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Mark Wilson/Getty Images

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Nos debates presidenciais dos EUA, basta uma gota de suor para perder eleições

Nixon transpirou, Ford olhou mal para o mapa da Europa, o velho Reagan levou a plateia às gargalhadas e McCain chamou "aquele ali" a Obama. Recorde os momentos mais marcantes dos debates dos EUA.

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Enfim, Hillary Clinton e Donald Trump vão sentar-se na mesma sala e tentar convencer os eleitores norte-americanos porque é que um é melhor que o outro. É tão simples quanto único. Afinal, apesar de a época eleitoral estar aberta há mais de um ano nos EUA (Clinton anunciou a sua candidatura em abril de 2015, Trump fê-lo dois meses depois, em junho), os dois candidatos nunca se cruzaram. Nem os EUA são um país pequeno que propicie encontros imprevistos, nem as equipas de campanha são amadoras a esse ponto — antes pelo contrário.

O primeiro de três debates entre Clinton e Trump está marcado para terça-feira, dia 26 de setembro, logo pelas 02h00 de Lisboa. A expectativa é grande, até porque as sondagens têm demonstrado uma tendência de aproximação dos dois candidatos. Depois das convenções, Clinton chegava a aparecer numa sondagem com 14% de vantagem sobre Trump. Agora, a vantagem da democrata mantém-se, mas é ténue — 4% em média, segundo o Huffington Post Pollster; 2,6% para o Real Clear Politics; 2,3% no cálculo do FiveThirtyEight.

Poderão os debates fazer uma diferença? Será Clinton capaz de domar a fera Trump — vide debates das primárias republicanas — ou será que o magnata nova-iorquino vai tentar adotar uma postura mais presidencial, que agrade ao eleitorado que ainda lhe resta conquistar? E o que fará Hillary Clinton para contrariar isso?

A história destes debates ainda não está escrita — portanto, especular é tudo o que podemos fazer. Mas talvez valha a pena olhar para os debates anteriores para recordar alguns dos momentos que ainda hoje fazem parte da memória coletiva norte-americana e que introduziram algumas expressões no léxico político daquele país. De Nixon versus Kennedy até Romney versus Obama.

1960. O suor de Nixon e o sorriso de Kennedy

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Quando Richard Nixon e John Fitzgerald Kennedy entraram nos estúdios da CBS em Chicago, a 26 de setembro de 1960, estavam prestes a protagonizar um dos momentos mais marcantes da política norte-americana. Pela primeira vez, os dois principais candidatos às eleições presidenciais dos EUA estavam reunidos frente a frente, com uma câmara por perto, para debaterem para uma audiência que na altura ficou estimada em 74 milhões de pessoas.

Mas o debate não se tratava apenas de um debate entre um candidato republicano e o seu adversário democrata. Era também uma disputa entre Nixon, um político experiente que com apenas 47 anos já ia no fim do seu segundo mandato consecutivo como vice-Presidente de Dwight Eisenhower; e Kennedy, que aos 43 anos era uma cara pouco conhecida fora do estado do Massachusetts, que o elegeu para seu senador duas vezes consecutivas.

A verdade é que as coisas não andavam a correr bem a Richard Nixon naquele mês. “Enquanto fazia campanha no Tennessee, Nixon foi abordado por um grupo de eleitores entusiasmados e magoou o joelho quando entrava na sua limousine”, recordou Roger Stone, hoje em dia um dos conselheiros mais próximos de Donald Trump, no livro “Nixon’s Secrets” (2014). A lesão de Nixon acabou por espoletar uma infeção que o obrigou a ficar acamado durante 12 dias. Numa altura em que a campanha deveria entrar na sua força máxima — Nixon fez a promessa de visitar os 50 estados do país —, o candidato do Partido Republicano estava confinado a uma cama de hospital.

Enquanto isso, Kennedy teve a oportunidade de fazer uma campanha sem rival e preparar-se para o debate de 26 de setembro com a sua equipa, trabalhando todos os detalhes. “Kennedy encontrou-se no dia anterior com o produtor para discutir a disposição do estúdio e a localização das câmaras”, lê-se no site da John F. Kennedy Library.

