Sobre a Alemanha nazi já foi quase tudo escrito. Mas um novo livro, do escritor alemão Norman Ohler, descreve um novo protagonista na história do Terceiro Reich: as drogas. De acordo com o livro Der Totale Rausch, agora publicado em 18 línguas, o próprio Adolf Hitler era viciado em metanfetaminas e também consumia cocaína, heroína e morfina. E a droga teve um papel relevante no curso da história, até agora não estudado. “Penso que as drogas não eram uma prioridade para os historiadores”, sublinha, em entrevista ao jornal britânico The Guardian.

Quando um amigo lhe deu a ideia de que as drogas poderiam ter tido um papel mais importante do que se pensava na história da Alemanha de Hitler, Ohler pensou em escrever um romance. Mas, enquanto investigava os documentos do médico pessoal de Hitler, Theodor Morell, o autor chegou à conclusão de que “a realidade era melhor do que a ficção”.

Na altura, as drogas eram ilegais. A imagem que Hitler passava para o exterior era a de que “não bebia, não fumava, praticamente só comia vegetais e não tocava em mulheres”, dizia um dos elementos do seu núcleo duro em 1930. Os consumidores de droga eram considerados criminosos, e muitos foram enviados para campos de concentração. O uso de drogas foi rapidamente associado aos judeus, considerados “essencialmente toxicodependentes”, escreve o The Guardian.

Pervitin: a droga do regime

Numa Alemanha que lutava diariamente para acompanhar o ritmo frenético de Hitler, Fritz Hauschild, o cientista responsável por uma farmacêutica em Berlim, desenvolveu um medicamento que permitia aguentar 50 horas acordado. Oficiais do partido de Hitler, secretárias, mas também maquinistas e atores, começaram a usá-lo diariamente para se manterem no ritmo de Berlim. Mas o Pervitin era viciante e rapidamente todos começaram a depender “do Nacional Socialismo em cápsula”. Até os soldados começaram a depender do Pervitin para lutar contra o sono, o maior inimigo naquela guerra.

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Se não fossem as drogas, escreve Ohler, nem teria acontecido a invasão da França. “Quando Hitler ouviu o plano para invadir através de Ardenas, adorou. Mas um comandante disse: não é possível, à noite temos de descansar e os aliados vão retirar e nós vamos ficar presos nas montanhas. Mas depois o estimulante foi lançado, o que lhes permitiu ficar acordados durante três dias e três noites. Rommel e todos os comandantes dos tanques estavam drogados”, assegura.

Já perto do final da guerra, os alemães desenvolveram uma frota de pequenos submarinos, pilotados apenas por um soldado. A ideia era invadir Londres entrando pelo rio Tamisa, mas só seria possível levar estes submarinos até à capital britânica se os pilotos pudessem estar acordados durante uma série de dias. Foi aí que surgiu uma nova droga, uma pastilha elástica de cocaína que chegou a deixar os soldados acordados durante sete dias.

O medicamento foi testado em campos de concentração. Os prisioneiros tomavam a pastilha e eram forçados a andar até caírem, durante dias a fio. Já os marinheiros foram obrigados e estar durante vários dias dentro dos submarinos, minúsculos, sempre acordados, o que levou a frequentes ataques psicóticos. Muitos deles acabaram por se perder.

O próprio Hitler teve o seu historial de dependência de drogas, após ter ficado doente, em 1941. Quando as vitaminas que tomava deixaram de fazer efeito, Hitler começou a utilizar substâncias cada vez mais fortes — e mais viciantes. Começou por tomar hormonas animais, e, já no fim da vida, o seu médico pessoal começou a dar-lhe Eukodal, um opiáceo semelhante à heroína, que deixava Hitler num estado eufórico. Rapidamente, começou a juntar o Eukodal com cocaína, que o médico lhe tinha prescrito para um problema de ouvidos.

As revelações, descritas ao detalhe no livro Der Totale Rausch, mostram que a ideia que se tem atualmente sobre o regime de Hitler está bastante errada. “Pensa-se que o nazismo era ordenado. Mas era um caos completo”, garante o autor do livro, rematando: “As metanfetaminas ajudaram as pessoas a manterem-se no sistema sem terem de pensar nele”.