O risco de Portugal vir a necessitar de um segundo resgate “é baixo”, afirma a Moody’s numa nota divulgada nesta terça-feira. A agência de rating considera que o país dispõe de uma situação de liquidez “confortável” e enfrenta necessidades de financiamento “limitadas” até ao final de 2016, mas vai continuar a falhar as metas orçamentais, com o défice público a estabilizar em redor de 3% do produto interno bruto (PIB), no limite das regras europeias.

A questão de um possível segundo resgate a Portugal, depois do pedido de ajuda concretizado em 2011 junto do Fundo Monetário Internacional e da Comissão Europeia, foi reintroduzida no debate público por Mário Centeno. Questionado sobre o tema durante uma entrevista à CNBC, o ministro das Finanças disse que evitar aquele cenário é a sua “principal tarefa”.

Apesar de a Moody’s defender a perspetiva de que um novo bail out é improvável nos tempos mais próximos, a nota sublinha que o risco não pode ser “totalmente descartado” e permanece refletido na notação de crédito da agência que mantém a dívida portuguesa classificada como “especulativa”. Como elemento positivo sobre a saúde das finanças públicas portuguesas, a Moody’s refere a “almofada” de 12 mil milhões de euros existentes no final de junho passado, equivalente a 6,5% do PIB, que compara com a meta de 6,4 mil milhões no final de 2016.

Neste cenário de liquidez, o Estado português terá de proceder ao reembolso de um empréstimo no valor de 4,2 mil milhões de euros em outubro e emitirá 4,4 mil milhões de euros em nova dívida, que poderia permitir ao Governo fazer um reembolso antecipado e voluntário, de quatro mil milhões de euros, ao Fundo Monetário Internacional. A Moody’s refere que o Banco Central Europeu tem realizado aquisições de dívida pública portuguesa a um ritmo de 1,1 mil milhões de euros por mês no âmbito do respetivo programa de quantitative easing, o que tem ajudado a manter as taxas de juro sob controlo.

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Esta posição confortável da tesouraria do Estado não afasta alguns riscos identificados pela Moody’s. A agência assinala o abrandamento do ritmo de crescimento da economia portuguesa para 0,9% durante os dois primeiros trimestres de 2016 e acrescenta que o investimento tem demonstrado um comportamento “muito fraco”, assim como o desempenho do consumo privado. O abrandamento deste indicador revela, diz a Moody’s, que os estímulos introduzidos pelo Governo liderado por António Costa produziram apenas um “efeito temporário”.

Decisões tomadas pelo Executivo anterior, chefiado por Pedro Passos Coelho, também são alvo da análise da Moody’s. “Fica cada vez mais claro que as extensas reformas estruturais implementadas durante os três anos do programa de ajustamento não tiveram resultados no aumento do potencial de crescimento” da economia portuguesa, lê-se no documento, que evidencia ceticismo em relação ao futuro: “Observamos uma vontade escassa para realizar mais reformas”. Portugal deverá crescer entre 1% a 1,5%, “na melhor das hipóteses”, durante os próximos anos, ritmo que a Moody’s compara com as taxas de 2% em Espanha, 2,1% em Chipre e 1,7% na Eslovénia. Apenas Itália terá uma performance tão fraca, na ordem de 1,1%, constata a agência.

O cenário de baixo crescimento vai dificultar a redução do peso da dívida pública sobre o produto. A Moody’s prevê que o saldo negativo das contas públicas fique em 2,7% do PIB em 2016 e 2017. E adianta que o peso da dívida pública continuará a aumentar durante este ano, numa trajetória que é “altamente vulnerável” a taxas de crescimento menores do que as previsões, em especial se o Governo optar por emitir nova dívida para satisfazer as necessidades inscritas no plano de recapitalização da Caixa.

A banca faz parte do grupo de ameaças “enquanto se mantiver debilmente capitalizada”, já que as injeções de capital realizadas entre 2012 e 2013 “não foram suficientes” para “restaurar a saúde no setor”. Nos balanços das instituições financeiras, o peso dos ativos que não geram rendimentos mantém-se elevado, problema a que se somam as baixas taxas de juro, que comprometem a capacidade de gerar lucros. A agência de rating assinala, também, que, a partir de 2017, as exigências regulatórias mais apertadas vão agravar as necessidades de capitalização dos bancos.

Um dos meios de ajudar a superar as insuficiências de capital no setor financeiro poderá estar nas mãos de investidores estrangeiros. A Moody’s considera que o interesse destes investidores é um “sinal encorajador”, mas adianta que está longe de se poder garantir que as intenções venham a ser concretizadas. Sobre o plano de recapitalização da Caixa Geral de Depósitos, o documento diz que ainda será necessário ultrapassar diversos “obstáculos”, entre os quais destaca a emissão de obrigações subordinadas no valor de mil milhões de euros, cuja taxa de juro servirá de referência para a remuneração do capital que será injetado pelos cofres públicos, no valor de 2,7 mil milhões de euros.

O risco político de Portugal é tido como “limitado” no curto prazo. O Governo precisa de dois partidos de esquerda para conseguir aprovar o Orçamento do Estado para 2017, mas as negociações já começaram e “esperamos que as principais medidas sejam objeto de acordo” antes da apresentação do documento, escreve a agência. Na análise da Moody’s, PCP e Bloco de Esquerda não terão interesse em provocar a queda do Governo e forçar eleições legislativas antecipadas.

Mas, se não são aguardados problemas na “luz verde” ao Orçamento do próximo ano, a redução do défice estrutural, que deveria atingir 0,6% do PIB, não será alcançada. Do ponto de vista da agência, a redução da despesa com salários através do preenchimento de apenas uma vaga por cada funcionário público que se reforme, bem como o congelamento dos gastos com consumos intermédios, duas medidas que a Moody’s acredita que continuarão em vigor em 2017, não serão suficientes para assegurar o cumprimento daquele objetivo, embora possam vir a contribuir para manter o saldo negativo do Orçamento do Estado abaixo de 3% do PIB.