Quem comandou as negociações em Bruxelas não foi a Alemanha, não foi a França nem o Eurogrupo ou o Conselho Europeu. Foi simplesmente a Albânia. Como foi isso possível? A Albânia não faz parte da UE. A Albânia é paupérrima. Ninguém conta com a Albânia para nada. Por isso mesmo. Tsipras é grego e sabe bem que a Albânia seria o futuro do Grécia caso ele não chegasse a acordo com os credores.

Uma coisa é ser demagogo, fazer bluff, levar o povo para aventuras desastrosas. Tudo isso Tsipras fez mas cedeu quando percebeu que, se não assinasse um acordo com os credores, só lhe restava ver a Grécia transformada no próximo parque temático dos esquerdistas europeus. E esse destino os gregos conhecem-no bem pois têm-no ali mesmo ao lado, na Albânia.

A Albânia que não cedeu ao capitalismo, a Albânia que lutou contra o revisionismo. A Albânia que estava contra os grandes blocos. A Albânia que disse não. A Albânia que acabou tão irrelevante e tão pobre que os albaneses nem têm direito a que se fale da sua crise humanitária, pois a miséria que na Grécia comove, na Albânia chama-se qualidade de vida. Traço pitoresco nas notas dos viajantes, relato de jornalistas em busca do “autêntico”.

Os gregos de direita e de esquerda aldrabaram as contas do país e acharam que os credores os tinham de sustentar porque eles já deviam imenso, mas todas essas tropelias visavam arranjar dinheiro para os bolsos dos gregos. Jamais os gregos estiveram interessados em sair do sistema. Antes pelo contrário. Se possível viver à conta dele mas sempre dentro dele, pois melhor ainda não se inventou.

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Sem petróleo como a Venezuela (o que não quer dizer que dentro de poucos anos a Grécia não esteja a explorar intensivamente gás) e sem uma forte agricultura como tem a Argentina, à Grécia em ruptura com os credores restava tornar-se economicamente uma nova Albânia. Nas primeiras semanas não lhe faltaria a boa imprensa. Foi assim com a “libertação” do Vietnam e do Cambodja. Foi assim com as “zonas libertadas” da Guiné. Foi assim com os “movimentos de libertação” de Moçambique e Angola. Tem sido assim com a Faixa de Gaza. E o comandante Marcos que depois de libertar Chiapas ia libertar o México? E Guantanamo que ia fechar? E a primavera árabe?… Depois a Grécia seria rapidamente esquecida, como sucede com todas as causas das almas que se dizem progressistas e que até há pouco faziam cordões humanos semana sim semana não. Agora já não dão as mãos, escrevem sobre a malvadez da “senhora Merkel” (porque não haverá o “senhor Hollande”?) nas redes sociais enquanto escolhem compotas biológicas e embalagens de quinoa em espaços gourmet.

Durante o Verão alguns eurodeputados iriam descontrair dançando o sirtaki nas suas rentrées. Já mais para o Outono alguns professores universitários europeus iriam fazer umas palestras em Atenas. Nas reportagens de rua os jornalistas disputariam o mesmo velho grego que diriam símbolo do orgulho indestrutível dos descendentes de Péricles. Depois todos arrumariam a mala e debandariam para outras paragens. Pouco a pouco a Grécia iria desaparecer das notícias, porque as notícias não confirmavam o que a esquerda tinha sonhado para a Grécia. E quando a esquerda não vê os seus sonhos confirmados faz de conta que nunca aconteceu nada e logo se dedica afanosamente a outra libertação.

Mas Tsipras não lhes fez a vontade. Não por uma questão ideológica. Foi simplesmente manha e pragmatismo: a não ser os credores do costume ninguém pôs dinheiro na mesa dos gregos e estes em nome de ideologia alguma estão dispostos a vê-la vazia. Acreditaram primeiro que “bater o pé à Merkel” seria a solução. Viram que não era e por ironia não só se confrontaram com a revolta dos pequenos países da UE como a proposta alemã de saída temporária da Grécia do euro talvez fosse a que melhor servia os interesses gregos. Por fim a Grécia ficou no euro. Tsipras perdeu o Syriza e o respeito de Varoufakis, mas os multibancos vão voltar a ter dinheiro. Lá mais para o fim do Verão a esquerda há-de arranjar uma nova causa – a independência da Catalunha? –, a França continuará a apostar em estratégias suicidas para enfraquecer a Alemanha (o euro destinava-se segundo Miterrand a combater a hegemonia alemã!), a Grécia fará de conta que reforma… Só a Albânia continuará pobre e ignorada.