A Sociedade de Avaliação Estratégica e Risco (SaeR) realizou um estudo, encomendado por Ricardo Salgado, que concluiu que o supervisor bancário e o Governo falharam na condução do processo de intervenção no Grupo Espírito Santo (GES) e que corrobora a tese do ex-presidente do BES de que há outros culpados para o colapso do grupo financeiro que não apenas a crise financeira.

Nas conclusões da obra, que conta com quase 400 páginas, é realçado o papel determinante da crise financeira global para a derrocada do GES, que tinha “um forte relacionamento com a economia” e “estava muito relacionado com os setores que estiveram no epicentro da crise”, mas é dito que “a crise financeira, só por si, não explica o colapso” do GES.

“A crise financeira criou o ambiente que acabou por potenciar as falhas fundamentais que se autorreforçaram. Essas falhas determinantes estão também no comportamento dos atores, nomeadamente nos gestores do grupo e nos decisores públicos”, lê-se no livro “Caso BES, a realidade dos números”, com as conclusões do relatório que vai ser apresentado esta segunda-feira’.

O livro coordenado por José Poças Esteves, presidente da SaeR, e Avelino de Jesus, professor universitário, identifica várias falhas.

A falha mais importante encontrada no estudo prende-se com a atuação dos decisores públicos, leia-se Banco de Portugal e Governo. No relatório da Saer é dito que “o processo de intervenção dos decisores públicos, nomeadamente o Banco de Portugal e o Governo” parecem não ter “levado em consideração os factos e as questões fundamentais que estavam em causa, nomeadamente os que se prendem, não só com o sistema financeiro, mas, mais importante, com a estrutura e o modelo de desenvolvimento da economia portuguesa, como um todo”.

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E reforçaram: “De facto, perante a necessidade fundamental de melhorar a dimensão dos centros de racionalidade e de decisão da economia portuguesa, o colapso e o desmembramento de um conglomerado como Grupo Espírito Santo era uma hipótese que merecia diferente abordagem“.

Esta conclusão vem anexada a uma outra. Para os autores, os conglomerados mistos têm uma grande importância “para a melhoria da produtividade e para o crescimento económico, a preservação e a promoção de grupos com dimensão adequada”. E por isso defendem que é “fundamental a mobilização de todos os recursos e competências necessárias para preservar qualquer centro de decisão em risco, nomeadamente aqueles com a dimensão e a história com que se apresentava” o GES, considerando que “a opção tomada pelos decisores públicos portugueses de resolução através do Fundo de Resolução não era única e havia várias alternativas possíveis”.

E realçaram que “não seria possível criar condições de estabilidade e sustentabilidade para salvar o BES [Banco Espírito Santo] sem encontrar uma solução de estabilidade e sustentabilidade” para o GES.

Falha de gestão

A primeira falha identificada no livro resulta da “estrutura e da gestão” do GES, um conglomerado misto que exigia “a manutenção de um equilíbrio constante entre as áreas financeira e não financeira”.

Mas, sublinharam, “a maior exigência e excelência de gestão e resultados no setor financeiro pressiona no sentido de atrair para este setor os melhores recursos e as melhores competências. Por isso, esta realidade devia obrigar a forte e constante vigilância da gestão do grupo, que se revelou insuficiente”.

Daí, na opinião dos autores, “este desequilíbrio, sendo muito demorado, conduz necessariamente a que o setor não financeiro tenda a parasitar o setor financeiro”.

A 03 de agosto de 2014, o Banco de Portugal tomou o controlo do BES, após a apresentação de prejuízos semestrais de 3,6 mil milhões de euros, separando a instituição em duas entidades: o chamado ‘banco mau’ (um veículo que mantém o nome BES e que concentra os ativos e passivos tóxicos do BES, assim como os acionistas), e o banco de transição que foi designado Novo Banco.