Quando se sentaram para responder às perguntas dos jornalistas em estúdio, os dois candidatos não podiam estar mais diferentes. Kennedy estava sorridente e bronzeado, numa postura tranquila e que inspirava confiança, vestindo um fato azul escuro que constrastava com o cinzentismo daquele estúdio, ainda antes da televisão a cores. Já Nixon apresentou-se ao público com um ar abatido, com a pele reluzente do suor causado por uma febre de quase 39 graus, com o corpo a afundar-se no fato cinzento, depois de ter perdido nove quilos no período em que esteve de cama.

O debate não foi particularmente agitado. Respondendo apenas na sua vez, sem interromper o adversário e excusando-se a levantar a voz, os dois candidatos apresentaram as suas posições sem problemas — e, já agora, sem gafes.

No final do debate, nem todos estavam de acordo em relação a quem consideravam o vencedor. Entre aqueles que tinham ouvido o debate na rádio, Nixon foi quem recebeu melhores avaliações. Mas para aqueles que viram o debate pela televisão (em 1960, 88% dos lares dos EUA já tinham pelo menos um aparelho televisivo) a escolha recaiu sobre Kennedy. O primeiro debate acabou por ser crucial para Kennedy, que ali ganhou visibilidade e aprovação. Antes disso, o senador do Massachusetts estava com menos 1% nas sondagens. Logo a seguir, ficou três pontos à frente de Nixon, segundo a Gallup. No dia das eleições, os resultados foram (bastante) mais renhidos. Kennedy venceu com apenas mais 0,17% do que Nixon, que perdeu por 112 mil votos.

Na sua autobiografia, “Six Crises” (1990), Nixon lamentou aquele debate e a maneira como se apresentou — chegou a haver outros três, em que Nixon apareceu recuperado, mas que não foram suficientes para apagar o primeiro. “Eu devia ter-me lembrado de que uma imagem vale por mil palavras”, escreveu. Em 1968, Richard Nixon voltou a candidatar-se à presidência dos EUA, tendo Humbert Humphrey como seu adversário principal. Apesar da insistência do candidato democrata, que desafiou Nixon várias vezes para um debate televisivo, o republicano não mordeu o isco — e acabou por tornar-se no 37º Presidente dos EUA.

1976. Quando Ford disse que a URSS não dominava a Europa de Leste

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Finalmente, os debates televisivos tinham voltado a fazer parte das eleições presidenciais dos EUA. Depois do fracasso de Nixon no primeiro debate das eleições de 1960, foram muitos os políticos que fugiram a sete pés destes embates. Logo nas eleições de 1964, Lyndon Johnson, que sucedeu a Kennedy depois de este ter sido assassinado em 1963, recusou debater contra o republicano Barry Goldwater. Em 1968, o democrata Humbert Humphrey lançou o desafio de um debate a Nixon — que, ainda escaldado do que se passara oito anos antes, rejeitou liminarmente a ideia. Em 1972, voltou a fugir dos debates, negando-se a um encontro com o democrata George McGovern.

Por isso, quando os frente-a-frente voltaram, em 1976, as expectativas eram grandes. Naquele ano, o confronto era entre Gerald Ford, o Presidente republicano que ficou com a ingrata tarefa de conseguir um terceiro mandato consecutivo para o seu partido depois do escândalo do Watergate, que derrubou Nixon, e o democrata Jimmy Carter, até há pouco tempo governador do estado da Georgia.

Das três vezes em que Ford e Carter se opuseram, houve dois momentos dignos de nota.

O primeiro aconteceu no primeiro debate. Já na reta final, quando Carter respondia à última pergunta da noite, a sua voz nasalada e com sotaque sulista foi atropelada por um zumbido causado por uma falha de som. 20 segundos depois, o apresentador da ABC Harry Reasoner anunciava que havia uma falha técnica e tentava tranquilizar os espectadores: “Isto não é uma conspiração contra o governador Carter ou contra o Presidente Ford”.

Foram precisos 27 minutos para que a falha técnica fosse apurada e solucionada. Enquanto isso, a emissão foi ocupada com comentários improvisados de representantes de ambas as candidaturas. E os candidatos? Ficaram nos seus respetivos pódios durante aquele tempo todo sem trocar uma única palavra. “Eu vi a gravação depois e achei aquilo embaraçoso; o Presidente Ford e eu termos ficado ali quase como se fossemos robôs”, comentou, anos depois, Carter. Já Ford procurou explicar o momento: “Julgo que nós os dois teríamos tido todo o gosto de nos sentarmos e relaxarmos um pouco enquanto os técnicos estavam a corrigir o problema, mas acho que estávamos os dois hesitantes em fazer gestos que poderiam denunciar que não estávamos física ou mentalmente preparados para lidar com um problema destes”.

