A peça Veneno, com texto de Cláudia Lucas Chéu e direção de Albano Jerónimo, que este protagoniza, estreia-se esta sexta-feira na Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão, com a decadência e falência social da família como tema central. Depois da sessão de hoje e de sábado, Veneno tem marcadas mais duas salas: nos dias 8 e 9 de novembro, no Teatro Viriato, em Viseu, e no dia 23 de novembro, no Centro de Arte de Ovar.

Veneno é quase um monólogo, protagonizado pelo ator e encenador Albano Jerónimo e apenas pontuado pelas intervenções de Luís Puto. Jerónimo surge no papel de um homem, recentemente desempregado e falido, que decide sequestrar os três filhos, depois de assassinar a mulher e o amante desta. A tragédia faz com que Albano Jerónimo assuma um autêntico delírio sobre a sociedade, a família, a política, mas também sobre o amor.

Veneno, porém, não regista apenas a falência do mundo exterior. Esta alastra-se ao mundo interior, com o pai a exercer uma violência desmedida sobre os filhos, através de um vocabulário primário, básico, que insiste em usar, em contraponto com os filhos que usam o canto lírico como forma de se exprimirem.

A peça foi escrita por Cláudia Lucas Chéu, em 2015, na sequência de um determinado estilo de poesia que estava a desenvolver na altura, relacionado com temas ligados aos subúrbios, e que acabou por desaguar numa peça, sem que esta estivesse alguma vez planeada, disse a própria autora à Agência Lusa.

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Cláudia Lucas Chéu acabou depois por perceber que havia muitas histórias com este tipo de violência familiar, acrescentou. “Muitos pensadores contemporâneos dizem que a família vai entrar em falência total, vai deixar completamente de funcionar, precisamente por causa dessa hipocrisia toda dos clichês sociais”, frisou.

Albano Jerónimo, por seu lado, disse que este trabalho também pretende trazer um pouco à superfície o aumento dos crimes, no seio da família. “O que está por baixo disto, de certa forma, é este tecido suburbano que caracteriza estas grandes metrópoles”, referiu, exemplificando com Lisboa. “Cada vez mais as pessoas de Lisboa não estão na capital, mas nos subúrbios”.

Paralelamente a este trabalho, o ator e encenador acrescentou que estão a preparar a realização de um colóquio, sobre todas estas questões, quando a peça for representada em Lisboa. Veneno é, assim, segundo Albano Jerónimo, um pretexto levantarem “questões maiores, como a família e a questão social dos subúrbios”, porque são aquelas “que acarretam problemas para toda a sociedade e não estão a ser atendidas como deviam”, sublinhou o encenador. Cláudia Lucas Chéu e Albano Jerónimo querem que este colóquio se realize na final da digressão da peça, ainda por definir, na totalidade.

O cenário de Veneno é composto por um cão de loiça, um sofá, um lustre no teto, uma tela de projeção. É aqui que Albano Jerónimo vai discorrendo sobre os filhos, a mulher que acabou de matar, ou sobre o amante desta: “Um homem nunca pode ser cabrão, senão perde o respeito de todas as mulheres”, diz o ator, em palco.

“Sei que a vossa mãe ainda está viva, mas é como se não estivesse. Era uma mulher linda e cozinhava que era uma maravilha”, repete o protagonista, enquanto Luís Puto, a outra personagem em palco, vai filmando Albano Jerónimo em imagens que vão sendo projetadas na tela do cenário.

Com apoio à dramaturgia Mickael de Oliveira, direção de Albano Jerónimo e participação especial de Leonor Devlin, Veneno tem conceção plástica de António MV, desenho de luz de Rui Monteiro e é uma coprodução da Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão, do Teatro Viriato e do Centro de Arte de Ovar. Em simultâneo com a peça, as edições Guilhotina, da teatronacional21, irão editar uma 2.ª edição do texto de Veneno.