O sobreiro de Montargil — aquele que foi escolhido para o projeto de investigação Genosuber — tem entre 125 e 150 anos e, esta terça-feira, viu o seu genoma ser anunciado ao mundo, ou pelo, menos o primeiro “rascunho”. É a primeira que um sobreiro (Quercus suber) é analisado até às “letras” que formam a base da sua genética — mais de 900 milhões de pares de bases. O artigo foi publicado na revista Scientific Data, do grupo Nature, e resultou do trabalho, ao longo de quase cinco anos, de investigadores de várias instituições nacionais.

Para escolher este sobreiro, a equipa teve em consideração o potencial de continuar a produzir cortiça depois da sequenciação do genoma — até aos 180 ou 200 anos — e estar suficientemente isolada das azinheiras para se tratar de um “sobreiro puro” e não de um híbrido (resultante do cruzamento das duas espécies), escreveu o Público em 2013.

O sobreiro na Herdade dos Leitões, em Montargil (Portalegre), que foi sequenciado geneticamente

Mas para que precisamos de conhecer o genoma do sobreiro? Porque se pode detetar precocemente características de interesse, como a qualidade da cortiça, a tolerância às pressões ambientais ou a resistência às pragas, mas também porque se pode melhorar a espécie, aumentar a sua diversidade genética e certificar os produtos resultantes, explicou M. Margarida Oliveira, investigadora no Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier, da Universidade Nova de Lisboa, numa apresentação em 2013.

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O sobreiro é uma peça fundamental de um ecossistema único — o montado –, assim como é um elemento importante da economia portuguesa, sobretudo na produção de cortiça. O declínio do montado tem preocupado empresários, agricultores e cientistas. Com a sequenciação do genoma desta espécie, os interessados esperam poder munir-se de melhores ferramentas para contrariar os efeitos negativos de vários fatores, como alterações climáticas e intensificação da agricultura.

De facto, apesar da relevância económica da produção de cortiça, nenhum plano de seleção genética foi estabelecido para esta espécie, comprometendo o desenvolvimento de árvores geneticamente melhores, capazes de produzir cortiça de elevada qualidade, que mostrem maior resistência aos fatores de stress biótico e abiótico a com potencial para se adaptarem a novas práticas de gestão silvícola que possam ser implementadas no futuro”, escrevem os autores no artigo.

Porque é que não se avalia a qualidade da cortiça, na própria cortiça? Porque só é possível fazer uma boa avaliação da cortiça propriamente dita depois da árvore completar 40 anos. Da mesma forma, a resistência à seca, às doenças e pragas, assim como as modificações causadas pelas alterações climáticas, só podem ser observadas a longo prazo. A análise genética encurta todos estes tempos de espera.

A equipa quer agora passar o rascunho a limpo e preparar uma versão melhorada da sequenciação do genoma. Em curso está também a caracterização molecular dos mecanismos que levam à formação da cortiça. Neste momento, o trabalho — que resultou do maior projeto de sequenciação feito em Portugal — já está disponível numa base de dados internacional e gratuita.

Sobreiro de Águas de Moura premiado como Árvore Europeia do Ano