Em 2008 a Clínica dos Arcos, em Lisboa, procedeu a 27,3% de todas as interrupções voluntárias de gravidez (IVG) em Portugal. O que mudou desde o ano em que entrou em vigor a despenalização decidida em referendo a 11 de fevereiro de 2007? Muito pouco: em 2016 foi na Clínica dos Arcos que se fizeram 4.182 das 16 mil IVG registadas em todo o país, o que significa que esta clínica privada continua a ser responsável por mais de um quarto destas intervenções (26,2%).

A notícia foi avançada pelo Diário de Notícias, que perguntou ao Ministério da Saúde, à Administração Central do Sistema de Saúde e até à Clínica dos Arcos quanto pagou, desde 2008, o Serviço Nacional de Saúde à Clínica dos Arcos para fazer as IVG que o setor público não conseguiu assegurar — mas não obteve qualquer resposta.

Nos últimos dias, com a saída de centenas de enfermeiros especialistas dos hospitais públicos para os centros de saúde, vários profissionais de saúde têm previsto que esse número possa vir ainda a aumentar –ginecologia e obstetrícia são as especialidades mais afetadas, o que levou mesmo à suspensão temporária das consultas de IVG no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.

Ao jornal, Luís Graça, presidente da Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal, disse que o número de grávidas encaminhadas para o serviço privado para fazer IVG tem “tendência para aumentar, porque os hospitais estão a perder profissionais”. “Na região de Lisboa, há muitos hospitais que nunca fizeram, e os que fazem, como Santa Maria, Lisboa Central ou Garcia de Orta, estão a braços com saídas de enfermeiros especialistas e médicos. Confrontados com a diminuição de profissionais, os serviços de obstetrícia têm de fazer opções em relação ao que é prioritário. O que é necessário assegurar são os blocos de partos, as cirurgias ginecológicas e as enfermarias. A ter de cortar – embora eu seja contra – é no que tem alternativa noutros sítios, como a consulta de IVG”.

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