A Inês tem oito anos e três irmãos. Como todas as crianças sírias refugiadas na Grécia, não houve timidez que a impedisse de se aproximar dos voluntários que ajudavam a sua família (e a de milhares de migrantes) nos abrigos em Atenas. Uma dessas voluntárias era Patrícia Amaral, responsável por preencher os cartões que são, para os recém-chegados, um passaporte para o conforto possível num campo de refugiados. Inês era diferente: a perigosa viagem que a trouxe da Síria para as portas europeias deixaram os óculos, imprescindíveis para que possa ver, completamente estragados. Estavam riscados, as lentes estavam esbranquiçadas e só tinham um dos aros. Patrícia decidiu ajudá-la. E deu o primeiro passo no projeto “Eye See a Better World Now“, que leva serviços de oftamologia até aos refugiados mais novos.

Patrícia Amaral explicou ao Observador que, em condições normais, seriam precisos três meses para que uma criança refugiada tivesse acesso a um par de óculos. A partir deste projeto esse tempo reduz-se para três ou quatro dias. Tudo porque, sozinha, a voluntária portuguesa em Atenas conseguiu estabelecer uma parceria entre um médico oftamologista que cobra um preço reduzido e uma loja de óculos com preços negociáveis. É assim que uma criança pode ter óculos novos por 60 euros, um valor que cobra os serviços do especialista e da ótica. “Quando eles põem os óculos é como se vissem um mundo novo, é um momento muito alegre”, conta patrícia. E não só alegre, mas também precioso. Inês, a menina que dá rosto ao projeto, recebeu os óculos novos numa caixa do Tweety e não os usou de imediato. Guardou-os numa prateleira da caravana onde mora. “Ela sabia que aquilo tinha valor e que não os queria estragar. Ao início desanimei, pensei que ela não tinha entendido o que era aquilo. Só depois é que a entendi”, confessa Patrícia.

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Foram 25 as crianças que já aderiram ao “Eye See a Better World Now“, muito graças ao passa-a-palavra entre pais e voluntários sobre o único projeto de oftamologia ligado à ajuda humanitária aos refugiados do Médio Oriente. E nem todas vivem em campos de refugiados, mas também nas comunidades de migrantes que se fixaram em prédios abandonados de Atenas. Mas nem todos os casos são fáceis de tratar: quem sofre de estrabismo, por exemplo, precisa de cirurgia. E como a Grécia é, para muitas delas famílias, um país transitório, preferem fixar-se numa nova morada e só então submeter as crianças a esses cuidados médicos. Além disso, nem todos podem financiar uma operação. É por isso que o “Eye See a Better World Now” permite aos internautas apadrinhar uma criança: basta enviar uma mensagem para a página de Facebook do projeto e entrar em contacto com Patrícia, a única envolvida na gestão da ideia. A partir daí, o padrinho receberá uma fotografia e algumas informações sobre a criança que irá ajudar. Pode então transferir o valor para o NIB de Patrícia (que está agora a tentar incluir uma opção para pagamento PayPal no projeto). Assim que a criança tiver os óculos, o padrinho recebe uma nova imagem do afilhado.

Agora que as aulas estão a começar, Patrícia admite que tem recebido mais pedidos. E também um maior número de relatos sobre crianças que, agora com óculos, têm maior capacidade de concentração na escola. Por enquanto, “Eye See a Better World Now” vai ficar-se por Atenas. A evolução do projeto a partir de agora vai ditar o seu futuro.

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