Mas foi no segundo debate entre Carter e Ford que se ouviu aquela que, até hoje, continua a ser uma das maiores gafes da história dos debates presidenciais dos EUA. Quando o assunto era a relação dos EUA com os russos e também a esfera de influência de Moscovo, Ford disse: “Não há um domínio soviético da Europa de leste e nunca haverá numa administração de Ford”.

O jornalista do The New York Times Max Frankel, que tinha feito a pergunta inicial, insistiu — mas desta vez com um sorriso de incredulidade perante aquilo que tinha acabado de ouvir. “Desculpe, posso só… Eu ouvi bem quando o senhor disse que os russos não estão a usar a Europa de leste como a sua esfera de influência ao ocuparem a maioria dos países de lá?”, perguntou-lhe. Ford respondeu-lhe dando os exemplos da Roménia, da Jugoslávia e da Polónia, dizendo que “cada um destes países é independente e autónomo”, apesar de todos fazerem parte do Pacto de Varsóvia, firmado em 1955.

A tentativa de Ford para sair do buraco onde se metera não teve sucesso. Antes deste debate, Ford estava 2 pontos atrás de Carter nas sondagens. Depois, quando a gafe do Presidente tomou conta da cobertura mediática daquele encontro, Carter ficou com 6 pontos de vantagem sobre Ford, segundo a Gallup. No dia das eleições, o democrata acabaria por vencer com 50,1% dos votos, à frente dos 48% de Ford.

1984. Reagan diz que não é velho, o adversário é que é inexperiente

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Quem melhor do que um ator para tornar a política norte-americana num verdadeiro palco? Ronald Reagan fê-lo com mestria, polvilhando tudo o que dizia, dos mais emblemáticos discursos às intervenções mais simples, com pequenas frases — conhecidas como one-liners — que ficavam nos ouvidos de todos. Já tinha sido assim nos debates de 1980, quando ia dizendo a Carter: “Lá vem você outra vez com isso…”.

Mas foi já em 1984 que Reagan teve a oportunidade de responder com uma das suas one-liners mais conhecidas, ao mesmo tempo que tratava de reagir a uma das questões que a oposição mais lhe atirava: a sua idade avançada. Aos 73 anos, Ronald Reagan era acusado de ser demasiado velho para liderar os EUA, por oposição ao candidato democrata, Walter Mondale, que tinha então 56 anos.

A questão foi introduzida pelo moderador, Henry Trewhitt, que lhe perguntou: “Você já é o Presidente mais velho de sempre. E algumas das pessoas da sua equipa dizem que estava cansado depois do primeiro encontro com o senhor Mondale. Recordo que o Presidente Kennedy teve de aguentar vários dias com muito pouco descanso durante a crise dos mísseis cubanos. Tem alguma dúvida de que não seria capaz de funcionar em circunstâncias como aquelas?”.

Reagan respirou fundo e disse: “De todo, senhor Tremwhitt, e eu quero que saiba que eu não vou tornar a idade numa questão desta campanha. Eu não vou explorar para fins políticos a juventude e falta de experiência do meu adversário”. A plateia irrompeu em aplausos e gargalhadas, às quais o democrata Mondale também não conseguiu escapar.

Os debates daquele ano acabaram por ser uma mera formalidade, uma vez que a reeleição de Ronald Reagan foi dada como praticamente certa por todas as sondagens, que o mantiveram acima de Mondale entre 17 e 20 pontos percentuais. Nas eleições, Reagan venceu com 58,8% dos votos (mais 18,2% do que Mondale) e só não venceu no District of Columbia e no Minesotta, estado natal do candidato democrata.

Ainda assim, e apesar dos esforços de Reagan e da sua campanha, a saúde do 40º Presidente dos EUA continuou a ser assunto durante muitos anos. Em 1994, cinco anos depois de terminar o seu segundo e último mandato, foi anunciado que Reagan sofria da doença de Alzheimer. O anúncio reforçou as suspeitas de que, durante os seus últimos anos no poder, Reagan não reunia todas as suas capacidades mentais. Em 2015, um estudo publicado no The Journal of Alzheimer’s por investigadores da Arizona State University detetaram sinais de início de demência nalguns discursos e intervenções de Reagan — ressalvando, porém, que não havia provas de que a doença pudesse ter afetado as suas decisões enquanto Presidente. Entre os sinais apresentados por Reagan, os investigadores realçaram a repetição de palavras e a substituição de termos específicos por palavras mais genéricas, como “coisa”.

