A proposta não avançou mas criou muito ruído. Depois de apresentada por dois deputados (um do PS e outro do PSD), houve apoios públicos, recuos privados, aprovação da proposta, pedido de nova votação, e retirada antes desta. No entanto, é preciso perceber o que está em causa.

Quando foram criadas as subvenções vitalícias?

Em 1985. A proposta foi apresentada no final de 1984 por um Governo do bloco central liderado por Mário Soares (PS), e cujo vice-presidente é o atual ministro dos Negócios Estrangeiros, Rui Machete.

Quem tem direito a receber?

Inicialmente, todos os ex-membros do Governo, da Assembleia da República ou juízes do Tribunal Constitucional (que não fossem juízes de carreira) que tivessem exercido pelo menos oito anos destes cargos depois do 25 de abril de 1974 tinham direito a estas subvenções vitalícias.

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Quem mudou as regras?

Em 2005, logo no início do seu primeiro Governo, José Sócrates fez mudanças profundas na forma de atribuição destas subvenções. Com exceção do Presidente da República e dos presidentes dos governos regionais dos Açores e da Madeira, os restantes políticos perderam o direito às subvenções.

Na altura, foi deixado um estatuto de transição para os deputados que estavam em funções há mais de 12 anos, que teria ainda direito a subvenção correspondente a 48% do ordenado base quando atingisse os 55 anos de idade. Os restantes perderam direito, e isso incluiu todos os membros de Governo desde essa altura.

O que mudou o PSD?

Na proposta de Orçamento do Estado para 2014, apresentada em outubro do ano passado, o Governo avançou com a suspensão do pagamento de suspensões que ultrapassassem os 2000 euros ou que tivessem um património imobiliário superior a 240 vezes o indexante dos apoios sociais, o equivalente a pouco mais de 100,6 mil euros.

Na altura, algumas vozes da coligação, como é o caso de o agora secretário de Estado da Administração Interna, João Almeida, (que era deputado do CDS-PP), até defendia a eliminação por completo das subvenções, tal como propôs hoje o PCP (mas que o Governo e o seu partido não acompanharam). João Almeida, que falava em nome pessoal, mostrou-se contra a atribuição de subvenções na conjuntura que o país vivia poucos dias antes de ser conhecida a proposta de orçamento que as suspendia no valor que superasse os 2000 euros.

Mas a polémica já vinha de trás. As notícias que antecederam a proposta de orçamento diziam que as subvenções seriam beneficiadas em relação às restantes pensões, o que levou o Governo a apressar-se a garantir um corte de 15% nestas a incluir no Orçamento do Estado para 2014.

O que foi aprovado e retirado agora

Os deputados Couto dos Santos, do PSD, e José Lello, do PS, apresentaram uma proposta em nome individual que pedia que a parcela acima de 2000 euros que estava suspensa fosse reposta.

Essa parcela seria, no entanto, sujeita a um corte de 15%, para além do corte já em vigor.

Quais são as razões invocadas?

A Constituição. Dizem os deputados: “Tendo presente a jurisprudência do Tribunal Constitucional, a solução adotada relativamente às subvenções mensais vitalícias na Lei do Orçamento do Estado de 2014 (art.º 77º da Lei nº 83-C/2013, de 31 de Dezembro), agora reproduzida no art.º 79º da Proposta de Lei 254/XII/4ª, exatamente com o mesmo conteúdo, enferma de inconstitucionalidade. Assim, e com vista a evitar que se reincida em tal inconstitucionalidade, propõe-se a alteração da redação do art.º 79º, tendo em consideração a referida jurisprudência constitucional, que aponta para o caracter não definitivo das medidas excecionais de ablação retroativa das prestações, para a garantia igual das expectativas legítimas sobre opções de vida já consumadas, e para a sua proporcionalidade e igualdade”.

Ou seja, apesar de estar na lei, de ter sido aprovada pela maioria, os deputados entendem que a suspensão atualmente em vigor é inconstitucional pela sua retroatividade e por ser uma medida excecional e não definitiva.

Em que ficamos?

Na mesma. As subvenções vitalícias, e das respetivas pensões de sobrevivência continuam suspensas acima de 2000 euros, e abaixo de 2000 euros o valor estará sujeito a avaliação à luz da chamada condição de recursos.