Durão Barroso despediu-se esta sexta-feira, em Bruxelas, das cimeiras europeias. Após 10 anos, 2 mandatos e 75 cimeiras da UE e da zona euro, o presidente cessante da Comissão Europeia, que vai passar o testemunho no dia 3 de novembro ao luxemburguês Jean-Claude Junker, disse adeus aos líderes dos Vinte e Oito Estados-membros e ao presidente do Conselho, o belga Van Rompuy.

Numa cerimónia de despedida ao final da manhã, antes de terminar o Conselho Europeu, o português e o belga que deixa igualmente o cargo dentro de semanas, foram elogiados por Angela Merkel. A chanceler alemã, decana do Conselho Europeu, encarregou-se de falar em nome dos Vinte e Oito realçando o empenho de Barroso em defesa da Europa e das competências da Comissão Europeia. Em seguida, os chefes de Estado e de governo da UE ofereceram uma « fotografia de família » assinada por todos e um prato com a inscrição gravada « Let’s build Europe together », que consideram ter sido o lema do português durante estes 10 anos à frente da Comissão, quando nos tempos de crise apelava aos Estados-membros para a importância de se manterem unidos. Barroso agradeceu as palavras de Angela Merkel, desejou sucesso à próxima Comissão e apelou aos líderes para que apoiem Junker.

Na quinta-feira, no primeiro dia da cimeira, o jantar já tinha sido marcado pela saída de Barroso e Van Rompuy dos cargos que ocupam. A refeição dos líderes foi acompanhada de vinho da região do Alentejo (Cortes de Cima) e cerveja belga. «Penso que foi uma grande combinação. Não quero dizer que foi por causa disto que alcançámos conclusões tão estimulantes e inspiradas», afirmou o presidente cessante da Comissão em conferência de imprensa. O presidente do Parlamento Europeu também comentou o cessar de funções de Barroso. Ao Observador, Martin Schulz reconheceu que antes de ocupar as suas atuais funções, manteve divergências políticas com presidente da Comissão. Afirma «não partilhar muitas das opiniões» do português mas reconhece «que ele tentou praticar uma certa responsabilidade social ». « Muitas vezes não o suficiente, mas tinha uma certa abertura para o equilíbrio entre as medidas económicas e a proteção social», disse Schulz. Barroso é um homem que defendeu com todas as suas forças «a ideia de uma integração europeia aprofundada» e que «se empenhou na sua função» de presidente da CE.

10 anos em «modo de crise»

A cimeira foi dominada por duras negociações e intensas discussões em torno de dois temas que, aliás, também marcaram os 10 anos em que Barroso esteve à frente da Comissão Europeia: a aprovação do pacote climático e energético, que pretende garantir a independência energética dos Vinte e Oito, com a crise do gás e a tensão Ucrânia-Rússia em pano de fundo ainda por resolver; e a situação económica e a retoma do crescimento na UE, por forma a ultrapassar as consequências da crise. Esta foi, aliás, a palavra que prevaleceu durante a sua década em Bruxelas. Durão Barroso foi um presidente «em modo de crise». Quando em novembro de 2004 tomou posse, o líder do executivo comunitário não imaginou «o que vinha por diante», como o próprio reconhece no livro-testemunho com as suas primeiras reflexões em jeito de balanço « A Testimony by the President », hoje anunciado.

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De facto, em 10 anos viria a enfrentar três graves crises – crise constitucional, crise financeira e económica, e a crise na Ucrânia. «Ao contrário das previsões de desintegração da zona euro ou de fragmentação da UE, mostrámos uma extraordinária resiliência da nossa Europa», diz o presidente cessante no livro. «Agora temos uma Europa que está unida, aberta e mais forte. Uma Europa preparada para enfrentar o futuro», sublinha no seu primeiro balanço.

Barroso felicita Passos

O compromisso sobre o pacote Clima e Energia alcançado na madrugada de sexta-feira, em Bruxelas, prevê metas vinculativas para a redução das emissões de gases com efeito de estufa (40%), a incorporação de energias renováveis (27%), e objetivos indicativos em relação ao aumento da eficiência energética (27%) e interconexões (15%). Portugal pretendia um acordo que incluísse de forma decisiva metas para as interconexões energéticas e Barroso fez questão de felicitar Passos Coelho. “As conclusões estão perfeitamente bem alinhadas, com compromissos calendarizados, com um mecanismo de seguimento que nunca vi para um objetivo destes, com a Comissão encarregada de apresentar regularmente os resultados. Isso está conseguido, e por isso só posso felicitar Portugal e o primeiro-ministro por este bom objetivo alcançado”, afirmou Durão Barroso.

Os últimos dias em Bruxelas

Na próxima semana, Barroso mantém uma intensa agenda de encontros para despedir-se de colaboradores e pessoal da CE, de membros do corpo diplomático, políticos e conselheiros. Participa numa cerimónia de despedida no Palácio das Belas Artes de Bruxelas com intelectuais e artistas no âmbito do projecto que visa debater o futuro da Europa. Jantará com os vinte e sete comissários membros do seu executivo, com a direção do PPE, e almoçará igualmente com os próximos presidentes da Comissão (Junker) e do Conselho Europeu, o polaco Donald Tusk. Foram muitos os momentos intensos vividos nos últimos 10 anos na CE. E muito terá Barroso para contar nas memórias que promete um dia escrever.

 

* Reportagem de Vasco Gandra, em Bruxelas

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