Reagan morreu em 2004, aos 93 anos, de pneumonia.

1988. E se violassem e matassem a sua mulher, senhor Dukakis?

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28 anos depois, poucos se lembrarão do nome de Michael Dukakis. Mas basta ler algumas notícias escritas naquela altura, durante julho e a menos de quatro meses das eleições, para recordar que o então governador do Massachusetts era dado como quase certo para entrar pelas portas da Casa Branca e tornar-se o 41º Presidente dos EUA. Afinal de contas, as sondagens colocavam-no 17 pontos à frente de George H. W. Bush, que até então era conhecido por ter sido vice-Presidente durante os dois mandatos de Ronald Reagan.

Porém, com o avançar do calendário eleitoral, a vantagem de Dukakis começou a cair. Durante algum tempo, circularam rumores (falsos) de que o democrata tinha recebido tratamento por depressão e que, por isso, não estaria apto para dirigir os EUA — ironicamente, anos mais tarde, a sua mulher, Kitty Dukakis, declarou que sofria de depressão e que tinha sido tratada com choques elétricos. Além disso, no discurso em que aceitou a nomeação do Partido Republicano, Bush foi eficaz em associar o seu adversário a à ideia de uma subida dos impostos — foi este o célebre discurso em que Bush disse “leiam os meus lábios: não vai haver mais impostos”, apesar de, enquanto Presidente, ter feito precisamente isso. A pouco e pouco, os números começaram a virar-se contra Dukakis. Se em julho estava 17 pontos à frente de Bush nas sondagens, um mês depois já estava quatro pontos atrás.

A tendência de queda acentuou-se no terceiro e último debate entre os dois candidatos. A primeira pergunta, da responsabilidade do jornalista da CNN Bernard Shaw, foi sobre o tema da pena de morte, à qual Dukakis se opunha, ao contrário de Bush. Eis a questão que gelou a sala: “Governador, se Kitty Dukakis fosse violada e assassinada, estaria a favor de uma pena de morte irrevogável para o homicida?”.

Durante a campanha, a relação do casal Dukakis irradiava romantismo e cumplicidade. Ao ponto de Bush, como mais tarde escreveu num livro com as suas cartas, ter escrito uma nota à mulher, Barbara, com o seguinte pedido: “Por favor, vê como o Mike e a Kitty são. Tenta estar mais próxima — bom e… romântica — para as câmaras. Eu ando a treinar o olhar apaixonado e a mão carinhosa. É melhor para a televisão e para demonstrar afeto. Your sweetie pie coo coo. Amo-te, GB”.

O problema de Dukakis foi que, ao contrário da imagem que tinha passado da sua relação com a mulher até então, a sua resposta foi tudo menos emotiva. De forma fria, respondeu: “Não, Bernard, não estaria [a favor da pena de morte]. E eu acho que você sabe que eu tenho sido contra a pena de morte durante toda a minha vida. Não vejo nenhuma prova de que tem um efeito dissuasor e eu acho que há maneiras melhores e mais eficazes para lidar com o crime violento”.

No dia seguinte, as sondagens voltaram a favorecer Bush, que passou a estar 7 pontos à frente de Dukakis. Nas eleições Bush venceu com 7,8% de vantagem sobre o democrata.

2000. O último suspiro de Al Gore

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Experiência era coisa que não faltava naquele anfiteatro da Washington University em St. Louis, no estado do Missouri. De um lado estava Al Gore, que depois de ser senador pelo Tennessee foi vice-Presidente durante os dois mandatos de Bill Clinton. Do outro, estava George W. Bush, o governador do Texas que seguira de perto a campanha vitoriosa do seu pai, George H. W. Bush, em 1988.

Ainda assim, as expectativas apontavam para que Gore saísse vencedor do primeiro debate presidencial contra George W. Bush, que demorava a conseguir afastar a ideia de ser “filho de” e de conseguir ultrapassar o seu candidato em capacidade intelectual. Antes do debate, as sondagens eram favoráveis ao candidato democrata: segundo a Gallup, estava oito pontos percentuais à frente de Bush.

Mas, depois, veio o primeiro debate. Centrando-se em dossiers por vezes bastante técnicos, nenhum dos candidatos se destacou em relação ao outro — porém, alguns ficaram surpreendidos pela talvez inesperada capacidade de Bush para responder à altura às questões levantadas por Gore.

