É um filme sombrio, que mostra uma Rússia rural, longínqua, e vidas marcadas pelo consumo permanente de vodka. A sua história passa-se numa vila no norte do imenso país onde um autarca corrupto quer expropriar indevidamente os donos das casas. A película critica não só as autoridades políticas, mas também a Igreja Ortodoxa. E o retrato que faz do país está longe de ser lisonjeiro.

Leviathan, do realizador siberiano Andréi Zviagíntsev, deveria ter estreado em outubro na Rússia, mas o autor começou por ser obrigado a criar uma ‘versão mais limpa’ para passar no país de origem, devido à nova legislação que proíbe o uso de palavrões em espetáculos, como refere o Guardian. É essa nova versão que estreará no início de fevereiro mas que não está, mesmo assim, livre das críticas do governo russo que acusa o realizador de se ter ‘vendido’ ao ocidente para poder ser premiado.

Mas nem todos pensam da mesma forma. Sentindo-o como uma crítica social, muitos russos apoiam o filme, havendo a circular no país uma versão integral, pirata, de Leviathan. Ainda segundo o Guardian, o produtor, Alexander Rodnyansky, não se importa que esta versão pirata exista, mas sugere que as pessoas que vejam esta edição ilegal doem alguma coisa às instituições de caridade.

Leviathan já foi premiado como o melhor guião no Festival de Cannes, ganhou um Globo de Ouro para melhor filme estrangeiro e está nomeado para o Óscar na mesma categoria. Mas nenhuma destas distinções convence o ministro da Cultura russo, Vladimir Medinsky, que acusa Andréi Zviagíntsev de ter realizado um filme anti-Rússia, que não retrata os verdadeiros russos e de estar influenciado pela visão norte-americana dos russos. Mas o realizador descarta a crítica, classificando o filme de intemporal e universal. “Esta história é completamente universal, não só num contexto geográfico especial mas no sentido de tempo. Não é sobre um momento concreto.”

“Os filmes recheados de um espírito de desespero e falta de sentido para a existência não deviam ser, na minha opinião, financiados pelos contribuintes”, disse ao jornal Izvestiya Vladimir Medinsky, cujo ministério financiou em 30% o filme que agora critica. Andréi Zviagíntsev, que garante não ter recebido financiamento do ocidente, contrapõe que “nenhum ministro se pode imiscuir da minha relação com o mundo e com as pessoas que me rodeiam”, como referiu ao diário RBK, citado por EL País.

Um grupo da Igreja Ortodoxa tem tentado que o filme seja banido e algumas salas de cinema no norte do país dizem sentir-se pressionadas pelas autoridades locais para não passar o filme. Mas o padre Andrei Kurayev, representante de um lado mais liberal da igreja, argumenta que “os russos estão preparados para falar e aceitar a verdade”, refere o Financial Times. Sobre a acusação de que o filme ser anti-russo, o padre lembra que “Pushkin, Griboedov, Tolstoy e Dostoevsky também foram acusados do mesmo”.

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