Como Ferro Rodrigues, presidente da Assembleia da República — e número dois do Estado –, “fechou a porta” ao apelo do CDS, a presidente do partido vai direta ao número um, o Presidente da República. Assunção Cristas e o líder parlamentar Nuno Magalhães vão esta sexta-feira a Belém pedir a Marcelo Rebelo de Sousa que exerça a sua magistratura de influência sobre a “ditadura da maioria” que está a “obstaculizar” os trabalhos do Parlamento. Mas não vão pedir a dissolução da Assembleia. A bola fica com Marcelo, que, antes de receber a delegação do CDS, ainda vai almoçar com Ferro Rodrigues, avançou o Expresso e confirmou o Observador junto de fonte da presidência da Assembleia da República.

Ao contrário do que disse Ferro Rodrigues durante o debate quinzenal desta quarta-feira, o CDS acredita que a atuação do Presidente da República sobre esta matéria está dentro dos poderes constitucionais do Presidente. “Há muita coisa que pode ser feita”, diz Nuno Magalhães ao Observador. “Falando em termos hipotéticos há muita coisa que o Presidente da República pode fazer no cumprimento dos seus poderes constitucionais: pode fazer uma declaração ao país, pode reunir-se com os partidos, pode fazer uma declaração à imprensa, pode fazer muita coisa. Nós vamos informá-lo e expor a situação”, explicou ao Observador, questionado sobre o que esperava o CDS da audição em Belém. Nuno Magalhães recusou, no entanto, comentar o almoço que o Presidente vai ter com Ferro Rodrigues minutos antes da audiência com os centristas.

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O anúncio da ida a Belém foi feito esta quarta-feira, durante o debate com o primeiro-ministro no Parlamento, quando Assunção Cristas anunciou ter pedido uma audição para se queixar do funcionamento da Assembleia da República. Já antes, no passado dia 15, numa conferência do jornal Eco, a líder democrata-cristã tinha admitido levar o assunto dos “direitos das minorias” a Belém tal era a sua preocupação. Em causa, acusa, está o facto de os partidos da maioria de esquerda estarem a “obstaculizar” o funcionamento da comissão parlamentar de inquérito à CGD, rejeitando os requerimentos potestativos (de caráter obrigatório) dos partidos minoritários da direita, que queriam o acesso aos documentos e comunicações trocadas entre o Governo e António Domingues.

Ao levantar a questão em pleno debate quinzenal com o primeiro-ministro, Assunção Cristas ouviu uma resposta torta do Presidente da Assembleia da República, que perante o anúncio da ida a Belém atirou que “a porta do [seu] gabinete estava sempre aberta para todos os deputados”. Mas o CDS não gostou da tirada do Presidente da Assembleia e Nuno Magalhães pediu a palavra para lembrar Ferro Rodrigues que tinha sido ele próprio a “fechar a porta na cara do PSD e CDS”. Isto porque, quando, na última reunião da conferência de líderes, PSD e CDS expuseram a Ferro Rodrigues a questão do suposto “bloqueio” aos trabalhos parlamentares, o Presidente da Assembleia acabou por ir em socorro da esquerda respondendo que é um “mau serviço transpor o que se passa na comissão de inquérito para a conferência de líderes”.

Dissolver a Assembleia? Nem tanto ao mar nem tanto à terra

Sem o apoio de Ferro, o CDS optou por ir queixar-se a Marcelo. “Tentámos fazer um apelo ao Presidente da Assembleia da República no sentido de exercer a sua magistratura de influência”, disse ao Observador Nuno Magalhães, referindo que, tendo esbarrado não só na esquerda como também em Ferro Rodrigues, o CDS decidiu ir à mais alta instância do Estado pedir isso mesmo: “Magistratura de influência”. Significa que o CDS vai queixar-se a Marcelo de que está em causa o “regular funcionamento das instituições” e, com isso, pedir a dissolução da Assembleia? Nem por isso.

Apesar de o “bloqueio” da maioria de esquerda pôr em causa, na visão da direita, o “normal funcionamento” do Parlamento, o CDS não vai a Belém dizer a Marcelo Rebelo de Sousa que quer a dissolução do Parlamento. “Não vamos exigir ou pedir nada”, diz Nuno Magalhães.

PSD diz estar em causa o regular funcionamento da AR. Mas não faz queixa a Marcelo

O CDS comunicou ao PSD “atempadamente” que iria dar este passo, mas os sociais-democratas não vão chegar a tanto. Esta quinta-feira, à saída de uma reunião da bancada do PSD, Luís Montenegro admitiu que era “assinalável que partidos políticos [CDS] se estejam a dirigir ao Presidente para poder colocá-lo ao corrente daquilo que se passa no Parlamento.” Ainda assim, deixou claro que o PSD não avança com a mesma queixa, pois “está na fase de poder, com a sua intervenção, ultrapassar estes boicotes e estes bloqueios”, dando como exemplo a constituição de uma segunda comissão de inquérito à CGD quando houve uma tentativa de “boicote” na primeira.

O objeto da próxima comissão de inquérito vai ser conhecido esta sexta-feira, sendo essa a maneira que o PSD e o CDS entendem poder contornar os obstáculos da maioria de esquerda à atual comissão de inquérito.