Os Jogos Olímpicos de 2016, no Rio de Janeiro, não serão suficientes para dinamizar a economia brasileira e retirá-la da recessão profunda em que vive. Num relatório de análise, a companhia de seguros de crédito Cosec, através da sua acionista Euler Hermes, estima que o impacto positivo não será superior a 0,05 pontos percentuais do PIB (produto interno bruto). Não é um valor animador para o Brasil nem para os seus parceiros comerciais, entre os quais está Portugal.
É uma “falsa partida”, concluem os economistas da Cosec/Euler Hermes, que não irá salvar o Brasil de uma contração de 3,5% do PIB em 2016, depois da quebra de 3,8% em 2015. “Tal como no Campeonato Mundial de futebol, as Olimpíadas não irão dar um impulso significativo à economia brasileira”, pode ler-se no relatório assinado por Daniela Ordoñez e Sabrina Delsert, economistas da Euler Hermes.
“Os Jogos vão contribuir com apenas 0,05 pontos percentuais para o crescimento em 2016”, sobretudo por via de um aumento do investimento e do consumo, antecipam as economistas. Estima-se um investimento total em infraestruturas na ordem dos 38,5 mil milhões de reais – “relativamente pouco, tendo em conta o tamanho da economia” – mas o consumo deverá beneficiar com os 320 mil turistas que os Jogos deverão trazer à cidade e ao país.
O investimento e o consumo não irão, porém, estimular o mercado de trabalho de forma decisiva: não serão criados mais de 120 mil empregos temporários, estima a Cosec/Euler Hermes. É uma “gota no oceano”, acrescenta a empresa de seguros de crédito, notando que a população ativa no Brasil ascende a 100 milhões de pessoas.
Este efeito positivo limitado passará praticamente despercebido quando for colocado em perspetiva. A turbulência política, os desequilíbrios estruturais e as condições externas adversas (preços baixos nas matérias-primas, desaceleração económica na China e as subidas da taxa de juro pela Reserva Federal dos EUA) empurraram o Brasil para a pior recessão desde 1990.”
Depois das quebras de 3,8% em 2015 e de 3,5% (estimada) em 2016, talvez o Brasil consiga ter, em 2017, uma economia… estagnada, diz a Cosec/Euler Hermes. Quanto ao emprego, “o pequeno impulso (de empregos temporários e com baixas qualificações) não será suficiente para inverter a tendência negativa no mercado laboral brasileiro”: os economistas notam que “a taxa de desemprego está a subir rapidamente e atingiu os 11,2% em maio, acima dos 8% no ano passado. Estimamos que o desemprego oscile numa média de 12,8% em 2017″.
Economia brasileira talvez volte a terreno (ligeiramente) positivo em 2017
Dívida e inflação. Duas dores de cabeça
Os Jogos Olímpicos vão trazer, também, más notícias para o endividamento público e privado e para a taxa de inflação no Brasil.
Quanto à dívida, estima-se um aumento que corresponde a 0,4 pontos percentuais do PIB, concentrado no Rio de Janeiro — um aumento que não é desmedido mas que “vem em má altura“, diz a Cosec/Euler Hermes. Porquê “em má altura”? As economistas lembram que a dívida pública no Brasil era, em 2013, de 63% do PIB; em 2015 subiu para 74% do PIB e “deverá atingir 90% algures em 2017“.
Devido à subida do endividamento, existem “riscos”, sobretudo ao nível sub-soberano, isto é, no Estado do Rio de Janeiro. “Nos últimos meses, o Estado do Rio de Janeiro tem falhado na prestação de serviços básicos, atrasos no pagamento de pensões e salários na Função Pública. Também falhou um pagamento de juros à Agência Francesa de Desenvolvimento em maio”, lembra a empresa de seguros de crédito. O Rio de Janeiro decretou estado de emergência financeira e já recebeu um pacote de contingência de 2,9 mil milhões de reais (cerca de 800 milhões de euros) para conseguir terminar as obras para os Jogos Olímpicos e para garantir a segurança no evento.
A dívida será, também, um problema para o setor privado. A Cosec/Euler Hermes prevê um aumento de 5% no número de insolvências empresariais por causa dos Jogos Olímpicos. Muitas dessas falências serão empresas que foram criadas em antecipação aos Jogos Olímpicos e que terão muitas dificuldades em manter a porta aberta.
Outra dor de cabeça será a subida dos preços. E esse efeito na inflação, ao contrário do impacto positivo no emprego, será duradouro. A taxa de inflação em maio foi de 9,3%, o dobro do objetivo do banco central, e o ritmo de subida dos preços não deverá abrandar antes de 2017.
“Preocupações crescentes dos empresários portugueses no Brasil”
A “falsa partida” na economia brasileira não é apenas uma má notícia para Terras de Vera Cruz, mas também para os países que têm relações comerciais com o Brasil. Entre esses países está, é claro, Portugal.
Ao Observador, Miguel Gomes da Costa, presidente da Cosec, afirma que “de acordo com dados dos INE recentemente divulgados as exportações para o Brasil continuam a recuar. No final de maio ficaram-se pelos 185 milhões, valor que representa uma queda de 21% face ao período homólogo, depois da queda de 10% em 2015″.
O responsável afirma que “estes dados refletem não só o estado da economia brasileira e as suas repercussões para os parceiros comerciais do Brasil, incluindo Portugal, como também é uma evidência das preocupações crescentes que os empresários nacionais têm em relação à evolução da atividade neste mercado e ao risco comercial que o mesmo representa de momento.”