Petro Poroshenko tomou posse este sábado como Presidente da Ucrânia. Num discurso “emotivo”, que foi proferido, em parte, em russo, traçou um plano para trazer de volta a paz às regiões separatistas. Ofereceu proteção política ao povo do leste e garantiu que não queria vingança nem guerra com a Rússia. Ainda assim, não vai abrir mão da Crimeia, que “será sempre ucraniana”, disse.

“Não quero guerra. Não quero vingança, apesar dos enormes sacrifícios feitos pelo povo ucraniano”, disse Petro Poroshenko, ex-empresário e dono de uma das maiores marcas de chocolates da região. Na tomada de posse enquanto Presidente da Ucrânia aproveitou o discurso do juramento para estabelecer um programa para acabar com a crise, que inclui a descentralização do poder para as administrações regionais, a garantia de proteção para os ucranianos do leste, falantes de russo, e um corredor seguro para as forças russas voltarem para casa.

Poroshenko disse estar disposto a reconhecer o estatuto da língua russa, mas apenas a nível regional e não estatal, opondo-se à federalização do país como exigem os rebeldes do leste. A Ucrânia deve ser “um Estado unitário”, sublinhou. Sobre o gás russo, o atual Presidente garantiu que a Ucrânia não importará gás russo aos atuais “preços de loucura”. “Queremos diversificar o abastecimento. Queremos a independência energética”.

Mais do que tudo, pediu aos separatistas da região de Donetsk e Lugansk para baixarem as armas e assinarem o cessar-fogo prometido, acrescentando que garantia indemnizações para todos aqueles que não “sujaram as mãos com sangue”. Para Poroshenko, as negociações de paz têm de ser aceites pelos dois lados: “Falar com terroristas e assassinos não é o caminho”, rematou.

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No Twitter, vários ucranianos, jornalistas e membros das comitivas internacionais seguiram de perto a cerimónia e reportaram, em inglês, os principais momentos, com elogios ao discurso “emotivo” e “inspirador” do recém-eleito presidente.

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“O nosso objetivo é aderir à União Europeia”, disse Poroshenko, o que lhe valeu uma enorme ovação de pé.

No discurso, Poroshenko mostrou ser um grande defensor de um Acordo de Associação com a União Europeia, que deverá ser fechado em breve e logo que Bruxelas dê “luz verde”, mas cuja rejeição foi o detonador dos protestos que desembocaram em fevereiro na queda do presidente Viktor Ianukovich. “Vemos [o acordo] como um primeiro passo para a entrada de pleno direito da Ucrânia na União Europeia”, disse, acrescentando que quer ver o acordo firmado antes do dia 27 de junho.

As declarações de Poroshenko mereceram resposta de Herman Van Rompuy, presidente do Conselho Europeu, que reagiu logo naquela rede social: “todos os estados vizinhos devem respeitar a Ucrânia, a sua integridade territorial e os seus laços com a União Europeia”.

É a cerimónia mais barata da história da Ucrânia, diz um correspondente norte-americano em Kiev. “Impressionante na mesma”, diz.

Portugal fez-se representar pelo secretário de Estado para os Assuntos Europeus, Bruno Maçães, que também relatou o ambiente vivido neste dia importante para a história da Ucrânia, com a população a cumprimentar com entusiasmo o novo Presidente.

A cerimónia ocorreu no Parlamento ucraniano, na capital Kiev, e contou com a presença de dezenas de figuras do panorama político internacional – incluindo o vice-presidente norte-americano Joe Biden, o presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy, e o chefe da diplomacia francesa, Laurent Fabius. A Rússia fez-se representar, não por Vladimir Putin que, nas vésperas das eleições tinha garantido reconhecer a legitimidade do presidente eleito, mas pelo embaixador russo em Kiev, Mikhail Zurabov.

A par da tomada de posse, os confrontos continuaram este sábado nas regiões orientais do país. O correspondente da BBC em Donetsk afirma que houve relatos de violência no reduto rebelde Slaviansk e tiroteios em Mariupol. Entretanto, o Kremlin ordenou aos Serviços de Segurança para aumentarem a proteção na fronteira ucraniana para impedir a população de atravessar os dois países ilegalmente. Kiev afirma mesmo que Moscovo está a reforçar o envio de tropas militares para a região leste de Donbass – onde se incluem as regiões de Donestk e Lugansk -, acusações que a Rússia nega.

Rússia, uma peça chave para a paz

Reconhecendo que sem Rússia não haverá estabilização da região, Poroshenko espera garantir do Kremlin o compromisso de que não serão reconhecidas as autoproclamadas repúblicas populares de Donetsk e Lugansk, que anunciaram um novo Estado designado Nova Rússia (Novorossia), um termo histórico que já foi utilizado por Putin.

“Putin e eu conhecemo-nos muito bem”, disse Poroshenko, o oligarca também conhecido como “Rei do Chocolate” devido à sua empresa de doces Roshen, que tinha na Rússia um dos seus principais clientes até ao bloqueio das importações por Moscovo, garantindo que, apesar de ter declarado que a Ucrânia enfrenta “uma guerra e uma agressão”, quer normalizar as relações com a Rússia no prazo de três meses.

Na sexta-feira, num breve encontro com o Presidente russo Vladimir Putin à margem das celebrações do 70º aniversário da invasão da Normandia (norte da França), Poroshenko já tinha abordado a possibilidade de um cessar-fogo com as forças pró-russas.