São as crises, a covid e a guerra. É o clima, a economia e a pobreza. É o peso da história ou a crise da família. E, de cada vez que isso se fala, surge sempre a mesma frase batida: “vivemos tempos de grandes incertezas”. Questionam-se os riscos e a resiliência das instituições. A segurança e a privacidade. A demografia e as condições de trabalho. A globalização e a democracia. Repete-se que vivemos num tempo instável e duvidoso. Complexo e incompreensível. Um tempo de risco e de crises. Onde tudo parece ter-se tomado incerto e imprevisível. Onde os planos se emaranham nos medos. E o conhecimento não nos garante o controle e a capacidade de prever o futuro.

Há uma diferença grande entre a certeza da confissão religiosa e as certezas científicas. A certeza da confissão religiosa remete-nos para a fé. Uma convicção que “abafa” as dúvidas e nos entrega a uma presunção que se “esgota” em si mesma. A certeza da ciência nasce da dúvida. Cresce quando a transformamos num problema. E desabrocha quando extraímos dele um conhecimento que nos encaminha até à “certeza”. A ciência permite que se preveja. A fé que se enxergue a imprevisibilidade. A ciência alimenta a ilusão de se dominar um conhecimento. A fé a prudência de olhar o mistério. A ciência convida a prever. Funciona como um gps que nos leva a um “destino”. A fé aclara a nossa pequenez, quando o destino se quer visto de véspera.

Há um ontem e hoje na forma de chegar às certezas. E talvez tenhamos todos alimentando a ilusão dum mundo onde a ciência manda demais. Um mundo pejado de certezas. Um mundo onde a mudança quase se decreta. Mas a vida é,desde sempre, composta de grandes incertezas. Em que nunca se pensa até às últimas consequências. E onde, em muitos momentos, cada compreensão é um mal-entendido. Fomos todos muito mal educados para a mudança! Tão mal educados que vemos na incerteza um perigo. Ou a decadência do progresso. Quando ela é a alma do nosso crescimento. Aquilo que nos leva até às vistas largas. Mas o mais preocupante é que aqueles que nos governam vejam na incerteza uma ameaça à segurança e ao conforto. Onde estiveram, eles, entretanto? Porque é que aquilo que nos torna humanos (n)os assusta assim?…

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