Logo após o debate, numa sondagem imediata da Gallup, 48% dos inquiridos deram a vitória a Gore e apenas 41% disseram que Bush esteve melhor. Mas essa perceção viria a ser alterada nos dias seguintes, muito em parte graças à imprensa conservadora, então já liderada pela Fox News. “O spin mediático pós-debate pode ter sido mais favorável para Bush”, concede a Gallup, que três dias depois do debate registava uma sondagem com um empate a 43% entre os dois candidatos.

E porquê? Entre outras coisas, porque Gore suspirou durante o debate. Mais concretamente, fê-lo em duas ocasiões, enquanto Bush falava. “Dava para ouvi-lo a suspirar alto e a soar exasperado enquanto o governador Bush estava a responder às perguntas”, disse Katie Couric, então apresentadora do célebre programa da NBC Today Show. “Acha que isso é um comportamente presidencial?”

No terceiro e último debate, Gore voltou a ser criticado mais pela sua linguagem corporal do que pelo conteúdo das suas intervenções. Desta vez, o formato do debate era o chamado town hall meeting, em que eleitores indecisos previamente selecionados colocam questões aos candidatos. Durante o debate, Gore quis pressionar Bush a responder qual era a sua opinião sobre a lei Dingell-Norwood, que previa mais facilidades no acesso a tratamento hospitalar. Pelo meio, o moderador pediu ao texano para dizer quais eram as maiores diferenças entre ele e o seu adversário.

“Bom, a diferença é que eu faço. É que eu consigo fazer algo positivo em benefício do povo. É nisso que consiste esta campanha, não é só em qual filosofia temos e quais são as nossas posições nos temas, mas se conseguimos fazer coisas”, disse Bush, até que olhou para o seu lado esquerdo. Mais próximo do que o recomendado, lá estava Gore, que a meio da resposta de Bush se levantou da cadeira e avançou, num estilo fanfarrão e rufia, para junto do seu adversário. Quando Bush reparou no gesto de Gore, olhou para ele e acenou com a cabeça, arrancando uma gargalhada à plateia. “E eu acredito que consigo”, concluiu Bush, sobre a sua capacidade de “fazer coisas”. Gore ficou ali, de pé, com um sorriso desconfortável. Insistiu numa resposta à lei Dingell-Norwood, mas já ninguém estava a ouvir.

Antes do terceiro debate, as sondagens colocavam os dois candidatos num empate a 44%. Depois, Bush subiu para 46% e Gore ficou para trás com 42%.

As eleições de 2000 viriam a tornar-se numa das mais polémicas na História dos EUA, com Gore a vencer no voto popular mas a perder na contagem dos votos do Colégio Eleitoral, o que resultou na vitória de Bush. O estado da Florida, onde foi feita uma recontagem dos votos, foi crucial para a consagração de Bush como o 43º Presidente dos EUA.

2008. Obama, ou “aquele ali”

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George W. Bush não tinha deixado a tarefa de uma reeleição de um Presidente do Partido Republicano particularmente fácil. Em outubro de 2008, apenas 22% dos americanos faziam uma apreciação positiva da performance de Bush — o número mais baixo de sempre, do qual se aproxima o segundo pior, de Nixon, com 24% em agosto de 1974, quando se demitiu no seguimento do caso Watergate.

Ciente disso, o candidato republicano, o senador do Arizona John McCain, fez de tudo para negar qualquer tipo de proximidade com Bush — os dois nunca foram propriamente amigos, como as eleições primárias republicanas de 2000 provaram —, procurando atingir a maior distância dos oito anos que então terminavam. Enquanto isso, do outro lado estava o então senador pelo estado de Chicago, Barack Obama, que naquela altura gozava o estatuto de primeiro candidato afro-americano de um grande partido à Casa Branca.

Foi precisamente numa das várias tentativas de McCain se distanciar do legado de Bush que o candidato republicano acabou por cometer uma das maiores gafes daquelas eleições. O tema era a energia e McCain trouxe à tona uma lei que foi a votos no Senado que “estava carregada com prendinhas, milhares de milhões para as petrolíferas, que foi patrocinada por Bush e Cheney”. “Sabem que é que votou a favor dela? Poderiam nunca vir a saber”, continuou. E, depois, com o dedo apontado para Obama, disse: “That one.” Algo que pode ser traduzido como “aquele ali”.

