“Queria destacar a vitória, o adversário, que é muito competitivo e, por último, não há campeonato igual ao brasileiro. Emoção, beleza…é a paixão. Foi uma beleza este jogo. Na Europa acham que lá é que é o supra sumo. Aqui é apaixonante. Chegámos a Fortaleza com um ambiente muito bonito. As torcidas andam na rua com as camisolas das equipas misturadas, isso não é possível em Portugal”. No domingo à noite, Jorge Jesus era um homem totalmente apaixonado. Depois de vencer no terreno do Ceará e subir à liderança do Brasileirão, o treinador do Flamengo estava completamente deslumbrado pelo futebol brasileiro e fez questão de não o esconder na conferência de imprensa no final da partida.

A semana perfeita do Flamengo de Jorge Jesus, o treinador “bom demais”, acabou na liderança do Brasileirão

Passaram três dias e Jorge Jesus voltava a ter um jogo “com um ambiente muito bonito”. Depois de na semana passada ter vencido o Internacional de Porto Alegre no Maracanã (2-0), o Flamengo visitava esta quarta-feira a equipa brasileira para a segunda mão dos quartos de final da Taça Libertadores. À partida, ambos os conjuntos já sabiam que encontrariam o Grémio na fase seguinte, já que a equipa do Rio Grande do Sul havia eliminado o Palmeiras de Luiz Felipe Scolari. E Jesus, que havia poupado alguns dos habituais titulares no encontro com o Ceará, voltava a mostrar que a prioridade do Flamengo está totalmente delineada.

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Começou com “pegadinha”, teve “terninho”, acabou com a vitória: Flamengo de Jesus vence nos quartos da Libertadores

Na final da Liga dos Campeões da temporada passada, entre o Liverpool e o Tottenham e quando já se sabia que treinaria o Flamengo esta época, Jorge Jesus apareceu no Wanda Metropolitano e falou à Eleven Sports, garantindo que já estava a observar as duas equipas inglesas porque existia a possibilidade de encontrar o vencedor no próximo Mundial de Clubes. Ora, para que isso acontecesse, era necessário que o Flamengo conquistasse a Taça Libertadores — algo que, à altura e tendo em conta que o conjunto do Rio de Janeiro não vence a competição desde 1981, parecia algo inalcançável. Passaram apenas três meses: e a ideia de que Jorge Jesus pode mesmo encontrar Jurgen Klopp no Mundial de Clubes torna-se cada vez mais realista.

Sem Willian Arão, que viu cartão amarelo na primeira mão e estava suspenso, o treinador português voltava a contar com o colombiano Cuéllar, que esteve suspenso pela direção brasileira por forçar uma saída mas terá amenizado a situação ao longo dos últimos dias e era titular esta quarta-feira. Bruno Henrique, Gerson, Everton, Filipe Luís e Rafinha voltavam todos ao onze inicial e o Flamengo jogava com aquela que é, nesta altura e à exceção de Arão, a sua equipa tipo. No início da partida, era notória a vontade da equipa de Jesus de marcar cedo, até porque um golo do Flamengo significava que o Internacional teria de marcar quatro para se colocar em vantagem na eliminatória. Nos dois primeiros minutos, Arrascaeta e Gabriel Barbosa colocaram o guarda-redes Marcelo Lomba à prova e colocaram o ritmo da partida nos píncaros.

Tal como havia acontecido na primeira mão, o Flamengo apresentava-se como a equipa mais organizada, sempre mais adiantada no terreno do que o adversário e com os setores muito bem estabelecidos e enraizados. Além das duas oportunidades iniciais, Bruno Henrique esteve perto de inaugurar o marcador com um remate de fora de área (23′) e Jorge Jesus, para não quebrar rotinas, explicava aos brasileiros que as áreas técnicas dos treinadores são demasiado curtas. Na ida para o intervalo, a grande falha que se podia apontar à equipa do treinador português era mesmo a eficácia (ou a falta dela), já que Marcelo Lomba fez seis defesas durante a primeira parte e o guarda-redes do Flamengo só foi chamado a intervir já ao minuto 43. No final do primeiro tempo, existia a ideia clara de que o Internacional estava a fazer muito pouco — Paolo Guerrero estava ser engolido por Pablo Marí e Rodrigo Caio, D’Alessandro e Sóbis estavam mais preocupados em encostar a cabeça aos adversários do que em atacar — para quem quer passar às meias-finais da Libertadores. E Jesus, numa imagem que fez lembrar uma outra de um dia em que um título se decidiu em Portugal, ajoelhou-se quando Gabigol falhou um golo isolado (43′): mas, desta vez, o treinador português levantou-se de imediato com um sorriso, como quem sabe que o desfecho dificilmente será o mesmo.

Na segunda parte, de forma expectável, o Internacional subiu as linhas e lançou-se para o ataque, ainda que nem sempre de forma totalmente esclarecida, e lançou Nico López e Wellington numa tentativa de acrescentar velocidade e profundidade à equipa. Sem beneficiar de uma oportunidade clara de golo mas sempre totalmente acampado no meio-campo defensivo do Flamengo, a equipa de Porto Alegre foi restringindo o espaço que permitia ao conjunto de Jorge Jesus, numa altura em que o setor intermédio formado principalmente por Cuéllar e Gerson já dava sinais de ser curto para aguentar a fase do jogo que se vivia. Sem ser brilhante, o Internacional acabou por chegar ao golo de bola parada, com um cabeceamento de Rodrigo Lindoso depois de um livre a partir da esquerda (62′).

Ainda na frente da eliminatória mas agora com a vantagem reduzida a apenas um golo, o Flamengo passou por alguns segundos de total desnorte e podia ter sofrido um segundo golo que empataria as contas mas acabou por conseguir segurar o resultado. Antes de Jorge Jesus trocar Cuéllar por Piris da Motta, para tentar estabilizar o meio-campo, Bruno Henrique atirou mais um remate forte de fora de área para defesa de Marcelo Lomba (71′), num momento que acabou por acalmar a partida, que estava a ficar partida, e garantiu ao Flamengo a confiança necessária para não entrar em descalabros e cometer erros desnecessários. Até ao final do jogo, a equipa orientada por Jorge Jesus não conseguiu evitar alguns períodos de sofrimento, já que cada ataque do Internacional provocava calafrios à defensiva carioca, mas matou a eliminatória através de um contra-ataque, com uma arrancada muito rápida de Bruno Henrique pela esquerda, que só teve de servir Gabigol (85′).

O Flamengo empatou em Porto Alegre e beneficiou da vantagem conseguida na primeira mão para carimbar a passagem às meias-finais da Libertadores, onde vai encontrar o Grémio (primeira mão a 1 ou 2 de outubro, segunda a 22 ou 23 de outubro); a outra meia-final será discutida entre o Boca Juniors e o River Plate ou o Cerro Porteño. Jorge Jesus chegou há menos de três meses ao Brasil e ao Flamengo e já faz história: a equipa do Rio de Janeiro está nas meias-finais da Taça Libertadores 35 anos depois da última vez e está cada vez mais perto de lutar pelo título que escapa desde 1981 e que é a grande pretensão dos adeptos.