Miguel nasceu no dia 13 de fevereiro. É o mais novo dos quatro filhos de Ana Ladeira que, até hoje, não recebeu um cêntimo da Segurança Social. “Logo em fevereiro fui à Segurança Social entregar os documentos, não é o meu primeiro filho, sabia perfeitamente o que levar”, conta ao Observador. O processo deu entrada e um mês depois, Ana Ladeira recebeu um contacto dos serviços dizendo que afinal teria de preencher outro impresso. Ana assim fez. Passou março, passou abril, chegou maio. “A última vez que fui a uma loja do cidadão foi há três semanas e uma das funcionárias respondeu-me que só naquela altura estavam a processar os pedidos de fevereiro.”

Do abono de família também nada chegou. Ana recebe abono de família dos outros três filhos — “já vi na internet que está lá a indicação para o pagamento de maio” — mas sobre o valor a pagar por Miguel, nada.

“Vou começar a trabalhar dia 15 de junho e ainda não me pagaram nada”, explica. Tantos meses sem rendimento, com o marido desempregado, apenas a receber subsídio de desemprego, Ana conta que as dificuldades têm sido grandes. “Recorremos à ajuda de familiares, a minha mãe já me pagou uma renda, mas entretanto tivemos de ir falar com o senhorio, porque já não conseguimos pagar a última prestação. Ele compreendeu, mas a verdade é que não sei se conseguirei pagar a renda que aí vem”, explica, desabafando: “Para o senhorio também não é justo.”

Ana Ladeira não consegue obter da Segurança Social uma previsão para o pagamento. “A linha tem estado completamente indisponível. Ou a chamada cai, ou tenho de estar muito tempo à espera. Vou consultando o processo na internet, mas não sei de nada, na verdade.” Dos outros três filhos a experiência foi diferente: “No máximo esperei um mês.”

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Mariana Ferreira foi mãe de uma menina no dia 11 de Abril. O pai, Pedro, meteu os vinte dias de licença a seguir ao parto. Ainda não receberam da Segurança Social. Mas desta vez, a linha funcionou e Pedro conseguiu uma resposta: “Disseram-lhe que o pagamento está de facto atrasado e que está previsto processarem o pagamento na terceira semana de junho”, conta Mariana. Nessa altura, Catarina já terá três meses. Como vão fazer até lá? “Temos utilizado as nossas reservas”, explica Mariana.

Segurança Social nega atrasos

Contactado pelo Observador, o Instituto da Segurança Social (ISS) nega a existência de atrasos no subsídio parental. Segundo o gabinete de comunicação do ISS “o Subsídio Parental Inicial, desde a entrada do requerimento ao deferimento e carregamento no sistema, regista uma média nacional de tempo de deferimento  de 12  dias (janeiro a abril). Mais se informa que, após deferimento e carregamento no sistema, os subsídios são processados em data fixa do mês, sendo que nos casos dos deferimentos ocorridos após data de processamento, o pagamento ocorre no mês seguinte”.

Para o ISS, “eventuais atrasos no tratamento destes requerimentos serão, com certeza, casuísticos, pelo que só poderão ser esclarecidos mediante identificação dos casos em concreto”.

No dia 6 de Maio, Inês Correia foi mãe de Bernardo, mas desde o início de Março que estava de baixa por gravidez de risco. “Fui aos serviços diretamente para tratar de tudo, da baixa e do abono pré-natal. Só no dia 23 de Maio recebi os três meses de baixa e sobre o abono pré-natal ainda nem sei se tenho direito ou não a ele”, explica.

“Voltei à Segurança Social na semana passada e informaram-me que ainda não fizeram a análise do abono pré-natal. Agora vamos ver como vai ser do subsídio parental”, desabafa. Durante estes meses, Inês e o marido conseguiram fazer face às despesas com a ajuda da mãe de Inês. “Estar sem receber e conseguir pagar, só com o ordenado do meu marido, casa, água, luz, gás e comida é impensável.”

Inês chegou mesmo a desesperar da última vez que chegou ao balcão da Segurança Social. “Quando percebi que ainda não ia receber até chorei, lá mesmo. Como é que não pagam às pessoas? E quem vive sozinho e tem um bebé sozinho? Como faz? A única coisa que atenua esta situação é que, com um bebé nos braços, estamos quase ‘zen’ e só pensamos na alegria de termos o nosso filho”, desabafa.

Em relação a eventuais atrasos no pagamento de baixas por risco clínico na gravidez, o ISS volta a referir que tal não existe. “O tempo médio de deferimento do subsídio por risco clínico de gravidez, a nível nacional, tem sido de 3 dias (de acordo com indicadores de janeiro a abril de 2015).”

Salvos pelo IRS

Susana Oliveira foi mãe de Joana no dia 20 de Abril. “Entregámos os papéis no dia 23 e até agora nada”, conta. Nem subsídio para a mãe, nem subsídio para o pai. “O único dinheiro que entrou foi uma parte paga pela empresa do meu marido, mas que nem sequer chegava para as despesas fixas.” Mas se Susana e Paulo tiveram “azar” com a Segurança Social, acabaram por ter “sorte” com as Finanças. “Recebemos o reembolso do IRS este mês e foi isso que nos valeu para pagarmos a casa, a água, a luz e o gás.”

Joana é a segunda filha deste casal. “Há quatro anos não foi assim, recebemos logo”, conclui Susana.

Mais uma vez, também há queixas sobre o atendimento telefónico da Segurança Social. “Já ligamos várias vezes e a diferentes horas do dia. Ninguém atende. Chama, chama e depois desliga. Por isso marcámos um atendimento presencial para dia 11 de junho nos serviços mais próximos de nossa casa.” Dia 11, Joana já terá quase dois meses e os pais esperam obter alguma resposta.

Sobre a linha telefónica, o 300 502 502, o ISS refere que “a Linha da Segurança Social tem realizado uma média diária de mais de 7.200 atendimentos, sendo que, de janeiro a 30 de abril de 2015, realizou 505.802 atendimentos telefónicos”. Na última tentativa feita pelo Observador conseguimos ser atendidos.