Um porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros da China negou esta terça-feira ter havido qualquer chamada para os EUA da parte de Pequim a pedir o recomeço das negociações para pôr fim à guerra comercial entre os dois países, contrariando assim aquilo que Donald Trump disse no final da cimeira do G7.

“Não sabemos nada dessas chamadas ao longo do fim-de-semana de que fala”, disse o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês Geng Shuang, em conferência de imprensa esta terça-feira.

As declarações daquele responsável da diplomacia chinesa surgem depois de Donald Trump ter dito, esta segunda-feira, que dois membros do governo de Pequim tinha feito “duas chamadas muito, muito boas”. De acordo com o que o Presidente dos EUA tinha dito nessa ocasião, os emissários chineses tinham dito ao telefone que queriam “fazer um acordo” para pôr um ponto final à guerra comercial entre os dois países.

Esta é a mais recente reviravolta num tema que, nos últimos dias, tem conhecido vários avanços e recuos, ao sabor das declarações do Presidente dos EUA. A origem destas declarações esteve no anúncio por parte da China, que avisou que ia colocar tarifas em importações no valor de 75 mil milhões de dólares (67,5 mil milhões de euros) em produtos norte-americanos, incluindo em carros ou peças de carros.

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A partir daí, Donald Trump desdobrou-se em afirmações e anúncios retaliatórios.

Na sexta-feira, Donald Trump escreveu no Twitter que os EUA tinham perdido “de forma estúpida” bilhões de dólares com a China ao longo dos anos, acusando Pequim de roubo de propriedade intelectual. “Não precisamos da China e, sinceramente, estaríamos melhores sem eles”, escreveu. De seguida, Donald Trump escreveu algo que fez soar alguns alertas, nomeadamente na bolsa. “As excelentes empresas americanas têm, desta forma, ordens para começarem imediatamente a procurar uma alternativa à China, inclusive trazerem as suas empresas de volta para o nosso país, fabricando os seus produtos nos EUA”, escreveu.

Por cima dessas declarações, Donald Trump anunciou ainda que os EUA iriam aumentar as tarifas para bens importados da China, atualmente nos 25%, para 30% a partir de 1 de outubro — estando entre esses bens artigos como roupa, calçado, brinquedos, telemóveis ou computadores portáteis, entre outros. Além disso, o Presidente dos EUA anunciou que os EUA se preparavam para aumentar de 10 para 15%, em duas fases, as tarifas correspondentes a 300 mil milhões de dólares (270 mil milhões de euros) de importações da China.

Porém, depois da animosidade, no sábado, Donald Trump admitiu mudar de ideias quanto aos anúncios feitos na véspera. No início de um pequeno-almoço de trabalho com a delegação britânica à margem da cimeira do G7, quando questionado pelos jornalistas no local se tinha “dúvidas” (second thoughts, no original) quanto ao aumento anunciado de tarifas, o Presidente dos EUA respondeu: “Sim, porque não? Pode ser que sim, pode ser que sim. Eu tenho dúvidas em relação a tudo”. 

Mais tarde, depois da polémica levantada por estas palavras, a porta-voz da Casa Branca queixou-se de as palavras do Presidente dos EUA terem sido “muito mal interpretadas”, referindo que o seu “pode ser que sim” era uma resposta à possibilidade de aumentar ainda mais as tarifas. “Ele arrepende-se de não ter aumentado ainda mais as tarifas”, disse a porta-voz da Casa Branca, Stephanie Grisham, que disse não ter a certeza de que Donald Trump “ouviu a pergunta, a sala estava muito cheia”.

Trump recua em relação à China. Afinal, empresas americanas já não têm de sair de Pequim

Isso não impediu de Donald Trump dizer também que podia, de facto, exigir o regresso das empresas norte-americanas que estão na China. “Tenho esse direito, se quiser posso declarar uma emergência nacional”, disse, repetindo as acusações de roubo de propriedade intelectual. “Isto é, de várias formas, uma emergência.”

Mas, em novo ziguezague discursivo, Donald Trump logo acrescentou que não sabia qual ia ser o próximo passo — “neste momento não tenho um plano”, disse — e referiu que os EUA estavam a dar-se “muito bem com a China” naquela altura. “Acho que eles querem um acordo muito mais do que eu quero”, acrescentou.

As incertezas que resultam do discurso de Donald Trump levaram a uma queda das bolsas asiáticas. Esta segunda-feira, o Hang Seng (Hong Kong) a cair uma média de 2,16% nos últimos cinco dias, tudo isto acompanhado para uma queda do valor do yuan, a moeda chinesa, para um mínimo histórico em 11 anos. Já o japonês Nikkei 225 perdeu em igual período um total de 1,07%, com a maior queda a verificar-se na abertura dos mercados esta segunda-feira, em que perdeu 2,3%.

“Lamento, mas é assim que eu negoceio”

Em declarações à Associated Press, o CEO da Basic Fun!, uma empresa de brinquedos dos EUA que importa produtos da China, disse que os últimos dias tinham feito parte da “viagem louca no carrossel do senhor Trump”.

“Nunca, em tempo algum, tínhamos visto uma prática governativa tão destravada. Está completamente descontrolada e é ultrajante”, disse aquele empresário.

Donald Trump, porém, disse na conferência de imprensa que deu no final da cimeira do G7 que, com ele, a imprevisibilidade faz parte: “Lamento, mas é assim que eu negoceio (…). Tem-me feito muito bem ao longo dos anos e tem feito muito bem ao país”.

Trump quer que o próximo G7 seja num dos seus resorts de Miami, que registou quebras de 69% desde que ele se candidatou