos no debate a condenar a conduta de Trump, tendo sido dos poucos que se recusou a levantar a mão sobre se apoiaria Trump caso ele fosse nomeado. Num gesto de decência, sentido de fair-play político, que há muito não se via, agradeceu a Mike Pence por ter defendido a Constituição quando o Presidente Trump alegadamente a terá colocado em causa. Juntaram-se também nessa mensagem de apoio os candidatos Tim Scott, Nikki Haley e Doug Burgum. De Santis foi muito pouco expressivo no apoio, e Vivek nada disse sobre o tema – expectável uma vez que é o fã número um de Trump. Tanto Pence, como Christie, não foram dos candidatos mais carismáticos durante a noite, não tendo capitalizado tanto com o debate.

Pessoalmente, concordo com Nikki Haley e julgo que os EUA precisam de se afastar dos últimos 8 anos de Trump, Biden e companhia, necessitando desesperadasmente de sangue novo. Considero que caso a nomeação caia em Trump, De Santis, Vivek ou Pence, os EUA estarão mais 4 anos nessa tóxica discussão entre democratas e republicanos, independentemente de quem se candidate dentro do partido democrata, uma vez que todos esses nomes estão ligados a Trump, seja na forma, seja no contéudo ou seja no passado.

Aplicando o mesmo princípio no lado democrata, julgo que nem Biden, nem Harris devam ser os nomeados do partido democrata. Assim sendo, até à data, vejo com bons olhos a possibilidade de Nikki Haley ser a nomeada do Partido Republicano. Relativamente ao Partido Democrata, Robert F. Kennedy Junior parece ser uma boa opção, mas a lista de candidatos ainda não está fechada e muito ainda poderá acontecer. Uma coisa é certa, ambos os candidatos pensam por si próprios e pouco ou nada se confundem com os partidos que representam, sendo ambos candidatos sensatos, moderados e sem um viés populista. De um lado temos uma mulher com grande experiência na política norte-americana e internacional, do outro, até ao momento, temos um advogado que há anos que trabalha na causa ambiental e cuja família tem um significado mítico nos EUA: é filho de Robert F. Kennedy e sobrinho de John F. Kennedy.

Uma coisa é certa, o cenário de que alguém moderado ou sensato e que não esteja ligado a Trump ou Biden seja nomeado por ambos ou qualquer um dos partidos é muito improvável. Assim sendo, em princípio, acabaremos com mais 4 anos de confronto entre democratas e republicanos. Mas, como diz o outro, “ainda a procissão vai no adro”… e a decisão dos partidos e dos eleitores norte-americanos só ocorrerá em 2024.