Logo após o debate, foram várias as vozes que demonstraram desconforto perante o tratamento de McCain em relação a Obama. “O senador Obama tem um nome”, reagiu o diretor de campanha dos democratas, David Axelrod. “Seria de esperar que o seu adversário usasse esse nome.” De simples desrespeito até a racismo, muitos criticaram a escolha de palavras do candidato republicano. Houve até quem chegasse a fazer dinheiro com a gafe, vendendo na internet merchandising com o logótipo de campanha de Obama onde, em vez do nome do democrata, aparecia “That One”.

No final de contas, Obama venceu as eleições com 52,9% dos votos, à frente dos 45,7% de McCain.

2012. Romney e os seus “dossiers cheios de mulheres”

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A história eleitoral dos EUA tem provado que derrotar um Presidente em funções é uma proeza que não cabe a todos. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, só dois o conseguiram: Ronald Reagan, que em 1980 negou a reeleição a Jim Carter; e Bill Clinton, que impediu George H. W. Bush de conseguir um segundo mandato.

Por isso, a tarefa de Mitt Romney não era fácil. Como é que o ex-governador do Massachusetts seria capaz de evitar uma reeleição de Barack Obama, que à beira das eleições de 2012, e depois de quase quatro anos no poder, tinha uma taxa de aprovação de 52%?

Certamente terá passado pela cabeça de Romney e da sua equipa de que os republicanos tinham muito terreno para ganhar no voto feminino. Em 2008, 56% de mulheres votaram em Obama e apenas 43% escolheram McCain. Se queria ganhar em 2012, Romney teria de abrir os braços ao eleitorado feminino.

No segundo debate entre Romney e Obama, surgiu a seguinte pergunta: “Como é que pretende corrigir as desigualdades no local de trabalho, especificamente as que dizem respeito às mulheres que ganham 72% daquilo que os seus colegas homens ganham?”.

Primeiro, respondeu Obama, que falou da mãe. “Eu fui criado por uma mãe solteira que teve de pagar os seus estudos enquanto tomava conta de duas crianças”, disse, para depois responder mais diretamente à pergunta. E, depois, chegou a vez de Romney.

“É um assunto importante, sobre o qual eu aprendi bastante, sobretudo quando era governador do meu estado”, começou por dizer. Segundo o candidato republicano, quando chegou a altura de formar um executivo, as candidaturas que chegavam à sua campanha eram maioritariamente de homens. Perante esse desequilíbrio, Romney e a sua equia fizeram “um esforço para ir à procura de mulheres que tivessem as qualidades necessárias para serem membros do nosso gabinete”. Para isso, contactaram vários “grupos de mulheres”. E o que é que estes grupos deram a Romney e à sua equipa? “Trouxeram-nos dossiers cheios de mulheres”, disse Romney.

A ideia foi boa, a escolha de palavras é que não. Romney acabou por ser alvo de chacota nas redes sociais — estas foram as primeiras eleições em que o uso do Facebook e do Twitter estava verdadeiramente massificado nos EUA. Houve algumas mulheres interpretaram as palavras do candidato republicano de uma forma bastante literal, posando dentro de falsos dossiers gigantes.

Outro tema daquele debate foi o ataque terrorista ao consulado norte-americano em Benghazi, na Líbia, a 11 de setembro de 2012, que resultou na morte de 4 cidadãos norte-americanos. Durante o debate, Mitt Romney acusou Obama de ter demorado 14 dias a dizer que o ataque tinha sido um “ato terrorista”, quando, na verdade, não foi bem assim. Logo no dia seguinte ao incidente, Obama fez um discurso onde usou aquela expressão não uma, mas três vezes.

À acusação de Romney, Obama disse: “Vá ver a transcrição”. Enquanto isso, a moderadora, Candy Crowley, negou a afirmação de Romney: “É um facto, ele disse isso (antes dos 14 dias)”. Obama gostou do que ouviu e pediu à jornalista da CNN que o repetisse: “Pode dizer isso um bocadinho mais alto, Candy?”.

Apesar de as sondagens, em média, colocarem Obama apenas 0,8% à frente de Romney, o democrata acabou por vencer com uma margem relativamente confortável de 3,9% dos votos. E, já agora, quanto ao eleitorado feminino, os esforços de Romney não surtiram grande efeito: Obama conseguiu o voto de 55% das mulheres e o republicano ficou-se pelos 44%.

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